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Contrato de c/v. Comprador pode pedir rescisão por descumprimento antecipado.


O comprador pode entrar com o pedido de desistência ou rescisão do contrato, caso alguma atitude ou acontecimento relacionado à empresa contratada indique que o acordo não será cumprido. Essa foi a conclusão unânime da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça. Os ministros confirmaram as decisões de primeiro e segundo grau rescindindo o contrato de compra de um imóvel entre Luciano Camillo de Souza e a Carvalho Hosken S/A Engenharia e Construções. Faltando pouco mais de um ano para a entrega do imóvel adquirido por Souza, a construção do empreendimento ainda não teria sido iniciada.

No mês de julho de 1996, o economista Luciano Camillo assinou um contrato com a Carvalho Hosken para a compra de um apartamento no Residencial Star Lake / Vega Lake, no Rio de Janeiro, com uma área maior que o bairro do Leblon. A entrega do imóvel, popularmente conhecimento como "Rio 2 - o maior centro de consumo e lazer da América Latina", estava prevista para novembro de 1999. Com o acordo de financiamento, o comprador passou a pagar as prestações assiduamente. Porém, em julho de 1998, Luciano Camillo constatou que a construção ainda não teria sido iniciada, além de ter conhecimento do processo de falência da empresa contratada para a obra, a Encol.

Temendo que o empreendimento ficasse "só no papel" e ainda a perda da quantia investida, o comprador entrou com um processo pedindo a rescisão do contrato ou a decretação do seu direito de desistir do acordo, com a devolução de R$ 24.011,86 (valores de julho de 1998), quantia já paga pelo imóvel. Na ação, Luciano Camillo alegou inadimplemento antecipado do contrato pela Carvalho Hosken pelo fato da empresa não ter nem iniciado a construção. "Até mesmo um leigo sabe que será impossível a suplicada efetuar a entrega do imóvel no prazo pactuado", destacou o comprador. Luciano Camillo também requereu o pagamento de uma indenização no valor de mil salários mínimos por perdas e danos.

O pedido do comprador foi acolhido pela primeira instância, sendo rejeitada, apenas, a indenização por perdas e danos. A sentença determinou à Carvalho Hosken a devolução de tudo já pago por Luciano Camillo, com a correção dos valores desde o vencimento de cada parcela. A decisão também anulou a cláusula do contrato prevendo a retenção de parte da quantia paga em favor da empresa devido à rescisão do acordo. A Carvalho Hosken apelou, mas o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve a sentença. Com a decisão desfavorável, a empresa recorreu ao STJ.

"Quando a devedora da prestação futura toma atitude claramente contrária ao avençado, demonstrando firmemente que não cumprirá o contrato, pode a outra parte pleitear a sua extinção", destacou o ministro Ruy Rosado de Aguiar ao rejeitar o recurso da empresa. Com isso, a Quarta Turma manteve as decisões anteriores reconhecendo o direito de Luciano Camillo. Ruy Rosado lembrou julgamentos no mesmo sentido de seu voto, afirmando ser "possível o inadimplemento antes do tempo". Segundo o relator, o descumprimento antecipado "ocorrerá sempre que o devedor, beneficiado com um prazo, durante ele, pratique atos que, por força da natureza ou da lei, faça impossível o futuro cumprimento".

A respeito da quantia a ser devolvida ao comprador, o ministro também manteve o entendimento da sentença e do TJ-RJ. Para Ruy Rosado, a cláusula prevendo perda de parte dos valores pagos à construtora devido a rescisão do contrato não tem validade, principalmente no caso em discussão, "em que se está atribuindo à ré (construtora) a culpa pelo inadimplemento". Processo: RESP 309626 (Notícias do STJ, 18/6/01: "Comprador pode pedir rescisão de contrato por seu descumprimento antecipado")
 



Condomínio de prédio comercial pode restringir utilização de garagem


A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça rejeitou pedido de dois condôminos de um prédio comercial para anular decisão coletiva dos proprietários das salas de restringir os horários de utilização da garagem. Por razões de segurança e economia, assembléia-geral do condomínio estabeleceu o funcionamento da garagem de segunda-feira a sábado, das 6h às 22h. Para os cirurgiões-dentistas José Chimeli e Pedro Alves de Alcântara Filho, a restrição atenta contra o direito de propriedade e o livre exercício da profissão.

Sentença de primeiro grau julgou legais as normas adotadas pela assembléia "pois refletem a vontade da maioria e a supremacia do interesse social sobre o interesse individual, mesmo que em detrimento da vontade de alguns". Da mesma forma, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro julgou não haver ofensa ao direito de propriedade e considerou que o direito à garagem "é acessório, não se constituindo direito individual de propriedade".

Doador e donatário de um imóvel no edifício Professional Building, em Copacabana, Rio de Janeiro, Chimeli e Alcântara Filho afirmam que a lei assegura ao proprietário o direito de "usar e dispor de seus bens" e que "o domínio presume-se exclusivo e ilimitado, até prova em contrário". Entretanto, para a relatora do processo no STJ, ministra Nancy Andrighi, a decisão da assembléia do condomínio deve ser respeitada. O direito de propriedade admite restrições, já que o interesse coletivo tem supremacia sobre os individuais, esclarece.

Segundo ela, cada condômino tem o direito de usufruir de sua unidade autônoma, segundo suas conveniências e interesses, desde que atendam às normas da boa vizinhança como "usar partes comuns de maneira a não causar dano ou incômodo aos demais nem embaraço ao bom uso das mesmas partes por todos". O condômino, afirma a relatora, não pode, isoladamente, invocar situação particulares (profissão) para não cumprir decisão coletiva. A relatora esclarece ainda que a limitação de horário ao uso do estacionamento do edifício não impede o acesso dos condôminos à salas comerciais, não havendo, assim, "nenhuma limitação séria ao direito de propriedade individual" dos proprietários dos imóveis. Processo: Resp 309802 (Notícias do STJ, 12/6/01)
 



Compromisso de c/v. Comprador com dificuldades financeiras pode pedir rescisão do contrato e devolução das parcelas pagas.


A pessoa que assumiu um compromisso de compra e venda - pagando as prestações em dia -, e não tem mais condições de continuar quitando os valores do acordo pode entrar com uma ação para tentar rescindir o contrato. E, com a rescisão, solicitar a devolução dos valores pagos ao vendedor retirando-se apenas a quantia reconhecida como perdas e danos ao vendedor, que, neste tipo de processo, não tem culpa da rescisão. Esse foi o entendimento unânime da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça. Com isso, a OK e a Recram Empreendimentos Imobiliários Ltda terão que devolver 80% dos valores pagos pelo casal Alves Rodrigues na compra de um imóvel em São Paulo.

O engenheiro João Junior Alves Rodrigues e sua esposa, a analista de materiais Sueli Aparecida Alves Rodrigues, adquiriram, em setembro de 1994, uma unidade do edifício Madson Avenue, em São Paulo. O casal chegou a pagar em dia 20 prestações do acordo, o correspondente a 25% do total. Mas, em novembro de 1995, João Junior e Sueli perceberam que não conseguiriam mais continuar quitando as prestações, pois "haveria sério comprometimento de valores destinados a gêneros de primeira necessidade".

Com isso, o casal tentou um acordo com as empresas responsáveis pelo negócio, o Grupo OK e a Recram Empreeendimentos Imobiliários Ltda, ambos de São Paulo, para tentar transferir o imóvel a terceiros. Mas, até abril de 1996, João Junior e Sueli não conseguiram promover a transferência e, por isso, procuraram novamente as empresas. Nesse segundo contato, o casal tentou rescindir, amigavelmente, o acordo. Assim, a OK e a Recram deveriam devolver o que havia sido pago retendo apenas uma porcentagem a título de perdas e danos.

A segunda proposta não foi aceita pelas empresas, que retiveram tudo pago pelos compradores. Diante do impasse, João Junior e Sueli, com base no artigo 53 do Código de Defesa do Consumidor, recorreram à Justiça buscando a rescisão do contrato e a devolução dos valores pagos, retirando-se a quantia correspondente às perdas e danos. Para o casal, seria inconcebível simplesmente deixar de pagar as prestações e aguardar as providências determinadas às empresas no caso de inadimplemento. A OK e a Recram contestaram a ação afirmando que o direito à devolução das prestações, previsto no CDC, só ocorre quando é o credor quem pede a rescisão do contrato.

A primeira instância negou o pedido do casal, que apelou, obtendo julgamento favorável no Tribunal de Justiça de São Paulo. A decisão de segundo grau rescindiu o contrato e determinou às empresas a devolução de 80% do valor total pago. Segundo o TJ/SP, o casal teria direito à rescisão do contrato, "já ocorrida na realidade" (no momento em que informou não ter condições de continuar pagando os valores), e de discutir as perdas e danos.

Para o Tribunal de Justiça, o fato jurídico gerador do direito dos compradores não teria sido a rescisão contratual por eles provocada, e sim, o abuso das empresas construtoras quando retiveram o valor total das parcelas pagas. "Há, sem dúvida, um prejuízo facilmente perceptível, consistente nos gastos administrativos ligados ao empreendimento. Mas também não se pode esquecer de que a porção construída do apartamento ficou para as rés", acrescentou o julgamento do TJ.

As empresas recorreram ao STJ, mas o Tribunal superior manteve a decisão de segundo grau. O ministro Ari Pargendler, presidente da Terceira Turma, acompanhou o voto do relator do processo, o então ministro Waldemar Zveiter. Segundo Ari Pargendler, é possível a rescisão do contrato, principalmente, por se tratar no processo de promitente comprador adimplente que desistiu do negócio sem dele ter aproveitado, porque nunca teve posse do imóvel. O ministro Pargendler destacou, ainda, o caso do comprador simplesmente deixar de pagar as prestações ajustadas. Nessa hipótese, certamente, a iniciativa de rescindir o contrato seria das vendedoras. "Por que negar esse tratamento ao devedor adimplente, que, sem condições de cumprir as obrigações contratuais, toma iniciativa da rescisão?", enfatizou.

O ministro Carlos Alberto Menezes Direito também acompanhou o voto do ministro Zveiter. Menezes Direito destacou decisões anteriores do STJ, algumas de acordo com o CDC, outras com base no Código Civil, mas todas na direção de se autorizar o pedido de rescisão pelo comprador adimplente. "A jurisprudência dessa Corte, portanto, está sendo consolidada na direção de permitir, presente circunstâncias especiais, peculiares ou particulares que impeçam a continuação do pagamento pelo comprador, ao devedor adimplente a iniciativa da ação para rescindir o contrato". Processo: RESP 200019 (Notícias do STJ, 11/6/01: Comprador adimplente com dificuldades de pagar prestações pode tentar rescindir contrato.)
 



CGJ-SP mantém exigência de exibição de certidão do Incra para averbar mudança de destinação do imóvel.


Empresa comercializadora de lotes formulou pedido à Corregedoria Geral da Justiça de São Paulo, para a revisão do item 148-b, Capítulo XX, das Normas de Serviço, em função da sua dificuldade em obter a certidão de alteração de destinação do imóvel rural, junto ao Incra, com o objetivo de registro de parcelamento para fins urbanos de imóvel rural localizado em zona urbana.

A CGJ-SP encaminhou o expediente à ANOREG-SP e IRIB, para manifestação. A sugestão das entidades foi no sentido da dispensa da certidão do Incra, nos casos de parcelamento aprovado pelo município (ou Distrito Federal), para fins urbanos, de imóvel rural situado em zona urbana, uma vez que o fato de ser dispensada pelo próprio Incra praticamente impossibilita sua obtenção pelos interessados no registro. Veja, a seguir, parecer e decisão sobre o assunto.

PROT. CG nº 54.634/2000

Pedido formulado por empresa comercializadora de lotes, de modificação de norma administrativa que reclama, para a averbação da destinação do imóvel, de rural para urbano, de exibição de certidão emitida pelo INCRA. Exigência que se coaduna com o artigo 53, da Lei n° 6.766/79 e com a instrução baixada pelo órgão competente. Pretensão indeferida e expediente arquivado.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de expediente instaurado a pedido de Santa Alice Urbanização Ltda. objetivando a revisão do item 148-b das NSCGJ, alegando dificuldade na obtenção junto ao INCRA de certidão de alteração de destinação do imóvel rural, necessária para o registro de parcelamento para fins urbanos de imóvel rural, localizado em zona urbana.

Manifestaram-se favoravelmente o Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (IRIB) (fls. 20/23) e a Associação dos Notários e Registradores do Estado de São Paulo (ANOREG/SP) (fls. 46/47). Juntada a Instrução n° 17-b de 22.12.80 do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA) (fls. 35/44).

É o breve relatório.

Passo a opinar.

A norma que se pretende seja revista tem a seguinte redação:

"148. O parcelamento de imóvel rural para fins urbanos deve ser precedido de:

b) averbação de alteração de destinação do imóvel, de rural para urbano, com apresentação de certidão expedida pelo Incra" (Capítulo XX, Seção V, Subseção I, do Tomo II, das NSCGJ - Extrajudicial).

Há que se distinguir a certidão acima mencionada, daquela também expedida pelo INCRA, documento conhecido por CCIR (Certificado de Cadastro de Imóvel Rural), que deve ser acompanhado da prova da quitação do imposto territorial rural relativo ao último lançamento, necessário para a lavratura de escrituras e homologação de partilhas tendo por objeto imóveis rurais (artigo 22, § 1°, da Lei n° 4.947/66 e item 48.1, Seção II, do Capítulo XX, do Tomo II, das NSCGJ).

A norma administrativa desta Egrégia Corregedoria Geral está em consonância com o artigo 53, da Lei n° 6.766/79, a saber : "Todas as alterações de uso do solo rural para fins urbanos dependerão de prévia audiência do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA - do Órgão Metropolitano, se houver, onde se localiza o Município, e da aprovação da Prefeitura Municipal, ou do Distrito Federal quando for o caso, segundo as exigências da legislação pertinente" (grifamos). Não obstante compreensíveis as dificuldades encontradas pelos registradores e pelos loteadores, noticiadas nos autos, enquanto em vigor o preceito legal, não há como, na esfera administrativo-correcional, dispensar a certidão expedida pelo Incra. Se relevada tal providência ou mesmo, se transferida tal exigência para a Municipalidade, estar-se-á tergiversando o regramento legal para fins de alteração de uso do solo rural para finalidade urbana e alterando o sentido da lei.

A Corregedoria Geral não pode disciplinar matéria, por lei, afeta a outros órgãos públicos, sob pena de agir "contra legem". Daí porque a Instrução n° 17-b, de 22.12.80 ser baixada pelo Incra. A norma, pois, deve ser mantida.

Portanto, o parecer que me permito, respeitosamente, submeter ao elevado exame de Vossa Excelência é no sentido de manter-se a norma administrativa tal como se acha em vigor, indeferindo a pretensão de fls. 2, com ciência à empresa solicitante, ao IRIB e à ANOREG/SP e posterior arquivamento do expediente.

Sub censura.

São Paulo, 28 de maio de 2001.

EDUARDO MORETZSOHN DE CASTRO

Juiz Auxiliar da Corregedoria

CONCLUSÃO

Aprovo o parecer do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria por seus fundamentos, que adoto, dando-se ciência e arquivando-se.

São Paulo, 29 de maio de 2001.

LUIZ DE MACEDO

Corregedor Geral da Justiça
 



Retificação de área - divergência entre medida real e registro. Área adquirida ad corpus. LRP. Embargos infringentes.


Ementa: Registro de Imóveis - Retificação de área - Imóvel rural adquirido "ad corpus", com divisas certas e respeitadas pelos lindeiros - Retificação garantida pelos artigos 860 do Código Civil, 212 e 213 da Lei de Registros Públicos n° 6.015/73.

Comprovada divergência entre as medidas reais contidas nos limites certos da propriedade rural e as lançadas no assento do registro público, tem o proprietário direito à sua retificação, nas garantias do art. 860 do Código Civil e dos artigos 212 e 213 da Lei de Registros Públicos n° 6.015/73.

Embargos Infringentes (C. Cíveis) N° 000.164.027-5/01 na apelação cível n° 164.027-5/00 - Comarca de Brumadinho - Embargante(s): Mário Cerne Ribeiro e s/m Aracy Ferber Teixeira Cerne Ribeiro embargado(s): Jd da Comarca de Brumadinho - Relator: Exmo. Sr. Des. Orlando Carvalho

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda a PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, incorporando neste o relatório de fls., na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM ACOLHER OS EMBARGOS, VENCIDO O REVISOR.

Belo Horizonte, 26 de setembro de 2000.

Des. Orlando Carvalho

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

Assistiu ao julgamento, pelos embargantes, o Dr. Alexandre Valadares.

O SR. DES. ORLANDO CARVALHO: Consoante relatório, cuida-se de EMBARGOS INFRINGENTES interpostos buscando a prevalência do voto vencido do Em. Vogal, DES. JOSÉ BRANDÃO DE RESENDE, que dá provimento ao recurso, "para deferir a retificação, nos termos da petição de ingresso dos apelantes", considerando cabível o pedido de retificação de área de sua propriedade rural, nas garantias dos artigos 212 da Lei n.° 6.015/73 e 860 do Código Civil, vendo satisfeitas as condições do § 2° do artigo 213 da Lei n ° 6.015/73, dando por inviável o manejo da ação de usucapião, ante as exigências do art. 924 do CPC, já estando o imóvel registrado em nome do próprio autor (fls. 84/87).

Já o voto predominante do Em. Relator, DES. ANTÔNIO HÉLIO SILVA, apoiado pelo Em. Revisor, DES. GARCIA LEÃO, negou provimento à apelação, entendendo que a retificação de área só é permitida para corrigir erro resultante de divergência entre anotações do registro e as constantes do título aquisitivo, "sendo impróprio o procedimento escolhido pelos requerentes, os quais, somente em ação específica, poderão alcançar o resultado pretendido", vindo o V. acórdão ementado:

"O erro de que trata o artigo 213 da Lei n.° 6.015/73 é o do registro, quando este estiver em descompasso com o título aquisitivo. Havendo identidade entre um e outro, impróprio se torna o pedido retificatório, eis que transforma tal expediente nova forma de adquirir a propriedade, não prevista no Código Civil". (fls. 80).

DATA VENIA do Prolator do voto predominante, Em. RELATOR ANTÔNIO HÉLIO SILVA, apoiado pelo Em. Revisor, DES. GARCIA LEÃO, ponho-me de acordo com o voto vencido do Em. Vogal, DES. JOSÉ BRANDÃO DE RESENDE, que dá provimento ao recurso para deferir a retificação pretendida da área.

Com efeito, a retificação do Registro Imobiliário, ajustando-o à realidade encontrada nos lindes da área adquirida ad corpus, originárias de mensuras diversas ("litro", "quarta", "alqueire mineiro e paulista") é direito garantido no artigo 860 do Código Civil: "Se o teor de registro do imóvel não exprimir a verdade, poderá o prejudicado reclamar que se retifique", termos legais reiterados no art. 212 da Lei de Registros Públicos, sem qualquer limitação quanto ao tamanho do acréscimo.

Os Autores-apelantes-embargantes não buscam qualquer acréscimo na área de sua propriedade, mas tão-só ajustá-la à mensura real existente nos limites definidos, conhecidos e respeitados por todos os lindeiros. Não se trata de "aquisição", de "aumento" da área, mas da "retificação" no registro imobiliário da real mensura existente na área cujo domínio e posse já lhes tocam há muito tempo.

ORA, o art. 860 do Código Civil, repetido no art. 212 da Lei de Registros Públicos n.° 6.015/73, garante a pretensão dos autores ora embargantes, estando satisfeitas as exigências do § 2° do art. 213 da Lei n.° 6.015/73, sendo irrelevante o aumento nominal dos hectares.

Com a maestria habitual, o ilustre Mestre e Magistrado, DES. HUMBERTO THEODORO JÚNIOR, ao relatar a apelação cível n.° 69.719 - Comarca de Coromandel, assentou, com apoio dos seus Pares:

"As regras pertinentes à venda ad corpus ou ad mensuram cuidam das relações entre comprador e têm em mira facultar ou não ao adquirente a exigência de áreas complementares, após o encerramento do negócio e tradição da coisa alienada".

No caso dos autos, não ë isso que se discute, pois não há litígio algum entre vendedor e comprador. A pretensão deduzida em juízo é puramente administrativa, ou seja, a de coadunar os dados do assento do Registro Público com a realidade, porquanto o terreno negociado e matriculado tem, de fato, superfície maior do que a constante de seu registro.

Ora, "segundo a sistemática da Lei n.° 6.015/73, o conteúdo da matrícula do imóvel deve espelhar a realidade, de sorte que ocorrendo divergência dos dados do assento com os verdadeiros elementos da propriedade, lícito será ao interessado obter, por ordem judicial, a retificação, seja de confrontações, seja de área do imóvel" (TJMG, Apel. 67.219, ac. de 28.8.85, in DJMG de 23.4.86).

"Daí a conclusão irrespondível do parecer da douta Procuradoria de Justiça, subscrito pelo ilustre Dr. René Ferrás".

"Verificada a correta metragem da área, através de serviço de agrimensura, impunha-se o deferimento do pedido, nos termos do art. 213 da Lei n.° 6.015/73 (fls. 53)" (Apud "Contratos Jurisprudência", AIDE Editora, RJ, 1° ed., 1988, Vol. I, p.160).

Idêntico entendimento palmilhou o preclaro DES. GARCIA LEÃO, luminar desta 1ª Câmara, no julgamento da apelação cível n.° 32.057-2. , Com. de Itajubá, julgada em 23.8.94, perorando seu irretorquível arrazoado, reportando-se a majoritários julgados de nossos tribunais, espelhados pela ementa:

"... REGISTRO DE IMÓVEIS - Gleba de Terra - Área de 30 ou 40 alqueires mais ou menos - Retificação pleiteada no Registro de Imóveis - Pedido julgado improcedente pelo juiz - Violação do art. 860 do Código Civil - Ação Rescisória procedente - Embargos Infringentes rejeitados".

"Para o fim de retificação de inscrição, não importa que seja grande a diferença entre a realidade da área de terra e a constante do registro de imóveis. O art. 860 do Código Civil não faz nenhuma limitação para que seja possível a retificação. (Embargos Infringentes em ação rescisória 163.415, RT 440/130)".

Razão ainda assiste aos Autores-apelantes-embargantes, ao asseverarem a impropriedade da ação de usucapião ou outra para a pretensão buscada, eis que o imóvel objeto da retificação já está registrado em seu nome, portanto já lhes tocando o domínio e a posse, não pretendendo a aquisição dominial, como, aliás, assentado no voto vencido, cujo apoio lhe empresto.

Não se há de confundir os institutos da retificação de área e formas de aquisição de propriedade, entre elas a compra e a venda e o usucapião, pelos quais se visa a aquisição do título dominial, enquanto que o instituto da retificação do registro de imóveis busca o conserto do título dominial já tido, apenas sem constar toda a área já possuída e com domínio real já constituído.

A pretensão é adequar o registro público imobiliário à realidade fática da propriedade. E tendo ocorrido a aquisição como corpo certo (venda ad corpus), a área toda foi objeto de compra e venda, razão por quê não cabe falar-se em necessidade de usucapião ou outra forma de aquisição.

Atente-se à informação de que o imóvel sempre foi cercado e os Autores, ora Embargantes, ininterruptamente exerceram a posse e o domínio, há mais de 20 anos.

ORA, se a retificação é de área cercada, dentro das divisas certas e respeitadas pelos lindeiros, não há como se negar a retificação no registro, sob pena de se negar vigência ao disposto nos artigos 860 do Código Civil e 212 e 213 da Lei n.° 6.015/73.

Assim, rogando vênia aos prolatores do voto majoritário, ACOLHO OS EMBARGOS, PARA DAR MINHA ADESÃO AO VOTO VENCIDO, ADOTANDO-LHE A CONCLUSÃO, DANDO PROVIMENTO AO RECURSO APELATÓRIO.

O SR. DES. ANTÔNIO HÉLIO SILVA: Com a devida vênia rejeito os embargos nos mesmos termos proferidos por ocasião do julgamento da apelação.

O SR. DES. GARCIA LEÃO: Embora tenha sido o meu voto vencedor quando do julgamento da apelação, vou rever a minha posição e acompanhar o em. Relator.

O SR. DES. JOSÉ BRANDÃO DE RESENDE: Acompanho o em. Relator na mesma linha do voto que deu causa aos presentes embargos.

O SR. DES. PÁRIS PEIXOTO PENA: Já tive ocasião de ser Relator em inúmeros recursos em que se tratou da matéria e o meu posicionamento é exatamente o posicionamento do em. Relator a quem acompanho.

SÚMULA: ACOLHERAM OS EMBARGOS, VENCIDO O REVISOR.
 



Registro de Imóveis. Averbação de conjuntos habitacionais. Cálculo de emolumentos.


A ANOREG-SP foi consultada pela Companhia do Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo - CDHU sobre a cobrança de emolumentos devidos por atos de averbação de conjuntos habitacionais.

Na resposta enviada à CDHU, em 14 de junho, a ANOREG-SP esclareceu os seguintes pontos:

1. Os atos mencionados são regulamentados pelos itens 156 e seguintes da Subseção III, do Capítulo XX das Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de São Paulo (http://www.anoregsp.org.br/menunscgj.html):

"156. Não se aplica o disposto no artigo 18, da Lei Federal nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, para a averbação dos conjuntos habitacionais erigidos pelas pessoas jurídicas referidas no art. 8º da Lei nº 4.380, de 21 de agosto de 1964, salvo se o exigir o interesse público ou a segurança jurídica."

2. Fica evidente, pela simples leitura dos dispositivos, que trata-se de um único ato de averbação para cada conjunto de unidades habitacionais.

3. Custo da averbação. Com a vigência da Lei Estadual nº 10.199 de 30/12/98, publicada no Diário Oficial do Estado de são Paulo de 14/12/99 (art. 2º), as averbações de construção passaram a ter como base de cálculo dos emolumentos, além do valor declarado pelo interessado e do valor fiscal, fixado pelo Município, o valor por metro quadrado de construção, divulgado em revistas especializadas da Construção Civil. Assim, para proceder um ato averbatório de construção, o Oficial de Registro de Imóveis levará em conta, para efeito de cálculo dos emolumentos devidos, o valor do metro quadrado divulgado em revistas especializadas da Construção Civil, de acordo com o padrão da construção apresentado pelo interessado. O padrão da construção do CDHU é "casa popular". Para o cálculo do valor base de um conjunto habitacional, o Oficial deve buscar o valor do metro quadrado global de casas populares no Estado de São Paulo. O Sindicato da Indústria da Construção Civil no Estado de São Paulo - Sinduscon-SP divulga esses indicadores (www.anoregsp.org.br). Em maio/01, o padrão de construção "casa popular" foi fixado em R$ 425,39 o metro quadrado.

4. Exemplo: se um conjunto habitacional apresentar, para averbação, 100 casas de 50 metros quadrados cada, teremos um total construído de 5.000 metros quadrados. Multiplicando-se o total de construção do conjunto pelo valor fixado pelo Sinduscon-SP, chegaríamos a um valor de R$ 2.126.950,00 para o empreendimento. Esse valor total é que servirá de base de cálculo dos emolumentos da averbação, se superior ao valor declarado pelo interessado. Do contrário, tomar-se-á o valor fiscal.

5. Cobrança efetiva dos emolumentos. A CDHU é substituta legal da CDH, criada pela Lei Estadual nº 905/75, que está em pleno vigor, por tratar-se de lei especial não revogável por lei geral, na forma prevista no art. 2º da Lei de Introdução ao Código Civil e consoante já sedimentado pela Jurisprudência (CF. Ag. Inst. n º 195.734.4/3 - Pres. Prudente; Ag. Inst. 166.119.4/6 Panorama / Tupi Paulista entre outros).

Do art. 22, § único da Lei 905/75, extraímos que:

"Art. 22. Os atos, contratos e outros papéis em que a CECAP e as COHABs do Estado sejam partes interessadas ficam isentas de impostos e taxas estaduais de qualquer natureza.

Parágrafo único. Nos processos judiciais em que a CECAP e as COHABs do Estado forem partes ou de qualquer modo interessadas, as custas dos serventuários deverão ser contadas sempre com redução de 50% (cinqüenta por cento), sobre os serviços previstos nos registros em vigor na data dos atos em prática, bem assim, nas custas dos serventuários do foro extrajudicial, de Cartório, de tabeliães, registros civis, de imóveis, de títulos e documentos".

O caput do art. deixa claro que a CDHU é isenta de impostos e taxas estaduais, portanto não está sujeita ao pagamento de custas e contribuições devidas ao Estado e à Carteira, (cfr. Nota Explicativa 4.2 da Tabela IX de Registro de Imóveis).

O parágrafo único beneficia a CDHU com um desconto de 50% nos emolumentos de registros, vale dizer, 50% do valor devido exclusivamente ao Oficial de Registro de Imóveis.

6. Exemplo: o valor normal de uma averbação de R$ 2.126.950,00 seria de R$ 1.561,80. Tratando-se da CDHU, o emolumento total devido seria de R$ 513,75 (50% do valor devido ao Registrador).
 



Execução Hipotecária. Embargos do devedor. Efeito suspensivo.


Processo civil. Agravo de instrumento. Meio utilizado para destrancar recurso especial retido. Juízo de admissibilidade diferido. Possibilidade do relator, no STJ, apreciar os pressupostos recursais pertinentes ao recurso especial. Execução hipotecária. Ajuizamento de ação de embargos do devedor. Suspensão da execução. Art. 5º, parágrafo único da Lei nº 5.741/71 - Revogação pelo art. 739, § 1º do Código de Processo Civil

I- O agravo de instrumento destina-se a verificar a correção ou o desacerto do juízo que aprecia a admissibilidade do recurso especial e obsta a sua ascensão à Corte Superior. A decisão que determina a sua retenção, nos termos do art. 542, § 3º, do CPC, equivale à sua inadmissão. Assim sendo, está o órgão julgador desta Corte Superior autorizado a proceder a análise dos requisitos extrínsecos e intrínsecos do recurso especial, ainda quando inexistia prévio juízo delibatório manifesto pelo Tribunal a quo. Tal medida, que atende as exigências da praxe forense, justifica-se pela imperiosa necessidade de se impedir o perpetrar de delongas e dispêndios no manejo dos recursos, com manifesto prejuízo à prestação jurisdicional, sua satisfatividade e celeridade.

II- À devedora hipotecária devem ser asseguradas garantias processuais mínimas, que estão expressas no texto constitucional vigente, como a ampla defesa e o contraditório, não se admitindo, que no vigente Estado democrático de direito, alguém seja privado de sua propriedade sumariamente, o que exsurge com a simples propositura da ação de execução hipotecária, regida pela Lei nº 5.741/71, uma vez que eventual propositura da ação de embargos do devedor, em execução hipotecária, não seria recebida, a princípio, com o efeito suspensivo, que é exceção nesse procedimento especial.

III- A restrição de direito processual do embargante devedor de dívida hipotecária, com injusta e ilegal diferenciação dos efeitos em que é recebida a petição inicial, não é proporcional à garantia do credor hipotecário, não é necessária a privação antecipada do bem, e nem adequada, porque implica sumário apossamento de bens do devedor, sem o devido processo legal.

Decisão.

Cuida-se de agravo de instrumento interposto por Antonio Afonso Jardim e cônjuge objetivando destrancar recurso especial retido na origem.

Os ora agravantes interpuseram agravo de instrumento contra decisão que indeferiu efeito suspensivo aos embargos por eles opostos na execução hipotecária que lhes move o banco agravado. O e. Tribunal a quo manteve a decisão agravada em acórdão assim ementado:

"Execução Hipotecária. Ajuizamento com base na Lei 5.741/71. Embargos devem ser recebidos sem efeito suspensivo. Prosseguimento da execução. Inteligência dos arts. 739, parágrafo único do Código de Processo Civil e 5º, parágrafo único da lei especial. Decisão mantida."

Irresignados, interpuseram os agravantes recurso especial, arrimado nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional para delatar vilipêndio ao art. 739, § 1º do Código de Processo Civil, bem como dissídio jurisprudencial.

O e. Tribunal a quo determinou que ficasse o recurso especial retido nos autos de acordo o parágrafo 3º do art. 542 do Código de Processo Civil.

Brevemente relatado, passo a decidir:

Preliminarmente, cumpre apontar que o agravo de instrumento destina-se a verificar a correção ou o desacerto do juízo que aprecia a admissibilidade do recurso especial e obsta a sua ascensão à Corte Superior. A decisão que determina a sua retenção, nos termos do art. 542, § 3º, do CPC, equivale à sua inadmissão. Assim sendo, está o órgão julgador desta Corte Superior autorizado a proceder à analise dos requisitos extrínsecos e intrínsecos do recurso especial, ainda quando inexistia prévio juízo delibatório manifesto pelo Tribunal a quo. Tal medida, que atende às exigências da praxe forense, justifica-se pela imperiosa necessidade de se impedir o perpetrar de delongas e dispêndios no manejo dos recursos, com manifesto prejuízo à prestação jurisdicional, sua satisfatividade e celeridade.

Afirmam os agravantes, que v. acórdão vergastado violou o disposto no art. 739 § 1º do CPC ao não conferir efeito suspensivo aos embargos à execução por ele opostos. Entendeu o e. Tribunal a quo que o referido dispositivo não se aplica à espécie por ser a execução hipotecária regulada por lei especial, estando amparada pelo art. 5º, parágrafo único da Lei nº 5.741/71, que rege, especificamente, só sendo admitida a suspensão da execução quando a matéria versada na ação de embargos do devedor trate do depósito integral da importância reclamada na petição inicial da execução, ou que a dívida foi resgatada.

O cerne da quaestio juris é a vigência do art. 5º, da Lei nº 5.741/71, em face da nova ordem processual.

Ao devedor hipotecário devem ser asseguradas garantias processuais mínimas, que estão expressas no texto constitucional vigente, como a ampla defesa e o contraditório, não se admitindo, que no vigente Estado democrático de direito, alguém seja privado de sua propriedade sumariamente, o que exsurge com a simples propositura da ação de execução hipotecária, regida pela Lei nº 5.741/71, uma vez que eventual propositura da ação de embargos do devedor, em execução hipotecária, não seria recebida, a princípio, com o efeito suspensivo, que é exceção nesse procedimento especial.

Por outro lado, é inconstitucional, por ser desarrazoado, o condicionamento do recebimento de embargos do devedor, em seu efeito suspensivo, a que a parte "alegue e prove:

I- que depositou por inteiro a importância reclamada na inicial;

II- que resgatou a dívida, oferecendo desde logo a prova da quitação".

Estaria-se, dessa forma, esvaziando a utilidade da ação de embargos à execução hipotecária, bem como impondo que a ação seja manifestante procedente, in limine.

A emérita Procuradora de Justiça Suzana de Toledo Barros, em sua obra "O Princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de Direitos Fundamentais", pág. 27, Ed. Brasília Jurídica, 1996, leciona que:

"Como anota Canotilho, o princípio considerado significa, no âmbito das leis interventivas na esfera de liberdades dos cidadãos, que qualquer limitação a direitos feita pela lei deve ser apropriada, exigível e na justa medida, atributos que permitem identificar o conteúdo jurídico do cânone da proporcionalidade em sentido amplo: exigência de adequação da medida restritiva ao fim ditado pela própria lei; necessidade da restrição para garantir a efetividade do direito e a proporcionalidade em sentido estrito, pela qual se pondera a relação entre a carga da restrição e o resultado".

Assim, a restrição de direito processual do embargante devedor de dívida hipotecária, com injusta e ilegal diferenciação dos efeitos em que é recebida a petição inicial, não é proporcional à garantia do credor hipotecário, não é necessária a privação antecipada do bem, e nem adequada, porque implica sumário apossamento de bens do devedor sem o devido processo legal.

Patente a ofensa à cláusula constitucional de razoabilidade da lei federal restritiva, pela desproporcionalidade ilegítima da garantia processual do credor hipotecário em detrimento do sumário desapossamento de bens do devedor.

Some-se a esse fundamento o fato de que o depósito da importância reclamada na inicial é outro aspecto que impede o livre acesso ao Judiciário, dada a reiterada prática dos agentes do sistema financeiro habitacional embutirem cláusula de vencimento antecipado da dívida total pelo inadimplemento parcial.

Forçosa a conclusão de que o art. 5º, segunda parte, seus incisos e parágrafo único não foram recepcionados pela Constituição Federal de 1988, nem se apresentam em consonância com a sistemática do Código de Processo Civil, especialmente com os arts. 745 e 739, § 1º.

Não está aqui a se apregoar que a lei geral tem o condão de revogar tacitamente a lei específica, o que contraria os comezinhos princípios hermenêuticos. Entretanto, para se atender o fim social da lei posterior, qual seja a Lei nº 8.953/94, que alterou o § 1º do art. 739 do Código de Processo Civil, e adequar a sistemática do Código de Processo Civil, que prevê o efeito suspensivo, sem restrição, para a ação de embargos do devedor, deve o julgador conferir uma interpretação legal que se coadune com a estrutura orgânica do ordenamento jurídico em si.

Sem adentrar no aspecto constitucional do art. 41 do Decreto-Lei nº 167/67 e não fosse a imperiosa necessidade de se uniformizar a sistemática processual de execução, os pretórios pátrios têm espraiado a inadequação dos ritos especiais de execução ao moderno processo civil, no que toca ao manejo da ação de embargos do devedor destituído do efeito de suspender o curso do processo de execução.

Por fim, associado aos fundamentos constitucionais (ampla defesa, contraditório, proporcionalidade) e de revogação tácita do art. 5º da Lei nº 5.741/71 (pela Lei nº 8.953/94, que alterou o art. 739, § 1º do Código de Processo Civil, com o qual é incompatível), cabe pontuar que a incerteza do crédito pelo ajuizamento de ação consignatória e descumprimento contratual do credor, autoriza a suspensão da execução.

Registrem-se os seguintes precedentes que ratificam tal entendimento: Resp 168.572/PR, Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, DJ de 31.8.1998 e Resp 191.124/PR, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, DJ de 10.4.2000, esse último assim ementado:

"Processual civil. Execução hipotecária. Embargos do devedor. Efeito suspensivo. Lei 5.741/71 (arts. 5º e 6º). CPC (arts. 739, § 1º)

1- Sendo os embargos do devedor ação autônoma de defesa do executado, nada impede sejam recebidos no efeito suspensivo a fim de evitar dano de difícil reparação à parte. Inteligência dos arts. 5º e 6º da Lei 5.741/71 c/c § 1º do art. 739/CPC.

2- Recurso especial conhecido, porém, improvido."

Forte em tais razões, conheço do agravo de instrumento para dar provimento ao recurso especial, pelas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, conferindo-se efeito suspensivo aos embargos à execução opostos pelo agravante.

Brasília 22/11/2000. Ministra Nancy Andrighi, Relatora. (Agravo de Instrumento nº 338.432/SP; DJU 5/12/2000; pg. 545)
 



Protesto indevido ou registro indevido em cadastro de devedores. Pessoa Jurídica. Dano moral.


Decisão. (...)

Agrava-se de decisão que negou trânsito a recurso especial, fundamentado nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, em que se alega ofensa ao art. 159 do Código Civil, bem como divergência jurisprudencial.

Não merece prosperar o inconformismo.

Inafastável, na hipótese, a incidência da súmula n. 7 desta Corte, bem anotada pelo decisório agravado. É que o acolhimento da pretensão recursal demandaria necessariamente incursões no campo fático-probatório, tarefa esta que, como cediço, não se viabiliza em sede de recurso especial.

Quanto à alegação de que não provada efetivamente a existência de prejuízo, registro, além do óbice acima referido, que o recorrente não encontra amparo na jurisprudência desta Corte. Confira-se os seguintes julgados:

"Civil. Dano moral. Registro no cadastro de devedores do Serasa. Irrelevância da existência de prejuízo. A jurisprudência desta Corte está consolidada no sentido de que na concepção moderna da reparação do dano moral prevalece a orientação de que a responsabilização do agente se opera por força do simples fato da violação, de modo a tornar-se desnecessária a prova do prejuízo em concreto. A existência de vários registros, na mesma época, de outros débitos dos recorrentes, no cadastro de devedores do Serasa, não afasta a presunção de existência do dano moral, que decorre in re ipsa, vale dizer, do próprio registro de fato inexistente. Hipótese em que as instâncias locais reconheceram categoricamente que foi ilícita a conduta da recorrida em manter, indevidamente, os nomes dos recorrentes, em cadastro de devedores, mesmo após a quitação da dívida. Recurso conhecido em parte e, nessa parte, parcialmente provido." (Resp 196.024/MG, por mim relatado, in DJ de 2/8/99)

"Civil e processual civil. Responsabilidade civil. Devolução indevida de cheque. Dano moral. Prejuízo. Reparação. Precedentes. Embargos de declaração. Multa art. 538, CPC. Caráter protelatório não configurado. Recurso acolhido parcialmente.

I- A devolução indevida de cheque sem fundos acarreta a responsabilidade de indenizar razoavelmente o dano moral correspondente, que prescinde da prova de prejuízo.

II- É vedado, nesta instância especial, o reexame das circunstâncias de fato que ensejaram a responsabilidade do banco pela devolução indevida do cheque, a teor do enunciado nº 7 da súmula/STJ.

III- Sem estar fundamentado o intuito meramente protelatório dos embargos de declaração e em face das evidências de que não houve tal propósito, é de afastar-se a imposição da multa prevista no art. 538, parágrafo único, CPC." (Resp 240.202/MA, relator o eminente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, in DJ de 20/3/00)

"Dano moral. Protesto indevido de título já pago. Prova. Pessoa jurídica. Valor de indenização.

1- O protesto indevido de título já pago na própria agência bancária enseja a reparação por dano moral, que prescinde da prova do prejuízo, comprovado o fato que lhe deu origem.

2- A súmula nº 227 da Corte encerrou a controvérsia admitindo a possibilidade da pessoa jurídica sofrer dano moral.

3- Não pode ser considerado excessivo, considerando as circunstâncias da causa, a condenação no pagamento de valor equivalente a vinte vezes o valor do título, o que afasta a intervenção da Corte, diante da razoabilidade da condenação.

4- Recurso especial não conhecido." (Resp 234.481/SP, relator o eminente Ministro Carlos Alberto Menezes Direito, in DJ de 7/8/00)

Pela alínea "c", verifica-se que não foi demonstrado o dissídio na forma preconizada pelos artigos 541, parágrafo único, do CPC e 255, §§ 1º e 2º, do RISTJ e o aresto trazido a confronto não guarda qualquer semelhança com a hipótese retratada nos autos, restando, assim, inadmissível o apelo no ponto.

Posto isso, nego provimento ao agravo.

Brasília 27/11/2000. Ministro Cesar Asfor Rocha, Relator. (Agravo de Instrumento nº 335.139/MG; DJU 6/12/2000; pg. 497/498)
 



Compromisso de c/v não regist



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