Em 14/03/2018

EMOLUMENTOS - USUCAPIÃO - JUSTIÇA GRATUITA - REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO - IMPUGNAÇÃO PELO OFICIAL.


Embora o oficial não tenha legitimidade para impugnar o benefício, havendo cabal demonstração de que o beneficiário não necessita do favor legal, o juiz pode indeferir a concessão. É uma obrigação legal do registrador apresentar documentos que contribuem para uma correta decisão judicial.


TJSP - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 2155965-44.2017.8.26.0000
LOCALIDADE: Piracaia DATA DE JULGAMENTO: 31/01/2018 DATA DJ: 06/03/2018
RELATOR: Miguel Brandi
LEI: LO - Novo CPC - 13.105/15 ART: 99 PAR: 2

AGRAVO DE INSTRUMENTO Usucapião - Justiça Gratuita - Revogação do benefício - Insurgência da autora - Alegação de que a oficial de registro de imóveis não tem legitimidade para impugnar o favor legal - Descabimento - De fato, não tem legitimidade a cartorária para impugnar a benesse, contudo os documentos que juntou demonstram que a autora não necessita do benefício Obrigação do registrador, delegado do serviço público, de apresentar documentos que contribuem para uma correta decisão judicial - Art. 99, § 2º, primeira parte, do CPC que  autoriza o indeferimento da concessão do benefício legal quando houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, independentemente da questão da legitimidade - Agravante que pouco faz para justificar sua pretensão e demonstra desapreço pela prestação do serviço judicial - AGRAVO DESPROVIDO.

ÍNTEGRA

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento nº 2155965-44.2017.8.26.0000, da Comarca de Piracaia, em que é agravante INES GUIMARAES GONCALVES DE GODOY, são agravados ADRIANA GONÇALVES GODOY GALDINO, DORIVAL DONIZETTI TURELA, FERNANDA GONÇALVES DE GODOY SIQUEIRA, BENEDITO APARECIDO SIQUEIRA e RENATA GONCALVES DE GODOY.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 7ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores MIGUEL BRANDI (Presidente), LUIS MARIO GALBETTI E MARY GRÜN.

São Paulo, 31 de janeiro de 2018.

Miguel Brandi Relator

Assinatura Eletrônica

VOTO Nº: 2017/25550

AGRV.Nº: 2155965-44.2017.8.26.0000 COMARCA: PIRACAIA

AGTE.   : INES GUIMARÃES GONÇALVES DE GODOY AGDO.          : ADRIANA GONÇALVES GODOY GALDINO

AGRAVO DE INSTRUMENTO Usucapião - Justiça Gratuita - Revogação do benefício - Insurgência da autora - Alegação de que a oficial de registro de imóveis não tem legitimidade para impugnar o favor legal - Descabimento - De fato, não tem legitimidade a cartorária para impugnar a benesse, contudo os documentos que juntou demonstram que a autora não necessita do benefício Obrigação do registrador, delegado do serviço público, de apresentar documentos que contribuem para uma correta decisão judicial - Art. 99, § 2º, primeira parte, do CPC que  autoriza o indeferimento da concessão do benefício legal quando houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, independentemente da questão da legitimidade - Agravante que pouco faz para justificar sua pretensão e demonstra desapreço pela prestação do serviço judicial - AGRAVO DESPROVIDO.

Agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, tirado em ação de usucapião ajuizada pela agravante em face dos agravados, em que, pela decisão de fls. 11/15 do agravo (fls. 165/169 do principal), restou revogado o benefício da Justiça Gratuita.

Sustenta a agravante, em síntese, que o pagamento das custas processuais da Ação de Usucapião atinge a importância R$ 8.772,61 e que comprovou que recebe pequenos rendimentos. Frisa que a Oficial Registradora da Comarca de Piracaia não tem legitimidade para requerer a revogação dos benefícios da assistência judiciária gratuita, pois não é parte nem tampouco terceira interessada. Pede atenção para o teor  da documentação de fl. 103. Afirma que o fato de possuir patrimônio imobiliário não é sinônimo de que tenha rendimentos suficientes para o pagamento das custas processuais. Frisa que recebeu os imóveis de herança e doação avoenga e que se aposentou como professora nível I do Estado de São Paulo. Anota que o pagamento da perícia judicial atinge a importância de R$6.300,00.

Despacho inicial às fls. 19/20, concedendo efeito suspensivo e determinando que a agravante junte documentos (comprovantes de proventos de aposentadoria).

Petição da agravante juntando os documentos exigidos (fl. 23). Documentação que revela que a recorrente aufere R$1.964,57 por mês (comprovantes de junho a agosto de 2017).

Breve relato.

O agravo não merece provimento.

Na ação de usucapião promovida pela insurgente (viúva, professora aposentada, titular de inúmeros imóveis), a Oficial do Registro de Imóveis, ao prestar informações sobre a viabilidade da demanda, representou com relação ao benefício da AJ concedido à autora.

Depois de informações, manifestação da interessada e nova manifestação da registradora, o benefício foi revogado (fls. 11/15 eTJ).

Pois bem.

De fato, a Oficial do Cartório de Registro de Imóveis não tem, com arrimo no art. 100 do CPC, citado pelo juiz de origem na decisão ora recorrida, legitimidade para impugnar, ainda que sob o título de representação, a Justiça Gratuita concedida.

Com efeito, como salientei à fl. 20, “o art. 996, parágrafo primeiro do CPC, que apresenta modificação pequena em relação ao que dispunha o art. 499, parágrafo único do CPC/1973, ao definir terceiro interessado em recorrer, diz cumprir ao terceiro demonstrar a possibilidade de a decisão sobre a relação jurídica submetida à apreciação judicial atingir direito de que se afirme titular ou que possa discutir em juízo como  substituto processual.

O mero interesse econômico nas custas que poderão ser exigidas da interessada se a ação for julgada procedente e quando apresentado a registro o respectivo mandado, e que estaria a agravante isenta se mantido o benefício da AJ (art. 98, IX do CPC), não parece, nesta primeira análise do caso, confundir-se com interesse jurídico, na expressão emprestada do dispositivo do CPC antes anotado.”.

Contudo, a revogação deve ser mantida com fulcro no art. 99, § 2º, primeira parte, do CPC (o juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade).

Independentemente da representação, e tendo em vista a finalidade da Justiça Gratuita e que todos devem zelar pela observância da legalidade e pela boa gestão do patrimônio público, não é possível ignorar os documentos amealhados pela Cartorária.

Com efeito, como bem resumiu o juiz de origem, “a autora apresenta patrimônio incompatível com a benesse da assistência judiciária gratuita. Segundo a Oficiala, que goza de fé pública, a autora é proprietária registrária, ao menos na proporção de 50% (cinquenta por cento), de 13 (treze) imóveis, perfazendo, assim, um patrimônio aproximado a R$ 2.300.000,00. Tais alegações são corroboradas pelos termos de pagamento da meação homologado no inventário dos bens deixados pelo falecimento de Doracy Augusto de Godoy, distribuídos sob n. 0000006-64.2013.8.26.0450, em que 10 (dez) imóveis foram partilhados àquela época (agosto de 2014).”.

É certo que tem proventos mensais de aposentadoria na ordem de R$1.964,57, contudo, mesmo auferindo esse pequeno valor, consegue manter inúmeros imóveis (pagando tributos, realizando a limpeza e a manutenção dos diferentes tipos de imóveis e etc.), o que indica que provavelmente tem outras fontes de renda (como aluguéis) ou valores depositados em contas bancárias que lhe dão rendimentos.

Além disso, segundo o plano de partilha da herança deixada pelo ex-cônjuge da agravante, por ela apresentado, não teve a recorrente dificuldade alguma em “repor” a diferença de R$13.748,18 em favor das demais herdeiras.

Enfim, o recurso pouco faz para justificar a pretensão de manter os benefícios da Justiça Gratuita, explicando, por exemplo, como a recorrente administra tantos imóveis com tão pouco, o que beira à litigância de má-fé, e demonstra desapreço por todos os profissionais que trabalham ou trabalharão neste processo, e que devem ser remunerados, pela Fazenda Pública, responsável direta pelo custeamento da prestação dos serviços judiciários, e pelo contribuinte, responsável indireto pelo custeamento do Poder Judiciário.

O recurso, em suma, limita-se a levantar questões formais e a dar valor absoluto ao documento que comprova o valor de sua aposentadoria.

Por todo o exposto, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO ao agravo.

MIGUEL BRANDI

Relator

 



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