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A função notarial e as leis de mercado
Juan Bolás Alfonso*


Se há algo posto em relevo pela História deste Século que estamos a ponto de abandonar foi a absoluta superioridade dos sistemas sociais organizados tendo por base os princípios de liberdade, face aos sistemas dirigentes e, conseqüentemente, protegidos diante da deletéria busca individual da própria felicidade.

Para o notariado, tal como o conhecemos, esta foi, sem dúvida alguma, uma boa notícia. Somente no âmbito de um sistema que ampare as regras da autonomia da vontade, a livre escolha e a auto responsabilidade, é possível que o notário cumpra uma eficaz função social. Precisamente por isso, o Notariado floresceu onde pôde ganhar a confiança dos cidadãos que se percebem livres, tendo fenecido, inexoravelmente, nos lugares em que as pessoas se tornaram subitamente subjugadas.

Mas a constatação desta realidade não pode ser motivo tão-só de auto complacência. Deve levar-nos a uma reflexão face aos desafios que o novo século propõe. Hoje, a ameaça ao Notariado – e a sua companheira inseparável, a autonomia e independência do cidadão – não ocorre provocada por qualquer ideologia indicadora de fins que correm à margem dos verdadeiramente anelados pelos particulares. Mas tal ocorre precisamente pelo oportunismo de alguns dos protagonistas da livre iniciativa que, amparados por uma legítima posição de força no mercado, aspiram dela abusar em prejuízo do próprio sistema, inclusive chegando a pretender condicionar a forma em que o Notariado desenvolve sua função.

O Notariado, como um dos instrumentos tuteladores da liberdade de contratação e de sua adequação à legalidade, deve perceber com preocupação qualquer intento de desnaturação que traga como conseqüência a postergação dos interesses do consumidor e do contratante débil. O tema é especialmente preocupante, devendo-se advertir que alguns desses intentos, com efeito bem maquilados, adotaram uma roupagem terminológica própria de uma sociedade aberta: liberdade, concorrência, desregulamentação, mas traindo claramente sua finalidade e espírito. E o que é ainda pior: em certas ocasiões, tem conseguido arrastar o bem intencionado mas confuso responsável político à elaboração de projetos que, somente de uma perspectiva que poderíamos qualificar de frívola, podem ter a mínima inserção num mercado verdadeiramente eficiente.

O Notariado não pode ter medo da concorrência, entre outros motivos porque este foi sempre o elemento natural em que se tem desenvolvido. Mas o que se deve temer, entretanto, é o intencional esquecimento de sua crucial função pública, criada a serviço de um dos pilares fundamentais da sociedade moderna: a Segurança Jurídica. Ainda que se a avalie tão-só de um estrito ponto-de-vista econômico, com total olvido de sua significação política, mereceria melhor consideração e estudo do que parece encontrar em algumas esferas de responsabilidade. A peculiar configuração da instituição notarial não obedece a qualquer privilégio. Se assim fosse, mais de um século e meio de mercado haveria de denunciá-lo em algum lugar da Europa continental e, sem qualquer dúvida, os caracteres fundamentais da função permanecem inalterados em toda a parte. Assim é pela simples razão de que obedecem a necessidades sociais verdadeiramente sentidas, que descansam na indispensável atividade pública que presta o Notário e que se concretiza – embora não de forma exclusiva – no controle de legalidade e na defesa dos interesses da parte débil e de terceiros não contratantes.

Se a proteção de um mercado que se persegue verdadeiramente livre e eficiente nunca impediu as autoridades públicas – e assim deve ser – de adotar as medidas reguladoras e de intervenção econômica necessárias para sua defesa, não se explica por quê não deva seguir tutelando aqueles instrumentos institucionais que, como o Notariado, melhor têm defendido desde sempre dita liberdade. Não se compreende que, abandonados aos azares do mercado, se possam ver impossibilitados, paradoxalmente, de cumprir a função social que sustenta dita proteção. Os gatekeepers – ou controladores de legalidade – que dependem excessivamente de seus clientes, apresentam um elevado grau de riscos. Arriscar o correto funcionamento de uma instituição, que durante décadas demonstrou sua eficiência – à guisa de uma hipotética redução de custos – além de temerário, demonstra a incapacidade de compreender que hoje as opções do legislador se movem exclusivamente entre dois sistemas perfeitamente legítimos, porém absolutamente incompatíveis, sem que seja possível a criação de híbridos que provavelmente o mais longe que poderiam chegar é consolidar os defeitos, de ambos sem as vantagens de qualquer.

Por tudo isso, hoje mais do que nunca faz-se necessário um esforço conjunto destinado a explicar o caráter público da função notarial e a sua extraordinária importância social e econômic – ao lado das nefastas repercussões que uma pouco meditada desnaturação possa provocar em prejuízo de alguns dos mais fundamentais valores que uma sociedade verdadeiramente livre deve proteger.

* Juan Bolás Alfonso é o Presidente do Conselho Geral do Notariado de Espanha e notário em Madri. Editorial publicado em Notarius International, Vol. 4, 1999, p. 146-250. Tradução Sérgio Jacomino. O título não consta do original.



Penhora. Bem vinculado à cédula de crédito industrial. Débito trabalhista.


A E. 1ª Turma não conheceu do recurso de revista do Banco do Brasil no tema "Penhorabilidade de bem vinculado à cédula de crédito industrial", com fundamento, no § 4° do art. 896 da CLT e no Enunciado 266.

O reclamado ajuíza embargos à C. SBDI-1, apontando violação dos artigos 896 da CLT, e 5°, II, XXXV, XXXVI, LIV e LV, da Constituição Federal. Traz arestos a confronto.

O acórdão impugnado encontra-se assim ementado:

"Execução de sentença - Penhorabilidade - Bem vinculado à cédula de crédito industrial - Violação constitucional não configurada. É possível a penhora de bem vinculado à cédula de crédito industrial para satisfazer débito trabalhista, tendo em vista a natureza alimentar do crédito.

Quando o processo se encontra em fase de execução, o recurso de revista só é viável na hipótese de demonstração inequívoca de violação direta de dispositivo da Carta Magna, nos termos do § 4° do art. 896 da CLT e do Enunciado 266 deste TST."

O paradigma de fls. 161/162, por sua vez, consigna que, mesmo em execução trabalhista, existindo cédula de crédito pignoratício, inviável a penhora sobre o bem, sob pena de afronta aos princípios do direito adquirido e do ato jurídico perfeito, previsto no art. 5°, XXXVI, da Constituição Federal.

Configurada a divergência, admito os embargos, para melhor exame da matéria por esta E. Corte.

(...)

Brasília, 8/9/99. Ministro Almir Pazzianotto Pinto, Presidente da Turma. (Processo Nº TST-E-RR-517.127/98.4 – 6ª Região; DJU 15/9/99; pg.21)



Servidão. Extinção. Inocorrência.


Processual civil e civil. Servidão. Extinção. Inocorrência. Código civil, art. 702. Recurso especial. Prequestionamento implícito. Admissibilidade. Recurso provido.

I - São numerosos os precedentes nesta Corte que têm por ocorrente o prequestionamento mesmo não constando do corpo do acórdão impugnado a referência ao número e à letra da norma legal, desde que a tese jurídica tenha sido debatida e apreciada.

II - Embora reconhecendo o acórdão estadual ter sido regularmente constituída a servidão, assim como o seu uso pelo prédio dominante, houve por bem a decisão impugnada em conceder a "manutenção de posse" aos autores, embaraçando o exercício da servidão não cancelada e negando vigência ao comando do art. 702 do Código Civil, segundo o qual "o dono do prédio serviente não poderá embaraçar de modo algum o uso legítimo da servidão".

(Recurso provido – 4ª Turma/STJ)

Brasília, 17/6/99. Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. (Recurso Especial Nº 94.852/SP; DJU 13/9/99; pg. 66)



Condomínio. Convenção não registrada. Validade para regular as relações entre as partes.


Civil. Condomínio. Convenção aprovada e não registrada. Obrigatoriedade para os condôminos. Precedentes. Loja autônoma. Despesas comuns. Critério de rateio expresso na convenção, conforme Art. 12, § 1°, lei 4.591/64. Validade. Recurso não conhecido.

I - A convenção de condomínio aprovada e não registrada tem validade para regular as relações entre as partes, não podendo o condômino, por esse fundamento, recusar-se ao seu cumprimento.

II - É livre a estipulação do critério de rateio das despesas comuns, pela convenção de condomínio, nos termos do Art. 12 da Lei 4.591/64.

III - A verificação da aprovação ou não da convenção pelo mínimo de dois terços dos condôminos implica em reexame de provas, vedado a esta instância, nos termos do enunciado n° 7 da súmula/STJ.

IV - A simples transcrição de ementas não é suficiente para a caracterização da divergência jurisprudencial.

(Recurso não conhecido – 4ª Turma/STJ)

Brasília, 5/8/99. Relator: Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira. (Recurso Especial Nº 128.418/RJ; DJU 13/9/99; pg. 67)



Penhora anterior à Lei 8009/90. Incidência.


Execução. Imóvel residencial. Penhora efetivada antes da edição da lei n° 8.009, de 29.03.90.

Não se tendo ainda exaurido a execução pela alienação do bem penhorado, admissível é a incidência da Lei n° 8.009/90 sobre a penhora efetuada antes de sua vigência.

Precedentes.

Recurso especial conhecido e provido. (4ª Turma/STJ)

Brasília, 24/6/97. Relator: Ministro Barros Monteiro (Recurso Especial Nº 128.719/SP; DJU 13/9/99; pg. 67)



C/V. Ausência de registro. Mora.


Promessa de compra e venda. Registro. Mora. Súmula nº 76 da Corte.

1. Nos termos da Súmula n° 76 da Corte a ausência de registro não dispensa a prévia interpelação para constituir o devedor em mora.

2. Recurso especial não conhecido. (3ª Turma/STJ)

Brasília, 16/8/99. Relator: Ministro Carlos Alberto Menezes Direito. (Recurso Especial Nº 165.055/CE; DJU 13/9/99; pg. 64)



ITBI: Interpretação.


Tributário - ITBI: Isenção - Art. 37, § 1º do CTN: interpretação.

1. O dispositivo indicado, ao exigir que, durante dois anos antes ou depois da aquisição, não haja atividade com venda de imóveis, não ordenou que fosse examinada a situação fática concomitante: dois anos antes e também dois anos depois.

2. Interpretação errônea da Lei (art. 37, § 1° do CTN).

3. Recurso especial não conhecido. (2ª STJ)

Brasília, 10/8/99. Relatora: Min. Eliana Calmon. (Recurso Especial Nº 111.941/RJ; DJU 13/9/99; pg. 48)



Arrematação. Fraude de execução não caracterizada.


Processo civil. Ação de anulação de arrematação. Imóvel dado em pagamento por escritura registrada quando não havia transcrição de qualquer ato de constrição sobre o imóvel. Fraude de execução não caracterizada. Art. 659 § 4° CPC. Orientação doutrinário-jurisprudencial. Recurso provido.

I - Para a caracterização da fraude de execução, relativa à alienação de bem constrito, e indispensável a inscrição do gravame no registro competente, cabendo ao exeqüente, na ausência desse registro, provar que o terceiro adquirente tinha ciência do ônus que recaia sobre o bem.

II - Exatamente para melhor resguardar o terceiro de boa-fé, a reforma introduzida no Código de Processo Civil pela Lei 8.953/94 acrescentou ao Art. 659 daquele estatuto o § 4°, segundo o qual, "a penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora, e inscrição no respectivo registro".

III - Não prevalece a arrematação, contra o pedido de anulação feito pelo proprietário, que não é o executado, se o arrematante não demonstra que à época da transferência da propriedade o adquirente tinha conhecimento da existência da penhora.

(Recurso provido. 4ª Turma/STJ)

Brasília, 10/8/99. (Recurso Especial Nº 215.306/MG; DJU 13/9/99; pg. 72)



Condomínio. Área comum x fração ideal.


(...) Recurso especial contra acórdão que manteve a improcedência de ação de manutenção na posse. Alegou que foram contrariados o artigo 524 do código Civil e o artigo 5°, XXII da Constituição Federal, vez que violado seu direito de propriedade. Sustentou que houve o aumento de sua área útil na garagem, quando da compra, pelos condôminos, de quarenta e sete das cento e trinta vagas existentes. Afirmou que não estaria ocupando área comum.

Negado seguimento ao recurso, interpôs-se o presente agravo de instrumento.

Entendeu o tribunal de origem, com base na prova dos autos, que o autor estaria invadindo área comum do condomínio e que não houvera aumento de sua fração ideal. Alterar tal premissa, a fim de acolher a tese do ora agravante implicaria novo exame do conjunto fático-probatório, vedado em sede de recurso especial, nos termos do enunciado da Súmula 7 desta Corte.

Cumpre ressaltar que não cabe ao Superior Tribunal de Justiça, em recurso especial, analisar eventuais violações à Constituição Federal, competência restrita ao Supremo Tribunal Federal.

Nego provimento.

Brasília, 8/9/99. Ministro Eduardo Ribeiro, Relator. (Agravo de Instrumento Nº 249.286/SP; DJU 17/9/99; pg.139)



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