Em 22/09/2016

Usucapião extrajudicial. Área urbana. Fração mínima de parcelamento


Questão esclarece dúvida acerca da usucapião extrajudicial


Nesta edição do Boletim Eletrônico esclarecemos dúvida acerca da usucapião extrajudicial. Veja nosso posicionamento sobre o assunto:

Pergunta: É possível a usucapião extrajudicial de áreas urbanas menores que a fração mínima de parcelamento?

Resposta:  Em se considerando a prescrição aquisitiva de posse de imóveis, que pode acontecer tanto de forma ordinária, extraordinária ou especial, e a envolver imóveis urbanos ou rurais, como previsto nos artigos 183, da Constituição Federal, 9º., da Lei 10.257/2001, e 1.238 e seguintes, do Código Civil, bem como ao que está a dispor o art. 216-A, da Lei dos Registros Públicos, a qual carrega o “status” de aquisição originária, entendemos pela regular admissão de usucapião com área inferior ao módulo determinado para o tipo de imóvel envolvido com tal prescrição de tempo de posse, uma vez não se notar nas bases legais que estão a cuidar do referido instituto qualquer indicação da necessidade de obediência a limites dessas áreas, cuja exigência, a nosso ver, fica somente para retalhamento do solo feito dentro de outras normas legais que dele venham a cuidar de forma direta, sem proveito dessa restrição para a usucapião, por vê-la como primitiva dentro do sistema registral, sem qualquer análise quanto a estar ou não resultado de eventual parcelamento do solo.

Podemos aproveitar como sustentação ao entendimento aqui exposto, r. decisão do Plenário do STF, lançada em 29 de abril de 2015, nos autos de RE 422349/RS, cujo teor encontra-se disponibilizado no site http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/cao_urbanismo_e_meio_ambiente/STF-RExtr-422349-RS_(29abr15)_usucapiao_urbano_especial.pdf, da qual destacamos o que abaixo se segue, para uma melhor análise do aqui em trato, a saber:

Acordam, ademais, os Ministros, por maioria de votos, após reconhecer a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada, em fixar a tese de que, preenchidos os requisitos do art. 183 da Constituição Federal, o reconhecimento do direito à usucapião especial urbana não pode ser obstado por legislação infraconstitucional que estabeleça módulos urbanos na respectiva área em que situado o imóvel (dimensão do lote)

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Assim, a desconformidade de sua metragem com normas e posturas municipais que disciplinam os módulos urbanos em sua respectiva área territorial não podem obstar a implementação de direito constitucionalmente assegurado a quem preencher os requisitos para tanto exigidos pela Carta da República; até porque – ressalte-se – trata-se de modo originário de aquisição da propriedade.

Há que se destacar, ainda, a existência de firmes posicionamentos doutrinários a corroborar a conclusão a que aqui se chegou.

Representativo desse entendimento doutrinário é o seguinte excerto da magistral obra Tratado de Usucapião, volume I, Editora Saraiva, 2008, de autoria do eminente jurista Benedito Silvério Ribeiro: “Cabe ressaltar que a função social da propriedade pode levar a contornar requisitos urbanísticos e mesmo do plano diretor da cidade, sem o rigor inerente ao parcelamento do solo” (p. 942).

Discorrendo sobre a norma do referido artigo e posicionando-se contra a fixação, por lei municipal, de limite mínimo para esse tipo de usucapião, disserta o aludido autor, em ensinamento aplicável também para a hipótese inversa, que é a retratada nestes autos, que “não se trata de atropelar preceito sobre postura municipal, de vez que à norma constitucional deve-se atribuir máxima eficácia, cediço também que é competente a União para legislar nesse particular, conforme o inciso I, do artigo 22 da CF” (op. cit., p. 945).

Há que se ressaltar que não se está, nesta oportunidade, declarando a inconstitucionalidade de qualquer norma municipal, a qual, ressalte-se, jamais foi revelada nos autos. Tanto a sentença como o acórdão que julgou a apelação não fazem referência específica a uma determinada lei municipal. A decisão objurgada deixou, simplesmente, de aplicar o disposto no art. 183 da Constituição Federal, sob os seguintes argumentos, que passo a transcrever: “Ora, no Município de Caxias do Sul, está afirmado nos autos sem contestação, o módulo mínimo de parcelamento do solo urbano é de 360 m². Esta é a vontade manifestada pela população pela sua Casa Legislativa Municipal, a qual está autorizada a sobre a matéria se manifestar por força do que dispõe o artigo 30, incisos I, II e VIII, da Constituição Federal.

Aliás, também a legislação infraconstitucional, especificamente a já citada Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, dispõe, quando se refere ao Plano Diretor, que ‘Art. 39. A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor, assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas, respeitadas as diretrizes previstas no art. 2º desta Lei. Art. 41. O plano diretor é obrigatório para cidades: I - com mais de vinte mil habitantes; (fato notório no que toca ao Município de Caxias do Sul).’

Portanto, não somente a área que o autor pretende ver declarada a usucapião, para esses efeitos, é claro, não é considerada jurídica e legislativamente terreno ou lote, como tampouco a procedência da ação, acaso se viesse a ocorrer, estaria respeitando o conceito jurídico de função social da propriedade.

O fato, para que não se perca de vista o foco do debate, é que os autores, malgrado tenham estabelecido composse em um terreno urbano de 360 m², inclusive erigindo no local uma residência, pretendem fracionar lote urbano em total violação à lei.

Assim sendo, conquanto reconheça-se que vivemos momentos onde soluções judiciais práticas e corajosas urgem, pois a superpopulação das cidades estão na mesma proporção das demandas para regulamentação das aquisições imobiliárias, o artigo 183 da Constituição Federal não se oferece como apanágio para todos os males. Tem ele lugar em situações diversas da ora sob análise, cuja discussão acadêmica sequer disputa lugar nestes autos, que trata de caso específico.

Finalizando, recomendamos sejam consultadas as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça de seu Estado, para que não se verifique entendimento contrário ao nosso. Havendo divergência, proceda aos ditames das referidas Normas, bem como a orientação jurisprudencial local.

Seleção: Consultoria do IRIB 

Fonte: Base de dados do IRIB Responde

Comentários: Equipe de revisores técnicos



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