BE3151
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Meditações gauchescas
Hermenêutica registral
Tópicos para uma hermenêutica registral – parte 5
(fim do primeiro tópico)
Ricardo Dip*
30. O problema cardeal para a hermenêutica de nossos tempos —na esteira, aqui seguida, das meditações de Élissalde— consiste em decidir-se entre alguma possível limitação da atividade interpretativa ou, em contrário, por sua ilimitação apriorística. Reconhecer limites na atividade tanto da razão teórica, quanto da prática, é admitir a possibilidade da crítica, que se clausura, por manifesto, quando o i-limite da interpretação se projete para a infinitude.
31. Debalde se tratará, contudo, de afirmar a razoabilidade no reconhecimento de limites para a interpretação, se não se considerar, à partida, a distinção dos modos limitativos. Porque, de asseverar, sem mais, um a priori demarcatório —presa fácil da adicional e gráfica impostação de que “interpretar sem limites é próprio dos sofistas”—, poderiam recolher-se, de embrulho, restrições epistemológicas (: demarcações de pesquisas) e éticas (: atentados à liberdade de interpretar).
32. Em acréscimo, não deve menosprezar-se o tema da humanidade da interpretação. Vale por dizer, nenhuma interpretação no mundo freqüentado pelos homens —que o habitam politicamente (: na aristotélica afirmação do homem, animal político)— tem sentido sem a instância dos sujeitos cognoscentes, à margem de discriminar-se o emissor e o destinatário das mensagens inter-humanas. A exorbitância de um objetivismo hermenêutico a outrance, a pretexto de evadir o risco do subjetivismo interpretativo, refuta, no fim e ao cabo, o dado antropológico radical na interpretação política (i.e., a efetivada na pólis). Não é demais pensar no episódio da “cesta de figos” —narrado inicialmente por John Wilkins—, recrutado por Umberto Eco, impressivo da discreta reserva que se há de ter quanto a falsos objetivismos.
Tampouco, ainda dentro nesse mesmo quadro, podem contornar-se a conaturalidade de certos saberes e o conhecimento humano por afetividade, que não se confundem, simpliciter, com uma instância romântica e ingênua, à qual, no mais, não se pode negar uma legítima esfera de atuação interpretativa. Sua negação importaria num racionalismo desumanizante.
33. Uma distinção —a que se lançou Élissalde— entre as tarefas de compreender (: dar significação) e de interpretar (: dar significação clara) parece aclimar os limites razoáveis da interpretação ao domínio meramente conceitual. Preservam-se, dessa maneira, as liberdades ética e epistemológica da interpretação, e com isso, admitindo-se a necessidade de pôr-lhe limites (scl.: defini-la, pois definir é indicar fins ou marcos), contrastam-se aí os equívocos do expansionismo interpretativo, daquilo que se designou hermeneutismo, a superinterpretação de Eco, a ultrapassagem de lindes (ou ao menos fronteiras) conceituais.
34. Assim, o leitmotiv da hermenêutica de nossos dias está no enfrentamento de uma teoria —ou talvez: ideologia (: o relativismo hermenêutico: “tudo é releitura”, exacerbação, no mais visível, da intentio lectoris)— de que “tudo é só interpretável” contra a proposição de que “o interpretável é definível”. Não escapa de um óbvio incômodo lógico —por mais isto pareça um tanto perfunctório— a afirmação de que “tudo é só interpretável”, na medida em que esse mesmo enunciado é, ele também, interpretável, de tal modo que, sentença movediça por princípio (essa labilidade é o preço do advérbio “só” que se estampa no texto em pauta), seu significado é necessariamente oscilante. Remanesce, sem embargo da sobressalente dificuldade das intelectuais tarefas humanas, a esperança que interpretar seja, assim o refere Élissalde, aclarar (uma antes limitada) significação para coisas obscuras.
35. No próximo tópico, passaremos a indicar, em breves linhas, o tema da função da tarefa interpretativa no domínio dos princípios registrários.
* Ricardo Dip é desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo.
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