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Narciso Orlandi Neto fala sobre o registro de imóveis na TJ Justiça


O Conselheiro Jurídico do IRIB, doutor Narciso Orlandi Neto esteve no programa CARTÓRIO, O PARCEIRO AMIGO, da TV Justiça, abordando temas do registro de imóveis.

Não perca a exibição do programa no próximo dia 07/06/03, às 11h00, e reapresentação nos dias 8 de junho (domingo), às 11h, e 9 de junho (segunda-feira), às 6h e 22h.
 



Parcelamento irregular do solo. Loteamento clandestino. Grilagem. DF.


O ministro Felix Fischer, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), negou pedido de habeas-corpus em favor de M.S.P. acusado da prática de parcelamento irregular do solo. M.S.P. foi denunciado pelo Ministério Público do Distrito Federal por ter iniciado em 2001 uma série de atos com vistas a implantação do loteamento clandestino denominado Mansões Chácaras do Lago, localizado no Lago Sul em Brasília.

No STJ, a defesa de M.S.P. solicitou liminarmente, a imediata suspensão da decisão proferida pelo desembargador Jeronymo de Souza do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) em mandado de segurança. O desembargador concedeu liminar para tornar sem efeito salvo-conduto concedido pela Primeira Turma Criminal do tribunal.

Para o ministro Felix Fischer “por ora, não se encontra retratada nos autos a excepcional hipótese de provisório juízo antecipado acerca do pedido”. Segundo o ministro “para efeito da pretendida apreciação prévia, o caso exige maiores esclarecimentos”. O ministro solicitou informações com urgência ao desembargador relator do mandado de segurança.

Segundo o MPDF a referida área abrange parte da antiga Fazenda Rasgado e uma pequena porção da Fazenda Paranoá. Para o MP a implantação do loteamento clandestino configura um desrespeito às normas administrativas e legais causando prejuízo ao patrimônio público, ao meio ambiente e à ordem urbanística. A denúncia afirma que o denunciado dividiu a prática criminosa com outras pessoas valendo-se de medidas judiciais para dar aparência de legalidade ao empreendimento. Deuza Lopes (61) 3196531 (Notícias do STJ, 27/05/2003: STJ nega habeas-corpus a Márcio Passos, acusado de grilagem no DF).
 



Área tombada. Projetos de construção. Autorização prévia do Iphan não é obrigatória.


A prévia oitiva e autorização do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – Iphan sobre o projeto de construção, em área tombada, não é obrigatória. Portanto, não há respaldo legal para exigir demolição da obra se não ocorre nenhuma modificação que descaracterize o bem tombado. O entendimento unânime é da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que não conheceu do recurso especial do Iphan contra o governo do Distrito Federal/DF.

O Ministério Público Federal e o Iphan propuseram ação civil pública contra o DF, Marcos Koenigkan Empreendimentos Imobiliários e Hotel Phenícia Ltda., com o objetivo de que a parte leste do edifício comercial construído em Brasília, na entrequadra 414/415 sul do Plano Piloto, fosse demolida. De acordo com a denúncia, a construção feriu o conjunto arquitetônico da capital federal, pois não teria obedecido o espaço mínimo de dez metros livres a partir do meio-fio da via L-2 sul. A edificação está construída a cinco metros da pista, uma das mais movimentadas da cidade que é tombada pela Unesco como patrimônio cultural da Humanidade.

O juiz de primeiro grau julgou procedente o pedido, condenando Phenícia Comércio, Construtora e Incorporadora Ltda. e o Distrito Federal a promoverem a demolição parcial do prédio “de modo a permitir que fique livre de construção o espaço mínimo de dez metros a partir do meio-fio da via L-2 sul, suficiente, portanto, para preservar o conjunto arquitetônico da cidade de Brasília”. A sentença declarou extinto o processo em relação a Marcos Koenigkan Empreendimentos Imobiliários e Hotel Phenícia Ltda.

Phenícia Comércio e Construtora, bem como o DF, apelaram da sentença ao Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região, que deu provimento às apelações, decidindo: “É certo que o antigo IBPC, hoje, Iphan, teria de ser ouvido sobre o projeto de edificação em áreas tombadas de modo a assegurar a preservação das características do bem tombado. Mas, se não foi, e o projeto não causa nenhuma modificação, nenhum dano à área tombada, só porque não foi ouvido não se deve demolir a obra erguida sem a audiência do Iphan. Distância de dez metros entre o meio-fio e a empena do edifício não exigida pelo plano da cidade”.

O Iphan recorreu ao STJ alegando que a decisão de segunda instância teria violado o artigo 17 do Decreto-lei nº 25/37, que estabelece: “As coisas tombadas não poderão, em caso nenhum, ser destruídas, demolidas ou mutiladas, nem, sem prévia autorização especial do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ser reparadas, pintadas ou restauradas, sob pena de multa de cinqüenta por cento do dano causado”.

Para o Iphan, o entendimento do TRF da 1ª Região tratou o requisito legal como mera formalidade, preteriu o cumprimento da lei e “decretou a extinção judicial do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, uma vez que o único instrumento de que dispõe a Autarquia para o desempenho de seu mister é, ainda, o prévio exercício de seu poder de polícia”.

Todavia, o ministro Franciulli Netto, relator do processo, não acolheu os argumentos do Iphan. Após analisar a redação do referido artigo 17, o ministro afirmou: “Conclui-se que não é obrigatória a prévia manifestação do Iphan, antigo IBPC, em casos como o dos autos, em que não houve destruição, demolição ou mutilação de coisa tombada, mas construção de edifício que foi previamente autorizada pelo Governo do Distrito Federal. O exame acurado dos autos demonstra que a edificação se deu em conformidade com as determinações legais da época”.

Em seu voto, Franciulli Netto explicou que a obra recebeu o alvará de construção do Departamento de Licenciamento e Fiscalização de Obras da Secretaria de Viação e Obras do Distrito Federal, assim como foi aprovada pela Administração Regional e pela Gerência de Circulação de Projetos, conseguindo, inclusive, aprovação no tópico segurança, “sendo que todos os atos praticados, até prova em contrário, ocorreram à luz da legalidade”, assinalou o ministro. “Mais a mais, ressalte-se que a demolição parcial do prédio, a essa altura, seria medida sem razoabilidade, seja porque a construção obteve o devido alvará de construção do GDF, seja porque traria um ônus excessivo para os comerciantes e proprietários das unidades comerciais do edifício”, finalizou o relator. Luciana Assunção (61) 319-6516. Processo:  Resp 290460(Notícias do STJ, 26/05/2003: Autorização prévia do Iphan não é obrigatória para projetos de construção em área tombada).
 



Usucapião de passagem forçada. Anulação.


Aproveitar-se de uma passagem forçada como locatário de terreno não configura usucapião da mesma. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu ao cirurgião dentista e proprietário de terreno O.T. Com a decisão, a ação de usucapião por passagem forçada, impetrada por J.E.F. e a esposa I.F., foi anulada. Os dois pretendiam possuir uma área de terra com 200 metros quadrados que dava acesso à rua pelo terreno do cirurgião dentista.

Consta do processo, que desde 17 de julho de 1973, J.E.F. era locatório de imóvel localizado nos fundos de terreno situado na rua Felipe Schmidt, em Brusque, Santa Catarina. O terreno era pertencente na fase final do contrato a O.T. O imóvel de fundos, fixado no terreno, tinha acesso à rua por passagem forçada, até que, em janeiro de 1983, J.E.F. adquiriu de I.T., mãe de O.T., a posse da passagem forçada ou servidão de trânsito.

Após garantirem a servidão da passagem, J.E.F. e esposa ajuizaram, em 26 de maio de 1987, ação de usucapião de passagem forçada no Juízo de 1º Grau. O Juiz de Direito julgou procedente a ação. Inconformado, a defesa de O.T. apelou ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC). Os advogados do proprietário pretendiam nulidade do processo por falta de citação do anterior confinante, A.S., e da sentença alegando cerceamento da defesa. O tribunal catarinense rejeitou a apelação e manteve a decisão de Primeira Instância. Para tanto, o TJ-SC considerou que “não procedem as alegações do apelante, uma vez que o pedido dos apelados está em conformidade com o direito, bem motivado pela respeitável sentença recorrida”.

No STJ, o ministro Ari Pargendler, relator do processo, considerou que as questões processuais foram refutadas pela decisão do Tribunal catarinense. “Nem o processo é nulo por falta de citação do confinante A.S., porque foi citado o seu sucessor Irmãos Massoli Ltda.; nem a sentença é nula por cerceamento de defesa, porque, encerrada a instrução com prazo para apresentação de memoriais, nenhuma das partes enfatizou a necessidade de realização da prova pericial”.

Mas relativo às razões de mérito, o entendimento do ministro Ari Pargendler foi de que “a partir de janeiro de 1983, J.E.F. indenizou I.T. pela servidão. Desde essa data, até o ajuizamento da ação, em 26 de maio de 1987, não ocorreu prazo suficiente para o usucapião. Em outras palavras, se adquiriu o direito à servidão em janeiro de 1983, porque antes dessa data não o tinha - presumindo-se que aproveitava a passagem forçada como locatário”.

Em virtude disso, o ministro Ari Pargendler deu provimento ao recurso para julgar improcedente a ação de usucapião, condenado os autores (J.E.F. e esposa) ao pagamento das custas e dos honorários, no valor de 20% (vinte por cento) sobre o valor atribuído à causa. Processo:  Resp 208509 (Notícias do STJ, 23/05/2003: STJ impede ação de usucapião de passagem forçada).
 



Usufrutuário não é herdeiro, mas pode tentar anular partilha de bens.


O usufrutuário não é herdeiro, mas tem o direito de promover ação para anular partilha amigável que tenha prejudicado seu direito ao usufruto (direito que assiste o usufrutuário de utilizar parte dos bens deixados pelo falecido até que venha a falecer também). O entendimento unânime é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça. Com o julgamento do STJ, ficam mantidas as decisões que anularam a partilha amigável dos bens deixados por W.R.

W.R. foi casado com M.J., que faleceu em 1978 deixando como única herdeira sua mãe. Com isso, foi iniciado o processo de partilha dos bens sendo nomeado como inventariante o viúvo, W.R. O viúvo casou-se com M.J.R. pelo regime de separação de bens, pois à época W.R. já teria mais de 60 anos. W.R. faleceu antes de concluído o processo do inventário de sua primeira mulher deixando dois herdeiros – sua irmã, V.C., e o filho adotivo de sua primeira sogra (única herdeira de M.J.).

Os herdeiros dos dois inventários (de M.J. e de W.R.) promoveram a escritura da partilha dos bens deixados em uma Comarca próxima a de suas residências. Ao ser informada da homologação, a viúva de W.R., M.J.R. entrou com uma ação para que a Justiça declarasse a nulidade da partilha. Segundo M.J.R., ela teria direito ao usufruto de uma parte dos bens deixados por W.R. e a partilha estaria prejudicando esse direito retirando até a residência onde o casal morava.

O pedido de M.J.R. foi acolhido pela primeira instância. A sentença anulou a partilha entendendo que ela teria prejudicado a usufrutuária dos bens de W.R. A decisão foi confirmada pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais. Diante do julgamento, os herdeiros de W.R. recorreram ao STJ alegando que as decisões teriam contrariado os artigos 1.063, 1.611, 1.773 e 1.805 do Código Civil, além dos artigos 1.069, 1.031, 113, 132, 467 e 468 do Código de Processo Civil.

Segundo os herdeiros de W.R., sendo usufrutuária, M.J.R. não poderia ser considerada herdeira, portanto, não teria titularidade para participar da partilha dos bens, muito menos na partilha do patrimônio deixado por M.J., que já teria transitado em julgado (quando não cabe mais recurso no processo). Eles também afirmaram ter direito a partilhar o acervo de bens de acordo com suas conveniências não podendo o Juiz, como ocorrido na primeira instância, deixar de homologar a partilha feita por escritura pública.

O ministro Antônio de Pádua Ribeiro negou o recurso dos herdeiros. Assim, fica mantida a anulação da partilha efetuada pelos herdeiros sem o conhecimento da usufrutuária. Para o relator, a usufrutuária é parte legítima para propor ação contra a partilha, pois “o usufruto é direito real temporário que permanece enquanto durar a viuvez, para beneficiar o cônjuge sobrevivente quando o regime não for o da comunhão universal de bens. Portanto, tem o cônjuge supérstite (sobrevivente) o direito de usufruir dos bens deixados pelo cônjuge falecido, sem que os herdeiros lhe dificultem esse direito”, ressaltou.

O relator também rejeitou a alegação de que a homologação da escritura da partilha dos bens de M.J. já teria transitado em julgado e, por isso, não poderia ser anulada. “Sucede que a anulação é perfeitamente possível, tratando-se de partilha amigável, conforme dispõe o artigo 1.209 do Código Civil. A partilha litigiosa é que é rescindível”, afirmou o ministro destacando trecho da sentença reconhecendo que “a partilha feita sem a participação da autora (M.J.R. – usufrutuária) não tem qualquer validade no processo de inventário”.

Por fim, o ministro Antônio de Pádua Ribeiro concluiu pela impossibilidade de se analisar a afirmação dos herdeiros de que não teria ocorrido má-fé ao afastarem da partilha do patrimônio de W.R. os bens que não pertenceriam ao falecido (os que pertenceriam apenas ao inventário de M.J.). “Essa matéria envolve necessariamente o reexame de provas, incabível na via do recurso especial”, de acordo com a súmula 7 do Superior Tribunal. Elaine Rocha (61) 319-6547 (Notícias do STJ, 22/05/2003: STJ: Usufrutuário não é herdeiro, mas pode tentar anular partilha de bens).
 



Reintegração de posse. Fazenda em MS.


A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) restabeleceu o acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, que determinou a reintegração de posse da Fazenda Bananal da Boa Vista, a M.F.Z.A., que ajuizara a ação, alegando ser proprietária do imóvel, deixado como herança por seu pai.

A ação foi contestada por M.G.M.U., que também alega ser proprietária da fazenda e não deu cumprimento a determinação do juiz, ingressando com embargos pedindo indenização por benfeitorias.

A fazenda, de propriedade do general J.N.A. e deixada por herança para sua filha M.F.Z.A., faz parte de uma área maior, que, por sua vez, foi herdada do avô A.T.A.

No voto do relator, ministro Carlos Alberto Menezes Direito, descrevendo o histórico da ação, está dito que a posse do imóvel rural sempre foi exercida pelo general J.N.A., através de sucessivos contratos de arrendamento de toda área, “que sempre esteve demarcado, assim permanecendo até a época em que foi invadida pelos então proprietários da Fazenda Lobo, em 1971”, o que levou M.F.Z.A. a entrar com a ação de reintegração de posse em 1984, obtendo sentença favorável em primeira instância.

Mas o mandado de reintegração não chegou a ser integralmente cumprido porque os réus impetraram embargos pedindo indenização e retenção de benfeitorias, que foram indeferidos. Um recurso especial foi interposto e, segundo o voto do relator “ficou reconhecido o esbulho possessório e configurada a má fé dos réus de seus antecessores”.

A sentença julgou improcedente o pedido de indenização feito pelos réus e o processo foi remetido para o STJ, que restabeleceu a determinação do acórdão de reintegrar a posse da fazenda para M.F.Z.A. Chico Dias 061-319-6443. Processo:  RESP 466359 (Notícias do STJ, 20/05/2003: STJ determina reintegração de posse de fazenda em Mato Grosso do Sul).
 



NCC e o registro de imóveis. Compromisso de C/V - desnecessidade da escritura pública notarial.


O Magistrado da Primeira Vara de Registros Públicos da Capital de São Paulo enfrentou dúvida suscitada para dirimir questão que surgiu com o NCC.

O tema não é pacífico e rendeu inúmeras discussões nos últimos eventos patrocinados pelo Irib.

Vale a pena confrontar os pontos de vista e alimentar o debate, até que as questões, pouco a pouco, tornem-se pacificadas pelo entendimento dos tribunais.

Até lá, as decisões pioneiras vão oferecendo uma luz para compreender a assimilar o novo diploma civil brasileiro.

Processo 000.03.036747-4

Vistos, etc...

Cuida-se de procedimento administrativo  de dúvida registral, aparelhada nos termos do artigo 198, da Lei de Registros Públicos, suscitada pelo Décimo Quinto Registro de Imóveis da Capital. Destacou o Oficial suscitante, que conferiu qualificação negativa ao compromisso de compra e
venda apresentado por F.J.A.S. e B.A.C.S., destacando que nos termos do artigo 108 do novo Estatuto Civil, o compromisso deveria vir formalizado por ESCRITURA PÚBLICA, conquanto o valor do negócio foi ajustado em R$ 350.000,00. Apresentou os documentos necessários e úteis e pugnou pelo processamento.

Notificado, o suscitado apresentou IMPUGNAÇÃO, destacando que a forma pela qual os compromissos de compra e venda sempre despertaram grandes controvérsias. Como o DL
58/37, a questão relativa aos imóveis loteados restou superada, diante de seu artigo 11. Com a edição da lei 649/49, que conferiu nova redação ao artigo 22 do DL 58/37 a questão foi superada, e não alterada em função do novo Código, mormente em função do disposto do seu artigo 1417. Pugnou pela improcedência da dúvida.

O Ministério Público em seu parecer opinou pela procedência da dúvida.

É o relatório.

DECIDO:

Cuida-se de dúvida suscitada a partir da QUALIFICAÇÃO NEGATIVA conferia ao pedido de REGISTRO de compromisso subscrito pelos suscitados, formalizado em "DOCUMENTO
PARTICULAR". O acesso ao fólio real foi obstaculizado, sob a alegação de que, em face do novo Código Civil, em especial, de seu artigo 108, os compromissos de compra e venda de
imóveis "não loteados", deveria vir instrumentalizados por ESCRITURA PÚBLICA.

A dúvida, em que pese o zelo e a preocupação do Oficial Registrador, como destacado pelo parquet, não comporta acolhimento.

Para o deslinde da questão, necessária a reprodução do invocado artigo 108, do novo estatuto civil, assim como a transcrição do correspondente dispositivo do Código Civil superado (art. 134).

Código Civil de 1916 – Art. 134 - É, outrossim, da substância do ato a escritura pública:
I. - ...
II. - Nos contratos constitutivos ou  translativos de direitos reais sobre imóveis de valor superior a Cr$ 50.000, excetuado o penhor agrícola.

Novo Código Civil – Art. 108 - Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos  que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia
de direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 (trinta) vezes o mais salário mínimo vigente no País.

A redação do primitivo Estatuto Civil foi alterada, e diga-se, que foi melhorada e aperfeiçoada, contudo o sentido e o alcance do transcrito texto normativo permaneceu incólume, inalterado, salvo, evidentemente, no que afeta ao valor utilizado declinado. Envolvendo atos translativos ou de
transferência de DIREITOS REAIS, os dispositivos da legislação superada e da atual, aparentemente contemplaram todo e qualquer instrumento CONTRATUAL, de índole definitiva
ou de natureza provisória, desde que venha a envolver DIREITOS REAIS.

Destaque-se que a "propriedade" somente se transfere com o registro imobiliário da Escritura ou do Contrato definitivo, que estampem a devida comprovação do cumprimento de todas as
obrigações pactuadas (quitação do preço ajustado). Entretanto, precedentemente este ajuste definitivo, o compromisso de compra e venda, quanto registrado, também envolve DIREITO REAL sobre o bem corpóreo descrito e caracterizado, entretanto, não representa a CONSTITUIÇÃO, a
TRANSFERÊNCIA ou a MODIFICAÇÃO da titularidade dominial. Isto é certo e definitivo, sendo proprietário, aquele que assim é titulado nos assentos registrais.

Portanto, a "propriedade" somente passa a operar "efeitos" translativos, constitutivos ou modificativos, com o registro do COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. O direito real que o
COMPROMISSÁRIO COMPRADOR conquista é o direito "à aquisição da coisa", como expressamente estabelece o art. 1.417 do NCC.

Existe uma nítida distância EFICACIAL entre a "transferência de uma direito real" e a "transferência de uma direito real à aquisição do imóvel".

Promitente comprador, portanto, não se torna titular do domínio, possui apenas um "pré-ajuste" ou um CONTRATO PRELIMINAR, que somente se aperfeiçoa ou se transforma no DIREITO perseguido (propriedade), com a quitação das obrigações e com a outorga do documento definitivo e seu registro.

Assim, entre o INSTRUMENTO definitivo que transfere a propriedade e o INSTRUMENTO PROVISÓRIO ou preliminar que dá início à transferência imobiliária, existe uma enorme
distância eficacial que não pode ser desconsiderada ou desprezada.

Tanto o artigo 108 do atual Estatuto,  como o artigo 134, do Código ultrapassado, tinham como FOCO principal o documento definitivo, que confere a transferência efetiva da propriedade. Em absoluto contemplaram o pacto inicial e preliminar, que não tem aptidão para TRANSFERIR O DIREITO TODO, MAS APENAS PARA TRANSFERIR O DIREITO DE AQUISIÇÃO.

Esta realidade não passou despercebida no legislador ordinário, que ao disciplinar os compromissos envolvendo "imóveis loteados", acenou com a aceitação de CONTRATOS PARTICULARES na formalização dos compromissos de compra e venda. O art. 11, do DL 58/37, apresenta redação singela neste sentido:

Art. 11 - Do compromisso de compra e venda a que se refere esta lei, contratado por instrumento público ou particular, constarão sempre as seguintes especificações;

Observe-se, entretanto, que o dispositivo transcrito não possui uma redação muito clara e objetiva neste sentido, no entanto, mesmo em face desta lacônica redação, não existiram dúvidas de que, para os "lotes" decorrentes de fracionamento do solo, o contrato particular era admitido, independentemente do valor envolvido.

Efetivamente que a raiz deste entendimento consolidado, não se encontrava no próprio artigo 11 da DL 58/37, mas sim, no art. 134 do Código Civil, que SEMPRE considerou a diferença
eficacial entre o PRÉ-CONTRATO e o CONTRATO DEEFINITIVO, entre o princípio de acordo e o acordo concluído, entre a manifestação de intenções e a conclusão do negócio, exigindo
ESCRITURA PÚBLICA apenas para a TRANSFERÊNCIA DO DOMÍNIO.

O artigo 22, também do DL 58/37, ao reverso do que alega o suscitante, não introduziu qualquer novo componente à discussão. Seu longo texto, nada esclarece a este respeito. Abaixo a transcrição:

Art. 22 - Os contratos, sem cláusula de arrependimento, de compromisso de compra e venda e cessão de direito de imóveis não loteados, cujo preço tenha sido pago no ato de sua
constituição ou deva sê-lo em uma ou mais prestações, desde que inscritos a qualquer tempo, atribuem aos compromissários direito real oponível a terceiros, e lhes conferem o direito
de adjudicação compulsória nos termos do art. 16 desta lei, 640 e 641 do Código de Processo Civil.

Portanto, ao aludir a "CONTRATO" e se reportar ao artigo 16, que trata da adjudicação compulsória, este artigo 22 não introduziu qualquer nova perspectiva à discussão, mas apenas
veio a  confirmar que o "pré-contrato" ou o início da transferência que se opera com a "promessa de compra e venda", pode ser viabilizado, em qualquer caso, independentemente do VALOR, por instrumento particular. Fosse o compromisso de venda, instrumento bastante para operar a
transferência do domínio, e certamente o dispositivo em tela deveria escolher outra redação, bem mais precisa e objetiva, estabelecendo de forma expressa a superação da exigência
apresentada no artigo 134 do CCB.

Aliás, quando o legislador assim quis proceder, excluindo a aplicação do artigo 134, assim agiu OBJETIVAMENTE. Assim o fez no §5º, do artigo 61, da lei 4.380/64, e no artigo 38 da lei
9.514, que estabelecem que nos caso de compromissos vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação, ou os contratos destinados às aquisições imobiliárias com "alienação fiduciária". Nestes casos, de forma expressa, determinou a superação da exigência prevista no inciso II, do
artigo 134, do Código Civil.

A grande distância entre a situação prevista e disciplinada no art. 22 do DL 58/37 e os casos contemplados pelas leis 4.38/64 e 9.514/97, reside justamente na "diferença EFICACIAL", pois nestes últimos casos, o contrato, com a prova de quitação, e sem novo instrumento, É APTO A OPERAR A TRANSFERÊNCIA DA PROPRIEDADE, ao passo que o compromisso de
compra de venda de lote, reclama e exige (ou exigia, antes da Lei 9.785/99) a celebração um novo contrato, firmado por Escritura Pública, sem o qual, o compromissário não se torna proprietário.

O artigo 108, do Novo Estatuto Civil, em compasso com o disposto no artigo 1.417, do mesmo instrumento, exigem ESCRITURA PÚBLICA para a transferência de DOMÍNIO, mas não o
exige tal formalidade para a conquista do direito ainda em formação, em que pese desenvolver, já nesta fase, caráter de DIREITO REAL.

O artigo 1.418 do NCC, bem anota a exata natureza jurídico do contrato firmado pelo PROMITENTE COMPRADOR, indicando que este representa "instrumento preliminar", ou preparatório, para o desate final, que se consolida com a passagem definitiva do DOMÍNIO. Como instrumento preliminar, não se mostra apto a transferir o direito transacionado, não exigindo a sua formalização por escritura.

Portanto, e resposta à dúvida registral levantada, é de se afirmar a resgistrabilidade dos COMPROMISSOS DE COMPRA E VENDA, formalizados por instrumento particular,
independentemente do VALOR.

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE  a dúvida. Cumpra-se o disposto no artigo 203 da Lei de Registros Públicos.

P.R.I.C.

Data supra.

Venício Antonio de Paula Salles
Juiz de Direito
 



Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica. Ato constitutivo do Sindicato das Meretrizes do Estado de São Paulo. Registrabilidade.


Processo nº 00.02.179979-2

Vistos, etc...

Cuida-se de procedimento administrativo, instaurado na forma de Dúvida Registral, nos termos do artigo 115 da Lei de Registros Públicos, pelo Oficial do 9o Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica que obstou o registro de ato constitutivo do Sindicato das Meretrizes do Estado de São Paulo, definido em estatuto datado de 08 de agosto de 2002. Destacou que foi conferida qualificação negativa por não envolver profissão legalmente regulamentada, conquanto revele finalidade econômica. Ademais, a atividade não cumpre os padrões de moral e desatende aos bons costumes. Apresentou a nota devolutiva e demais documentos, pugnando por seu processamento.

Oficiado, o Ministério do Trabalho apresentou a classificação brasileira de ocupações, no que afeta às profissionais do sexo (código 5198).

O Ministério Público se posicionou pela superação do entrave registrário.

É o relatório.

DECIDO:

O Oficial do 9o Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica obstou o registro de ATO constitutivo do Sindicato das Meretrizes do Estado de São Paulo, invocando, para tanto, o artigo 115 da Lei de Registros Públicos, que veda acesso registral a ATOS CONSTITUTIVOS de pessoas jurídicas que tenham por objeto atividades ilícitas ou nocivas e perigosas ao "bem público", à coletividade, à ordem pública, à moral e aos bons costumes.

Durante a instrução procedimental, o Ministério do Trabalho apresentou importante informação, revelando que a "prostituição" é atividade catalogada oficialmente como "atividade econômica". A atividade aparece descrita na classificação brasileira de ocupações -  C.B.O. 2002 - sob o código de n o 5198, na família ocupacional "TRABALHADORES DO SEXO".

Também restou evidenciado que não se trata de atividade ilícita, conquanto não vedada em qualquer comando normativo, bem como em previsão penal. Não se constituindo crime ou atividade desaconselhada legalmente, quer seja sobre o prisma da segurança, saúde, ou de qualquer outra inspiração, a "prostituição" deve ser entendida como integrante do rol das atividades lícitas.

No plano concreto, foi anotada a existência de atividades "irregulares" e "ilícitas", que invariavelmente circundam e orbitam sobre a atividade de exploração do sexo, como por exemplo, o favorecimento à prostituição alheia; o proxenetismo; a reserva de locais específicos e privativos para o meretrício, etc., contudo, a "prostituição" como atividade direta e imediata, não encontra estorvo legal para o seu exercício.

Portanto, o obstáculo ao REGISTRO não poderia, como não foi, determinado pela ilicitude, desvio ou irregularidade da atividade dita laboral. A desqualificação veio calcada em afronta aos padrões de "moral e aos bons costumes", ou mesmo à "ordem pública", tal qual previsto pelo artigo 115 da lei 6.015/73.

Assim, desviando-se das trilhas da "licitude" e "ilicitude", a análise aponta, em princípio, para uma verificação do sentido, alcance e conteúdo dos genéricos e fluidos termos utilizados pelo dispositivo da lei registrária ("moral e bons costumes" – "ordem pública"), e a eventual tipificação das atividades de "exploração do sexo" como contrárias a tais padrões. Esta visão poderia conferir à análise uma consistência subjetiva, determinado pela sensibilidade do aplicador do direito, pois em decorrência da amplitude dos termos, estes poderiam flutuar em atenção a uma leitura quase que pessoal dos fenômenos sociais, bem como da valoração e qualificação destes.

Assim, considerando tais circunstâncias, a questão da registrabilidade dos estatutos do Sindicato das Meretrizes, deve escapar deste aparente campo de instabilidade interpretativo e de precariedade em função dos pontos de "apoio", que apenas viriam gerar insegurança jurídica. Destarte, razoável se mostra o alargamento da discussão, para que esta não se restrinja apenas sobre um único e subjetivo vértice, ou seja, para que não se proceda a um estudo exclusivamente sobre o exame da "atividade" e sua conformação ou desconformidade com padrões médios ditados pelas regras de "moralidade social", atém porque, opostamente do que consta do lúcido parecer ministerial, não se verifica qualquer novo avanço de conceitos ou nova abordagem sobre a atividade do sexo e seus efeitos sociais.

O mundo globalizado trata tal fenômeno social da mesma forma como foi tratado na Grécia antiga, bem como, durante o Império Romano, ou em qualquer período contemporâneo marcado por avanços ou por estagnação do desenvolvimento social. A "atividade do sexo", tida e havida com a "profissão" mais antiga da humanidade, sempre foi atingida por críticas, por repúdio, por censuras, por castigos sociais. A prostituição sempre tida como avessa aos conceitos tradicionais, aos padrões familiares e sociais, e sempre se desenvolveu à margem e às sobras da sociedade, invariavelmente emparceirada com atividades ilícitas e proibidas.

A célula familiar, como a primeira estrutura social sempre reprovou a prostituição, isto em qualquer época, em qualquer tempo, em qualquer sociedade. Apenas a intensidade desta reprovação é que experimentou variações e oscilações, mas não a direção das críticas e censuras.

Portanto, sob o ponto de vista social, não resta dúvida de que a ATIVIDADE DO SEXO foi sempre, e será reprovada socialmente, pelo menos enquanto a família for célula estrutural do tecido social.

A questão que deve pautar a presente decisão é saber se sob o ponto de vista CONSTITUCIONAL, esta reprovação social deve determinar a manutenção do MERETRÍCIO como atividade marginal, ou se pode e deve ser regularizada pela via registral, isto porque a Lei de Registros Públicos foi editada anteriormente à promulgação da nova CARTA POLÍTICA FEDERAL, de forma que seus efeitos se submetem a um crivo constitucional, determinado pela nova escala de valores inaugurados com a carta cidadã.

Como se colocou, a prostituição já conquistou conteúdo social imutável, que não irá se alterar com o progresso tecnológico; com a aceleração das comunicações; com o desenvolvimento das armas de destruição em massa. A única variação no "sentimento geral", do ponto de vista jurídico, se refere ao nível e à forma do "intervencionismo estatal" e os padrões ditados pela principiologia normativa que o envolve.

Variando de um Estado Liberal até um Estado Social Puro, o intervencionismo estatal cumpriu missões quase que opostas, passando de uma forma praticamente nula ou inexistente de participação do Estado na vida privada, para um sistema de "tutela estatal" muito acentuado sobre as liberdades e prerrogativas pessoais.

A atual concepção constitucional aceita o "intervencionismo" sobre os direitos fundamentais, mas preserva como guardiã maior, as liberdades individuais que devem representar os pressupostos necessários e inerentes à busca da felicidade.

O Estado moderno se estrutura com base neste "equilíbrio de forças", ao consagrar e apoiar os direitos individuais, mas os limitando e restringindo em atenção a interesses contrários de índole COLETIVA.

Portanto a registrabilidade do Sindicato das Meretrizes não deve ser visto apenas sob o subjetivo enfoque da moral e bons costumes, mas sim, sobre o padrão maior da "ordem pública" norteada e estruturada entre aquilo ou aquelas atividades que devem ser permitidas para salvaguarda dos direitos individuais, em contrapartida com o que deve ser proibido e negado em atenção ao interesse coletivo.

Como anotado, a Lei de Registros Públicos é anterior à Constituição de 1988, de forma que seu conteúdo e conceitos foram recepcionados com a dimensão dos novos conceitos e novos vetores trazidos pela lei maior, de forma que a "ordem pública" invocada pela lei registrária passou a ter conteúdo determinado pelos princípios emanados pela nova carta.

A Carta Política, portanto, protege o trabalho (art. 6o), assegura a liberdade de iniciativa, garante a liberdade de associação. De forma transversa, exige o incondicional respeito à cidadania, à dignidade da pessoa humana, e aos valores sociais do trabalho.

Para este propósito, convém relembrar o enfático episódio, trazido no parecer ministerial, que evolve a questão do "arremesso de anão". Tal episódio ocorrido na França nos idos de 1991, consistia em uma simples forma de entretenimento materializado pelo arremesso de um anão. O assim chamado cliente, como brinde ou prêmio, conquistava o direito de "arremessar" literalmente um anão.

Por considerar situação ultrajante e degradante, a prática foi proibida por um Prefeito da cidade, que ficava nos arredores de Paris. Inconformado com tal decisão, nada menos do que o próprio protagonista do grosseiro espetáculo, o anão, ingressou com postulação pedindo a desconstituição do ATO de proibição, o que foi aceito pela Corte local. Inconformado, o Prefeito recorreu da decisão, obtendo a reforma do julgado pela Corte Européia dos Direitos Humanos, que entendeu que aquela atitude degradante e humilhante transgredia e vulnerava os direitos pessoais ligados à "dignidade da pessoa humana". A corte proclamou que tais direitos são inalienáveis e indeclináveis, de forma que, sequer o direito individual do interessado, sequer o seu direito a um trabalho de cunho econômico, foram suficientes para afastar a aplicação deste princípio maior.

Este episódio revelou que a questão da DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA transcende a interesses pessoais e privados, impedindo que por distúrbios, vícios ou desvios comportamentais, pessoas transgridam seus próprios direitos fundamentais. O Estado deve intervir, impedindo as atividades degradantes e humilhantes.

Pois bem, nosso sadio texto maior, que introduziu um conteúdo bastante consistente de Estado intervencionista, veio a proclamar, como um dos maiores e mais relevante princípios, o da "dignidade da pessoa humana", e é com base no conteúdo deste que a presente demanda deve ser resolvida.

Assim, utilizando o conceito trazido junto à manifestação ministerial, "a prostituição é uma estrutura de prestações de serviços sexuais, sob o ponto de vista da troca" (Perlongher - fls. 64), e envolve três aspectos, quais sejam: "o aluguel do corpo, jogos eróticos e ausência de amor" (Langenest - fls. 64).

A questão, destarte, é saber se a realização de "ato sexual", que tem a finalidade direta da "procriação", bem como da satisfação dos anseios carnais, quando realizada por simples "paga", sem sentimento, sem a vontade normal do ato, por mera contraprestação pecuniária, seria ou não situação aviltante e contrária à "dignidade humana".

A indagação exige resposta a partir de dados extraídos do padrão médio familiar, assim considerada a estrutura familiar convencional. Este enfoque evidencia que a prostituição não comporta ou ostenta qualquer sentimento ou sensação ligada à "dignidade humana" ou que atenda a seus propósitos. Apenas pessoas formadas a partir de estruturas despidas das amarras familiares é que poderão, sensatamente, não nutrir maiores sentimentos de culpa, de perda ou de indignidade com a própria prostituição.

Ou seja, como em nossa sociedade contemporânea o padrão médio é de cunho familiar, e como este reprova e repudia a prostituição e até a vulgarização das atitudes sexuais, por maiores avanços sociais que ocorram nesse sentido, fragrante portanto que, em termos de critérios usuais e normais, em termos de ordem pública, a prostituição não pode ser vista ou sentida como ATITUDE DIGNA à pessoa humana.

A liberdade individual, em face da reprovação coletiva, deve ceder lugar para a tutela pública que, amparada no conceito de "interesse coletivo", obsta a regularização de atividade degradante.

Deixar um largo contingente de pessoas à margem da sociedade, realizando ATIVIDADE sem a devida regulamentação e regularização, não é o propósito do ESTADO. Em contrapartida, este não pode permitir que atividades degradantes conquistem o status de atividade comum e ordinária.

Efetivamente que não será com a vedação ao registro do Sindicato da categoria que se irá conter ou controlar a prática da prostituição, afinal não é este o propósito. Contudo, a ausência do REGISTRO, que ora é negado, não fomentará ou propagará o "espírito associativo" de que trata o artigo 7, "d", da minuta do estatuto.

Certo é que nem todas atividades o Estado intervencionista deve permitir e regulamentar. O texto supremo indica que o Poder Público tem o dever de impedir toda e qualquer atividade degradante e humilhante, assim consideradas aquelas que reduzem o ser humano a uma situação de indignidade frente a sua própria pessoa e frente a seus pares na sociedade.

A proteção constitucional à "dignidade da pessoa humana", que é direito individual indeclinável, não se ajusta à idéia da comercialização do próprio corpo, seja para a venda direta de órgãos  - situação que ostenta vedação legal -, seja para satisfação da libido alheia.

Ante o exposto, considerando a vedação legal, apresentada no artigo 115 da Lei de Registros Públicos, considerando o seu conteúdo revelado pelo art. 1o, inciso III, da Constituição Federal, JULGO PROCEDENTE A DÚVIDA. Cientifique-se os interessados.

P.R.I.C.

São Paulo, 6 de Maio de 2003.

Venício Antonio de Paula Salles

Juiz de Direito Titular



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