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Inventário, separação, divórcio e partilha - Certidões negativas de débito
Alcance do art. 22 da Resolução nº 35, do Conselho Nacional de Justiça


Antônio Herance Filho *

Tem representado alguma dificuldade prática a questão da exigibilidade de certidões negativas de débitos quando da lavratura de Escritura Pública de Inventário, Separação, Divórcio e Partilha, tendo em vista as disposições contidas na Resolução CNJ nº 35/2007 e na legislação em vigor, especialmente no Regulamento da Previdência Social e no Código Tributário Nacional.

Para a compreensão adequada da matéria, convém separar os atos relativos à partilha dos bens deixados pelo autor da herança dos relativos à partilha de bens decorrente da divisão do patrimônio comum ou de qualquer outro ato “inter vivos”.

Escritura Pública de Inventário e Partilha de Bens

Nos inventários e partilhas de bens deixados pelo autor da herança temos a transmissão causa mortis de bens e direitos, cujo fato gerador ocorre na data da abertura da sucessão e a competência tributária está, conforme estabelece o art. 155, inciso I, da Constituição Federal, nas mãos dos Estados e do Distrito Federal.

Também compete aos Estados e ao Distrito Federal a tributação incidente sobre as transmissões “inter vivos”, a título não oneroso, de bens e direitos entre herdeiros, legatários, viúvo meeiro e terceiros que, porventura, sejam formalizadas pelo mesmo ato notarial.

No primeiro caso, o transmitente é o espólio do autor da herança e dele exige-se prova de quitação de todos os tributos relativos aos seus bens e às suas rendas, conforme prescreve o art. 192 do Código Tributário Nacional (CTN).

No Estado de São Paulo, o Grupo de Estudos instituído pela Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, para o estudo da aplicação da Lei nº 11.441/07, já havia concluído pela necessidade de apresentação da Certidão Negativa Conjunta da Receita Federal do Brasil e da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (subitem 4.11.10 das conclusões referentes ao inventário e à partilha), o que acabou sendo, de certo modo, confirmado pelo Conselho Nacional da Justiça.

Com efeito, a disposição contida na letra “g” do art. 22, da Resolução CNJ nº 35/2007, que obriga a apresentação de certidão negativa de tributos, refere-se às provas de quitação de todos os tributos relativos aos bens do espólio, ou às suas rendas, com fulcro no art. 192 do Código Tributário Nacional – CTN.

E nem poderia mesmo tratar de exigibilidade das certidões negativas da Lei nº 8.212/91, atualmente regulamentada pelo Decreto nº 3.048/99 (RPS), por absoluta falta de previsão legal.

O RPS traz hipótese de exigibilidade das certidões negativas (INSS e RFB+PGFN) que requer seja o transmitente EMPRESA para os fins da legislação previdenciária, ou seja, há que ser empresário ou sociedade que assume o risco de atividade econômica, ou estar equiparado a empresa conforme conceito fornecido pelo inciso I, do parágrafo único, do art. 12 do RPS, in verbis:

art. 12 – Consideram-se: I – Empresa – a firma individual ou a sociedade que assume o risco da atividade econômica urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, bem como os órgãos e as entidades da administração pública direta, indireta e fundacional; e
(...)
Parágrafo único – Equiparam-se a empresa, para os efeitos deste Regulamento:
I – o contribuinte individual, em relação a segurado que lhe presta serviço
.”

Não há, portanto, como ser aplicada a regra de exigibilidade do art. 257, I, “b”, do RPS nas transmissões “causa mortis” porque não se revela possível a equiparação do espólio à figura da empresa, como pudemos ver com a transcrição do dispositivo que cuida do conceito de empresa e das hipóteses de sua equiparação.

Ademais, por meio da lavratura da competente Escritura Pública de Inventário e Partilha, o que se pretende é a formalização dos atos e fatos jurídicos que se seguem ao óbito, à abertura da sucessão. A transmissão “causa mortis”, bem por isso, não está condicionada a prática de referido ato notarial. A lavratura da escritura é ato que formaliza o inventário e a partilha, mas não tem o condão de interferir na ocorrência da sucessão. Trata-se, pois, de transmissão involuntária, logo, inaplicável a disciplina da Lei nº 8.212/91 e de seu decreto regulamentador (Decreto nº 3.048/99), especificamente no que concerne à alienação (em sentido amplo) dos bens e direitos deixados pelo autor da herança.

Escritura Pública de Separação, Divórcio e Partilha de Bens

Nos casos de divisão do patrimônio comum, próprio das separações e divórcios, a partilha de bens, quando igualitária, produz efeitos meramente declaratórios. Não ocorre a transmissão de bens, mas, apenas, a localização do quinhão (meação) de cada um, pese embora, para os fins de aplicação da legislação municipal (ITBI) tenha decidido o Colendo Conselho Superior da Magistratura (Ap. Cível 372-6/9, da Comarca de Patrocínio Paulista, DOE de 24.11.2005), com apoio em respeitável doutrina, no sentido da ocorrência de transmissão da propriedade imobiliária, caso um dos cônjuges receba parcela maior em imóveis do que o outro, ainda que a divisão respeite a meação de cada um.

Como o Direito Tributário é direito de sobreposição, ainda que nos cumpra o dever do alerta, seguimos na crença de que o conceito de natureza civil é suficiente para a afastar a incidência do imposto municipal tendo em vista a inocorrência de transmissão, elemento essencial à verificação do fato gerador da exação referida.

Mas se a divisão do patrimônio comum se der de forma desigual, surgirá, inequivocamente, o fato gerador do imposto incidente sobre a transmissão. E é irrelevante qual seja ele, o de competência estadual ou o municipal. O que importa é que terá ocorrido na hipótese, a alienação, a qualquer título, de bem imóvel ou direito a ele relativo, desde que, é claro, no patrimônio comum haja bem dessa natureza.

Reconhece-se aqui a grande dificuldade, na maioria dos casos, em se perceber a ocorrência de transmissão de bens imóveis ou de direitos a eles relativos, levando-se em consideração que esse tipo de bem e de direito estão, no mais das vezes, inseridos num contexto maior.

De qualquer modo e para facilitar a compreensão da hipótese, admitamos que no patrimônio comum do casal haja um único bem, um imóvel, e que por convenção esse imóvel coube integralmente ao cônjuge “A”. Sem dúvida, ocorreu a alienação de bem imóvel (fração ideal) de “B” para “A”.

Se “B”, pessoa física, estiver equiparada a empresa, nos termos do art. 12 do RPS, cuja redação foi acima reproduzida, dele deverá o Notário que lavrar a escritura de separação ou divórcio e partilha, exigir, apenas, a certidão do INSS, todavia, se não tiver dado ensejo à equiparação deverá o Notário tomar-lhe declaração desta circunstância.

Em nenhuma hipótese poderá o Notário, e via de conseqüência o Oficial de Registro, exigir a certidão conjunta RFB + PGFN, mesmo no caso de equiparação do transmitente a empresa, porque das pessoas físicas estas não são, em nenhum momento, exigíveis (§11, do art. 257 do RPS).

Conclusões:

Considerando-se as Escrituras Públicas de Inventário, Separação, Divórcio e Partilha concluímos que:

- Nas transmissões “causa mortis” não se aplica a regra de exigibilidade da alínea “b”, do inciso I, do art. 257 do RPS (Decreto nº 3.048/99).

- Nas transmissões “inter vivos” quando a operação tiver por objeto bem imóvel ou direito a ele relativo e o transmitente, alienante para os fins aqui vistos, estiver equiparado a empresa pela regra do art. 12 do Decreto nº 3.048/99, deste o Notário deverá exigir a prova de inexistência de débitos expedida pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS como condição para a lavratura da escritura, mas se equiparado não estiver bastará que tome declaração desta circunstância. Em qualquer das hipóteses, equiparado ou não, não há que se falar na certidão conjunta (SRF + PGFN) porque das pessoas físicas não se exige tal prova.

* Antonio Herance Filho, advogado, especialista em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, em Direito Constitucional e de Contratos pelo Centro de Extensão Universitária de São Paulo e em Direito Registral Imobiliário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Professor de Direito Tributário em cursos de pós-graduação, inclusive da PUC Minas Virtual, co-autor do livro "Escrituras Públicas – Separação, Divórcio, Inventário e Partilha Consensuais – Análise Civil, processual civil, tributária e notarial", editado pela RT, autor de vários artigos publicados em periódicos destinados a Notários e Registradores. É diretor do  Grupo SERAC, colunista e co-editor do INR - Informativo Notarial e Registral.  [email protected]



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