A publicidade da Reserva Legal deve ser dada pelo órgão ambiental ou pelo Registro de Imóveis?
Maria Aparecida Bianchin Pacheco
Está em discussão no Congresso Nacional o Projeto de Lei nº 1.876/1999, visando alteração de vários dispositivos do Código Florestal. O relator da proposta é o Deputado Federal Aldo Rebelo (PC do B-SP) que, recentemente1, declarou a possibilidade de inserir modificação no relatório, para tornar a reserva legal um ato declaratório perante o órgão ambiental, em vez de um ato de averbação obrigatória perante o Registro de Imóveis.
A alteração legislativa proposta traria mudanças ao dispositivo preconizado no vigente Código Florestal - Lei 4.771/1965, que impõe obrigatoriedade da averbação da área de reserva legal na matrícula do imóvel.
Dita obrigatoriedade2 foi incluída no Código Florestal - Lei 4.771/1965, pela Lei 7.803/1989, e posteriormente alterada pela Medida Provisória nº 2.166-67, mas somente com a edição do Decreto Federal nº 6.514, de 22/07/2008, alterado pelos Decretos nº 6.686/2008 e 7.029/2009, “deixar de averbar a reserva legal”3 foi tipificada como infração administrativa contra a flora, fixando-se como prazo para a medida entrar em vigor, inicialmente, a data de 23/01/20094, alterada para 11/12/2009, pelo Decreto nº 6.686/2008 e posteriormente, para 11/06/2011, pelo Decreto nº 7.029/2009.
Depreende-se dos dispositivos legais mencionados que, a delimitação da reserva legal pelo órgão ambiental deve ser averbada na matrícula do imóvel, e que, a partir de 11/06/2011, não obstante a reserva ser instituída por força da própria lei, os proprietários de imóveis rurais, cujas matrículas não contenham a mencionada averbação, serão autuados por infração administrativa, sujeitos a sanções constituídas por multa pecuniária e embargos às atividades.
Num primeiro momento, pode-se entender que a eficácia da reserva legal está diretamente relacionada com a sua publicidade no Registro de Imóveis, no entanto, 1 Disponível em http://www.camara.gov.br. 2 Art. 16, §8º, da Lei nº 4.771/65. 3 Art. 55, Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008. 4 Art. 152, Decreto nº 6.514, de 22 de julho de 2008. uma análise mais apurada, permite concluir que a reserva legal é uma obrigação emanada da lei que a instituiu, que precisa ser declarada formalmente pelo órgão ambiental, para produzir todos os jurídicos e legais efeitos, não podendo o proprietário e/ou posseiro, seus herdeiros e/ou sucessores, escusaram-se de cumpri-la sob o argumento de não estar averbada, ou seja, a reserva legal não surge com sua averbação no Registro de Imóveis, sendo esta declaratória de sua existência legal. A pretensa modificação relacionada à averbação da Reserva Legal, causou polêmica entre os registradores imobiliários.
De um lado, os que entendem que retirar a obrigatoriedade da averbação no Registro de Imóveis, seria um retrocesso, tanto para a preservação ambiental quanto para a própria publicidade registral, que cada vez mais concentra informações relevantes da propriedade imobiliária.
De outro, os que entendem que a alteração legislativa proposta, não excluiria a possibilidade de efetivar tal averbação, mas a torna uma opção, e em nada alteraria os efeitos irradiados no âmbito registral, pois a mesma já é declaratória. A sua efetivação é e continuará a ser um instrumento de contribui para a valorização do imóvel, agregando informações de cunho ambiental.
Sem dúvida nenhuma que o dissenso no meio registrário é positivo, vez que engendra debate sobre a matéria, mas não se pode olvidar nelel, outras questões bastante significativas para o Registro Imobiliário brasileiro.
Não está a se afirmar aqui, que a classe deveria se posicionar a favor ou contra a modificação legislativa proposta, mas que qualquer posicionamento de entidades representativas da classe e/ou de registradores imobiliários, seja feito com base em sólidas pesquisas dos efeitos negativos e positivos que tal alteração provocaria na atividade. Convém lembrar, por exemplo, que Registradores de Imóveis de várias unidades federativas, enfrentaram e ainda enfrentam a problemática do condicionamento da averbação da reserva legal na matrícula, como pré-requisito para o ingresso, registro e/ou averbação de qualquer título inter vivos ou causa mortis que visem a constituição, transferência e modificação de direitos reais.
Nos últimos anos, inúmeras foram as tentativas (notificações, inquéritos civis, ações civis públicas) para impedir que o Registro Imobiliário atenda a sua finalidade precípua, de permitir que a propriedade e os demais direitos reais cumpram o seu papel no âmbito jurídico, conferindo-lhes autenticidade, segurança, eficácia e publicidade.
O Poder Judiciário tem sido o desaguadouro da problemática que se apresenta. Tribunais de Justiça dos Estados do Paraná, Minas Gerais, Rondônia, São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Rio de Janeiro, entre outros, já enfrentaram semelhante temática. A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no dia 01/09/2009, ao julgar o recurso interposto pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais – Resp 831212, decidiu pelo condicionamento da exigência da averbação de reserva legal ao pedido de retificação de registro imobiliário. A ementa foi a seguinte:
É possível extrair, do art. 16, § 8º, do Código Florestal, que a averbação da reserva florestal é condição para a prática de qualquer ato que implique transmissão, desmembramento ou retificação de área de imóvel sujeito à disciplina da Lei 4.771/65. Recurso provido. (grifo meu) Ressalta-se que, nessa mesma decisão, reconheceu-se que, inexiste no ordenamento jurídico brasileiro, norma que abrigue tal condicionamento, mas que a medida se justifica pela preocupação com o meio ambiente.
De fato, a sensibilidade e a preocupação com o meio ambiente devem nortear a atuação do registrador imobiliário, mas não se pode permitir que a tutela efetiva dos direitos reais se torne imperfeita por ter que se submeter a restrições que ignoram a razoabilidade e proporcionalidade, pois, frustrada a finalidade primordial do registro, ter-se-ia uma repugnante clandestinidade, cujos efeitos afetariam o desenvolvimento social e econômico.
Fica um convite à reflexão: Ocorrendo a alteração legislativa proposta, ou seja, se a averbação da reserva legal deixar de ser obrigatória no Registro de Imóveis, o prestigio da publicidade registral imobiliária seria realmente afetado? Os efeitos da alteração legislativa seriam positivos ou negativos para o Registro de Imóveis? A peculiar importância que a publicidade registral representa para o sistema social e econômico, justificaria a manifestação dos registradores imobiliários sobre o tema, no âmbito legislativo? Não seria esta a oportunidade propícia para debatermos o assunto sob um prisma que interessa ao Registro de Imóveis, levando-se em consideração, dentre outros, os aspectos acima abordados?
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