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VALOR ECONÔMICO – 12/2/2007

Nova legislação aumenta o nível de segurança do comprador de imóvel


Mônica Izaguirre


As transações imobiliárias ficaram mais seguras desde que entrou em vigor, no último dia 21 de janeiro, a Lei Federal 11.382, sancionada pelo presidente Lula no início de dezembro. Considerado um avanço histórico por bancos e empresários do ramo, a mudança evita que compradores de boa-fé percam o imóvel por desconhecer ações de execução de dívida contra o vendedor, passíveis de resultar em penhora do bem.

A anulação da venda em decorrência de penhora agora só é possível se a existência da ação que resultou na ordem judicial tiver sido comunicada ao cartório onde está registrado o imóvel, antes da transação.

A grande novidade trazida por essa alteração do código de processo civil é a presunção de boa-fé daquela terceira pessoa que comprou o imóvel”, explica o advogado Carlos Fleury, superintendente da Associação Brasileira das Entidades de Crédito e Poupança (Abecip, que representa os bancos que operam financiamento de imóveis).

O exeqüente (quem está cobrando a dívida) só poderá alegar má-fé e fraude à execução se a ação ou a ordem de penhora dela resultante tiver sido incluída antes na matrícula do imóvel junto ao cartório”, conclui o superintendente da Abecip.

A legislação anterior não previa a possibilidade de alguém averbar na matrícula de um imóvel – ou seja, fazer constar no histórico desse imóvel junto ao cartório de registro – o ajuizamento de ações de execução de dívida contra o proprietário. A lei só previa a averbação da penhora. O problema é que, mesmo quando esse direito de averbação não era exercido pelo credor da dívida, em caso de venda a terceiros, o comprador do imóvel corria o risco de perdê-lo, afirma Fleury.

Daí a razão de os bancos financiadores exigiram tantas certidões relacionadas ao vendedor, mesmo quando não aparecia nenhum impedimento na certidão do imóvel (certidão de ônus reais).

O próprio superintendente da Abecip já teve como cliente uma pessoa que, meses depois de comprar um imóvel sem qualquer ônus junto ao cartório de registro, foi surpreendida por um Oficial de Justiça, dizendo que a transação foi anulada porque o imóvel estava penhorado. Para não perder o bem, ela se viu obrigada a quitar a dívida do vendedor. Desse modo, “acabou pagando duas vezes”, afirma Fleury.

Não existe nenhum levantamento sobre quantos são esses casos. O risco de anulação era maior principalmente quando a dívida estava sendo executada em praça diferente da do imóvel, pois, aí, era mais difícil o comprador descobrir a sua existência, mesmo tomando o cuidado de exigir certidões negativas do vendedor.

Com a entrada em vigor da Lei 11.382, “a preocupação se inverteu”, diz o superintendente da Abecip. Como a lei permite avisar o cartório logo que a ação é ajuizada, quem move a execução é quem precisa tomar a iniciativa de evitar que determinado imóvel seja vendido a terceiros antes do pagamento da dívida. A venda pode até ocorrer, mas, pelo menos, não sem que esse terceiro tenha conhecimento do risco envolvido na transação, explica o advogado.

Patricia Ferraz, diretora de assuntos legislativos do Instituto de Registradores Imobiliários do Brasil (IRIB, que representa os cartórios desse segmento), considera que a nova lei vale inclusive para ações de execução que já estavam em andamento.

Apesar disso, o Irib não detectou, por enquanto, nenhuma corrida aos cartórios de imóveis para averbá-las. Ela alerta aos advogados que, sem essa averbação, que em São Paulo custa cerca de R$14, “essas ações não conseguirão mais atingir os imóveis” de propriedade dos devedores executados, se eles vierem a ser vendidos.

Patricia acredita que ainda não houve uma corrida porque a grande maioria dos advogados não se deu conta, até agora, da dimensão da mudança proporcionada pela Lei 11.382.

Foi um grande passo”, comemora Marcos Augusto Netto, presidente do Secovi (sindicato dos corretores de imóveis) do Mato Grosso do Sul, sindicato que reúne imobiliárias, construtoras e incorporadoras de imóveis. Ele acredita que, com a maior segurança, haverá estímulo às transações. Segundo o Irib, a compra e venda de imóveis movimenta cerca de 18 bilhões por ano no Brasil.

O presidente do Secovi/MS diz que a comemoração só não é maior porque o Congresso ainda não aprovou um projeto de lei, de iniciativa da Câmara dos Deputados, que manda registrar na matrícula do imóvel todo e qualquer evento que possa implicação sobre aquele imóvel, como outros tipos de ação judicial, que não a de execução, e também eventos que não envolvam ação judicial. O projeto, o mesmo que trata das regras de parcelamento do solo urbano e da regularização de assentamentos irregulares, não tem previsão para ter sua tramitação retomada.

Quando o princípio da concentração na matrícula for adotado, aí sim haverá segurança jurídica completa para as transações imobiliárias”, diz Netto, sem menosprezar, porém, a inovação trazida pela Lei 11.382.

Carlos Fleury, da Abecip, explica que, se essa outra mudança também for aprovada, aí sim os bancos poderão começar a pensar em dispensar a exigência das certidões relativas ao vendedor, pois bastará a certidão do imóvel. Isso reduzirá o custo das transações. O litígio ou outro fato que não estiver nela registrado não poderá anular a venda de um imóvel. Isso valeria inclusive para ações administrativas de órgãos públicos, entendem Fleury e Patricia Ferraz. Fleury destaca que a adoção do princípio também acabará com os contratos de gaveta, que hoje só existem porque a Justiça costuma reconhecê-los, até quando há hipoteca anterior.

(Valor Econômico/SP, Caderno de Economia, 12/2/2007).



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