Em 04/05/2021

Curso sobre participação de Notários e Registradores no combate à lavagem de dinheiro foi marcado pela alta qualidade das palestras e dos debates


Confira como foi o terceiro e último dia do curso. IRIB esteve presente!


Após três dias realização, o curso intitulado “COAF – Notários e Registradores no combate ao crime – Aspectos práticos, problemas mais comuns – repensando estratégias”, promovido pela Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça e a Escola Paulista da Magistratura (EPM) chegou ao fim no início da tarde de 28/04/2021. O objetivo do evento foi tratar da colaboração de Notários e Registradores ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).

Mantendo a qualidade das palestras dos dias anteriores, o evento iniciou o terceiro e último dia de realização com a palestra intitulada “COAF e o RTDPJ”, proferida pela Integrante do Conselho Diretor do Instituto de Registro de Títulos e Documentos e de Pessoas Jurídicas do Espírito Santo (IRTDPJ/ES), Doutora Renata Cristina de Oliveira Santos Aoki.

Renata Aoki iniciou sua palestra traçando um interessante histórico da lavagem de dinheiro no mundo, informando que o primeiro registro desta prática data do Século XVII, com a pirataria.

Na sequência, contextualizou a atualização dos Notários e Registradores junto ao combate desta prática e afirmou que a atividade notarial e registral foi incluída muito mais tarde, sendo os Cartórios novatos nessa atribuição. Na sequência, informou que, diante dos dados apresentados em palestras anteriores, Notários e Registradores são muito participativos no envio das informações, se comparados com outros setores, com mais ramificações. A informação é prestada gratuitamente pelo Cartório, ao contrário dos demais ramos e afirmou que não há como repassar os custos ao usuário do serviço, pois os emolumentos são especificados por lei. Desta forma, não há custo nem para o Estado e nem para o usuário. Entretanto, assim como os demais palestrantes, destacou que a qualidade no envio das informações precisa ser aprimorada para o melhor aproveitamento nas investigações do COAF.

Na sequência, ressaltou o descompasso entre o volume de comunicações enviadas pelos Notários e Registradores, justificando que tal fato ocorre porque a atividade notarial e registral tem grande preocupação com a segurança jurídica, havendo, até mesmo, excesso de zelo. Afirmou, ainda, que Notários e Registradores também não são especialistas em lavagem de dinheiro e que as comunicações serão aperfeiçoadas naturalmente, na medida em que houver realinhamento e busca pelo conhecimento acerca do assunto.

A palestrante ainda abordou temas como a busca da assertividade entre o Registro de Títulos e Documentos (RTD)/Registro Civil de Pessoas Jurídicas (RCPJ) e o COAF; o critério do valor para envio das comunicações; as transações com e sem conteúdo econômico e como estas devem ser informadas; a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD); dúvidas práticas; a maior possibilidade de contribuição pelo RTD e RCPJ, entre outros.

Prosseguindo com o ciclo de palestras, foi a vez da apresentação do painel intitulado “Prospectando o futuro. Inteligência Artificial e Machine Learning como apoio de notários e registradores. ONR e Centrais notariais e de Protesto”, exposto pelo Pesquisador em IA & Law (European University Institute), Professor Marco Almada e pelo Professor Livre-Docente da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (FDUSP), Doutor Juliano Souza de Albuquerque Maranhão. O painel teve como Debatedor o Presidente do Operador Nacional do Registro Eletrônico de Imóveis (ONR) e Primeiro Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, Doutor Flauzilino Araújo dos Santos. A apresentação deste painel foi realizada pelo o Quinto Oficial de Registro de Imoveis de São Paulo e Ex-Presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB), Doutor Sérgio Jacomino.

Com o objetivo de determinar como Notários e Registradores podem se aproveitar da tecnologia para auxilio nesta questão, Marcos Almada afirmou que a Inteligência Artificial (IA) está cada vez mais presente no dia a dia das pessoas e que seu papel, em síntese e para a finalidade tratada pelo curso, pode-se partir do conceito de que de que a IA é sistema de computador para automatizar o que demandaria raciocínio humano, com adaptação ao contexto. Destacou que definir IA é um problema mesmo para especialistas. O debate em torno do assunto ainda é complexo e está em andamento no mundo inteiro. Para o palestrante, a IA pode agilizar os procedimentos e reduzir custos automatizando o processo e trazendo ganhos quantitativos e qualitativos nas análises e comunicações, permitindo que o trabalho humano seja direcionado a questões mais complexas.

Com a palavra, Juliano Maranhão iniciou sua apresentação destacando o desafio de se integrar duas gerações de IAs: a Expert System, com estrutura pré-definida e a Data System, com estrutura adaptativa e machine learning. Destacou, ainda, que sistemas de aprendizado (machine learning) são sensíveis a detecção de padrões e permitem análises cada vez mais precisas. Juliano Maranhão também afirmou que regras com ambiguidade ou critérios subjetivos são difíceis de serem computadas pelo sistema de estrutura pré-definida, sendo mais bem processadas pelos sistemas de aprendizado, com estrutura adaptativa. O palestrante ainda citou casos no Provimento CNJ n. 88/2019 que são passíveis de aplicação de IA e machine learning. Ao final de sua apresentação, destacou a dificuldade dos Notários e Registradores em relação à sua visão parcial, pois estes somente podem investigar no âmbito da Serventia. Situações em diferentes comarcas são mais difíceis de detectar, sendo necessária a criação de formas de centralização e inteligência.

Por sua vez, Flauzilino Araújo dos Santos destacou o momento do Registro de Imóveis. Destacou o Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (SREI), instituído pela Corregedoria Nacional de Justiça, por meio do Provimento n. 47/2015. Afirmou que este projeto leva em consideração o registro eletrônico, a longevidade do documento eletrônico e a obsolescência de sistemas e mencionou que há, neste sistema, grande possibilidade de adoção da IA, inclusive, para facilitar comunicação de casos suspeitos, por meio do machine learning, em operações incomuns que ultrapassem o âmbito da Serventia. Destacou, também, a necessidade de organização de uma plataforma unificada para todos os Registros de Imóveis, aprimorando a contribuição dos Registradores na sociedade.

Encerrado o painel, Sérgio Jacomino convidou os integrantes do painel intitulado “Laboratório de debates – problemas mais comuns e soluções” para apresentarem suas considerações finais. Afirmou que o intuito deste painel foi a troca de impressões que possam ter surgido no decorrer das apresentações. Disse que, ao final dos trabalhos, será elaborado e disponibilizado relatório que será encaminhado aos organizadores.

Participaram dos debates deste painel o Registrador de Imóveis de Vespasiano/MG e Vice-Presidente do IRIB pelo Estado de Minas Gerais, Doutor Luciano Dias Bicalho Camargos; o representante do Colégio Notarial do Brasil – Conselho Federal (CNB/CF), Hércules Alexandre da Costa Benício; a representante do IRTDPJ, Paula da Silva Pereira Zaccaron; o representante do IEPTB, Mário de Carvalho Camargo Neto; o Procurador da República, Doutor Rafael Brum Miron; e o Professor Marcos Almada.

Dando início aos debates, Luciano Camargos, coordenador do painel, ressaltou que participou, com o Presidente do IRIB, Jordan Fabrício Martins, de diversas reuniões junto à Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro. (ENCCLA) e que esta sempre se mostrou disposta a receber propostas dos Registradores para elaboração do Provimento CNJ n. 88/2019 e que, inclusive, propostas foram apresentadas pelo IRIB e, em sua maioria, acatadas. Entretanto, posta em prática, a norma, ao ser interpretada pelos seus operadores, aprestou alguns problemas que não foram observados identificados quando da sua elaboração. Luciano Camargos ressaltou que o IRIB publicou o “Manual do COAF”, com perguntas e respostas sobre a atuação dos Registradores junto ao COAF, já em sua segunda edição, revista e ampliada, e destacou a abundância de informações enviadas pelos Registradores ao COAF, mas que estas são pouco qualificadas.

O coordenador iniciou sua explanação abordando questões práticas. A primeira referiu-se à comunicação fundamentada na operação com pagamento em espécie. De acordo com Luciano Camargos, não se pode confundir moeda nacional com pagamento em espécie. A norma é precisa em dizer ser necessária declaração expressa de que deverá haver comunicação quando o pagamento é feito em espécie, devendo o título indicar esta declaração. Se não houver a declaração, não há obrigação de comunicar. Outro ponto abordado foi a questão da qualificação do título, no que se refere à requisitos específicos da Lei n. 6.015/1973 (LRP) e do Provimento CNJ n. 88/2019. Neste ponto, destacou que não se pode confundir os elementos necessários indicados na LRP com aqueles exigidos pelo Provimento. Se, na qualificação do título não estiverem presentes os requisitos do Provimento, este não deve ser devolvido, tampouco, informar tal ausência em Nota Devolutiva, sob pena de o Registrador praticar o tipping off. Ao final, recomendou aos Notários que, ao lavrarem escrituras públicas, evitem os jargões em relação ao pagamento, bastando indicar a declaração das partes e que é necessário o trabalho em conjunto entre Notários e Registradores.

Em seguida, houve a apresentação de Hércules Benício. O representante do CNB/CF destacou que o ONR terá papel importante para os Registradores de Imóveis e o CNB para os Tabeliães de Notas. Ressaltou a necessidade de uma central que receba previamente os dados encaminhados pelos Notários e Registradores e esta envie as informações para COAF, conforme exemplo espanhol. Em seguida, mencionou o art. 25, III do Provimento CNJ n. 88/2019, afirmando que a comunicação de forma automática depende de conteúdo declarado no título e que tal dispositivo deve ser lido no sentido indicado por Luciano Camargos. Hércules Benício ainda destacou que o CNB/CF já publicou 3 versões do seu manual e elaborou uma cartilha informando a nova rotina dos Notários. Também ressaltou que todos prepostos das Serventias devem ser qualificados. As situações atípicas devem ser selecionadas por equipe direcionada para este fim e que a análise destas situações compete a um comitê da própria Serventia, de acordo com o tamanho de cada uma. Se não houver dúvida, comunica-se ao COAF. Na dúvida, como já ressaltado em outras ocasiões, não deverá haver comunicação.

Acesse o Manual e a Cartilha publicados pelo CNB/CF.

O debatedor também ressaltou ser necessário o apoio do COAF e do CNJ para celebração de convênio com órgãos públicos no sentido de facilitar o acesso às informações necessárias para o cumprimento desta obrigação e que Notários e Registradores devem procurar fazer o melhor possível. Ao final, mencionou que o CNJ poderia revisar a aplicabilidade da tabela de temporalidade e o descarte dos documentos.

Com a palavra, Paula Zaccaron iniciou sua apresentação informando que, para o Registro de Títulos e Documentos (RTD), o preocupante não são as dúvidas práticas, mas a normatização da atividade, independentemente do COAF.

Para a debatedora, existem dois grandes empecilhos para o cumprimento desta obrigação junto ao COAF: a falta de proximidade com o cliente, pois no RTD, não há contato com a parte, eis que o documento é apresentado pronto; e a não obrigatoriedade de registro, sendo difícil apurar causas de suspeição. De acordo com Paula Zaccaron, os contratos que não geram registros não são apresentados ao RTD. A regulamentação da obrigatoriedade de alguns tipos de registro tornaria a atuação do RTD mais eficaz.

Paula Zaccaron ainda destacou a importância da centralização das informações para que o RTD não analise documentos individualmente de pequenos valores e afirmou que, com o tempo, haverá a uniformização de qualificações, procedimentos etc.

Na sequência, Mário de Carvalho iniciou sua apresentação. Afirmou ser preciso estimular o Serviço Notarial e Registral perante a sociedade, justamente por este fazer a verificação das operações e ser um setor regulado e fiscalizado e que é preciso utilizar as ferramentas tecnológicas para realização de filtros, especialmente, a IA. Ao final de sua apresentação, ainda ressaltou a necessidade das informações serem centralizadas para melhor estabelecimento de padrões de análise e apresentou alguns casos suspeitos que foram tratados no âmbito do Tabelionato de Protesto.

Encerrada as apresentações dos debatedores, Sérgio Jacomino apresentou questões encaminhadas pelos participantes.

A primeira foi dirigida à Marcos Almada, solicitando esclarecimento no sentido de ser possível a proteção de dados da pessoa natural, no caso da automatização dos procedimentos. Para o palestrante a proteção é possível, dependendo das condições. É necessário ter controle, mas não unicamente técnicos, devendo este controle ser implementado no contexto da atividade. Segundo Almada, a tecnologia deve ser integrada no fluxo de controle.

Em seguida, Luciano Camargos e Rafael Miron esclareceram dúvida acerca da comunicação decorrente da divergência entre valor fiscal e o declarado pelas partes. Para Luciano, este foi um dos temas de maior reflexão pelo IRIB, sendo difícil diferenciar evasão e elisão fiscal com da lavagem de dinheiro. A experiência tributária brasileira na cobrança de tributos quanto aos valores reais dos bens é de desatenção, especialmente em municípios do interior do Brasil. Isso gera comunicações desnecessárias. Há necessidade de declaração de valores mais condizentes com a realidade. Para Rafael, esse dispositivo representa 21% (vinte e um por cento) das comunicações enviadas. Neste ponto, entende que o objetivo pretendido pelo Provimento não foi atingido e merece revisão.

A terceira e última pergunta foi respondida por Hércules Benício. Questionado sobre como proceder quando a parte declara haver pagamento, mas não indica os dados, respondeu que cabe ao preposto questionar o cliente. Havendo recusa na prestação da informação, não há necessidade de envio, embora possa haver indício de operação suspeita.

Finalizando o curso, o Desembargador Marcelo Martins Berthe e a Magistrada Tânia Mara Ahualli, ambos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) e coordenadores de cursos da EPM, agradeceram a participação dos palestrantes, debatedores, participantes e todos os envolvidos no evento. Berthe destacou que o curso foi uma iniciativa do Desembargador Paulo Sérgio Velten Pereira, Corregedor-Geral da Justiça do Estado do Maranhão e do Desembargador Diretor da EPM, Luis Francisco Aguilar Cortez. Agradeceu a todos, também, em nome da Ministra do Superior Tribunal de Justiça e Corregedora Nacional de Justiça, Maria Thereza de Assis Moura.

Veja como foram o primeiro e o segundo dia.

Fonte: IRIB, com informações da EPM.



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