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    Acórdão TJMS
    Fonte: 0600012-12.2008.8.12.0054
    Julgamento: 01/10/2013 | Aprovação: Não disponível | Publicação: Não disponível
    Estado: Mato Grosso do Sul | Cidade: Nova Alvorada do Sul
    Relator: Josué de Oliveira
    Legislação: Decreto-Lei nº 413/1969; arts. 166, 168 e 169 do Código Civil de 2002; entre outras.

    Ementa:

    APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE – HIPOTECA EM CÉDULA DE CRÉDITO COMERCIAL – CONSTITUIÇÃO EM INSTRUMENTO PARTICULAR – VALIDADE – PRETENSÃO AFRONTOSA AO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA – SENTENÇA CONFIRMADA. A hipoteca de imóveis ajustada como garantia em cédula de crédito comercial pode ser firmada por instrumento particular, levada a registro no livro próprio, sendo desnecessária sua constituição por instrumento público. A pretensão do autor/apelante, de invalidar a hipoteca oferecida, por instrumento particular, em cédula de crédito comercial, figura-se atentatória ao princípio da boa-fé objetiva, pois, ao contratar o financiamento com o Banco réu/apelado, livre e espontaneamente, gravou os imóveis com a hipoteca e agora, com nítido intuito protelatório, tenta desconstituir a garantia inerente ao ato.

    Íntegra:

    TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MATO GROSSO DO SUL

    Apelação – Nº 0600012-12.2008.8.12.0054 – Nova Alvorada do Sul – 4ª Câmara Cível

    Relator: Exmo. Sr. Des. Josué de Oliveira

    Apelante: Paulo Gregório de Souza

    Advogado: Fabio Lechuga Martins

    Apelado: Banco do Brasil S/A

    Advogado: Marcelo Marroni Vieira de Faria

    Advogado: Osvaldo Vieira de Faria

    Data do julgamento: 01/10/2013

    Data de registro: 04/12/2013

    EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE – HIPOTECA EM CÉDULA DE CRÉDITO COMERCIAL – CONSTITUIÇÃO EM INSTRUMENTO PARTICULAR – VALIDADE – PRETENSÃO AFRONTOSA AO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA – SENTENÇA CONFIRMADA.

    A hipoteca de imóveis ajustada como garantia em cédula de crédito comercial pode ser firmada por instrumento particular, levada a registro no livro próprio, sendo desnecessária sua constituição por instrumento público.

    A pretensão do autor/apelante, de invalidar a hipoteca oferecida, por instrumento particular, em cédula de crédito comercial, figura-se atentatória ao princípio da boa-fé objetiva, pois, ao contratar o financiamento com o Banco réu/apelado, livre e espontaneamente, gravou os imóveis com a hipoteca e agora, com nítido intuito protelatório, tenta desconstituir a garantia inerente ao ato.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os juízes da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça, na conformidade da ata de julgamentos, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator.

    Campo Grande, 1 de outubro de 2013.

    Des. Josué de Oliveira – Relator

    RELATÓRIO

    O Sr. Des. Josué de Oliveira.

    PAULO GREGÓRIO DE SOUZA apela (p. 61-4) contra a sentença (p. 52-6) proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Nova Alvorada do Sul, que julgou improcedente a ação de declaração de nulidade por ele ajuizada em face do BANCO DO BRASIL S.A., objetivando a declaração de nulidade da constituição de hipoteca de dois imóveis, por escritura particular, em cédula de crédito comercial.

    Alega que o Decreto-Lei n. 413/1969 não dispensou expressamente a necessidade de escritura pública para constituição de hipoteca, de sorte que, quanto à forma, devem ser aplicadas as disposições do Código Civil, conforme dispõe o artigo 26 do referido Decreto-Lei.

    Afirma que, sendo a hipoteca um direito real, jamais poderia ser constituído através de instrumento particular, e sim por meio de escritura pública, conforme dispunha o artigo 134, II, do Código Civil de 1916, vigente à época, com a redação dada pela Lei n. 7.103/1993.

    Aduz que a nulidade do ato deve ser declarada com base nas disposições dos artigos 146 e 146 do Código Civil de 1916 e dos artigos 166, 168 e 169 do Código Civil de 2002.

    Requer seja reformada a sentença, com a declaração de nulidade da constituição da hipoteca especificada nos autos.

    O recurso foi recebido nos efeitos suspensivo e devolutivo (p. 67).

    Em contrarrazões (p. 70-4), o apelado bate-se pelo improvimento do recurso.

    VOTO

    O Sr. Des. Josué de Oliveira. (Relator)

    PAULO GREGÓRIO DE SOUZA ajuizou a presente ação em face do BANCO DO BRASIL S.A., amparado nos artigos 134, II, 145 e 146 do Código Civil de 1916 e nos artigos 166, 168 e 169 do Código Civil de 2002, a fim de que fosse declarada a nulidade da hipoteca, por instrumento particular, de dois imóveis dados em garantia de uma cédula de crédito comercial firmada entre as partes litigantes, ora objeto da Execução de Título Executivo Judicial n. 054.05.550065-3, em curso pela Vara Única da Comarca de Nova Alvorada do Sul, proposta pelo BANCO credor, ora apelado (autos em apenso).

    A pretensão do autor foi julgada improcedente pelos seguintes motivos, que adoto para este voto:

    O art. 134, II, do Código Civil de 1916, era taxativo no sentido de que nos contratos constitutivos de direitos reais sobre imóveis com valor superior a cinquenta mil cruzeiros é da substância do ato o instrumento público.

    Lado outro, o art. 145, do mesmo diploma legal, previa que é nulo o ato jurídico quando não revestir a forma prescrita em lei.

    Ocorre, todavia, que à relação jurídica posta não se aplicam as regras ordinárias do Código Civil, mas sim aquelas ínsitas ao direito cambiário, uma vez que o direito real de garantia objurgado foi constituído no bojo de uma cédula de crédito comercial.

    Com efeito, mencionado título de crédito, disciplinado pela Lei n.º 6.840/80, e subsidiariamente, pelo Decreto-Lei n.º 413/69, ostenta garantia real incorporada à própria cártula, ou seja, é da sua própria natureza a inserção da hipoteca, o que redunda dizer que a lei de regência dispensa a sua formalização por intermédio de escritura pública.

    Nesse sentido, já decidiu a jurisprudência:

    "Hipoteca constituída em cédula de crédito bancário. Registro da hipoteca com a própria cédula. Desnecessidade de formalização da hipoteca em escritura pública."1

    "A hipoteca cedular independe de formalização através da escritura pública, segundo entendimento do STJ."2

    "A hipoteca instituída em cédula de crédito industrial independe de formalização através de escritura pública."3

    Ademais, a pretensão do autor nesse momento parece-me atentória ao princípio da boa-fé objetiva, pois, quando obteve financiamento junto ao banco-réu, livre e espontaneamente, gravou os imóveis e agora, com notório intuito protelatório, tentam desconstituir a garantia inerente ao ato.

    Como cediço, a boa-fé objetiva é uma norma geral de conduta segundo a qual as partes devem guardar fidelidade à palavra dada, agir corretamente e de maneira leal, o que implica dizer que aos contraentes é proibida a exteriorização de comportamentos contraditórios, princípio cunhado na expressão latina venire contra factum proprium.

    Aliás, até o Código de Processo Civil, em seu art. 243, já consentâneo com essa ética que deve permear todas as relações jurídica, prevê que "quando a lei prescrever determinada forma, sob pena de nulidade, a decretação desta não pode ser requerida pela parte que lhe deu causa".

    Dessa forma, sob qualquer ângulo que se analise a questão, a pretensão autoral não merece acolhida.

    No presente recurso, o autor/apelante se limita a repetir os argumentos da petição inicial.

    Todavia, não lhe cabe mesmo razão.

    O Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, no julgamento do REsp 34278/ES pelo Superior Tribunal de Justiça, expôs com clareza os motivos pelos quais, em garantia de cédula de crédito, a hipoteca independe de constituição por instrumento público, a saber:

    Trata-se de cédula de crédito comercial, com garantia hipotecária, nos termos dos arts. 1º, da Lei 6840/80, 9º, 10, 14, 19, III, 24, 25 e 26 do Decreto-lei 413/69.

    O cerne da controvérsia cinge-se à determinação da necessidade, ou não, de constituição dessa garantia hipotecária por instrumento público, nos termos da legislação específica sobre hipoteca.

    O tema é novo na jurisprudência desta Corte, que não conta com precedente a ele concernente.

    O art. 19 do Decreto-lei 413/69, aplicável à cédula de crédito comercial, consigna:

    “A cédula de crédito industrial pode ser garantida por:

    ... omissis ...

    III hipoteca cedular.”

    Manifestou-se expressamente o Tribunal de origem quanto à circunstância de que a cédula exequenda se adequa às inteiras aos requisitos de constituição previstos nessa norma. Acolheu, entretanto, o apelo dos embargantes por entender que a garantia hipotecária nela prevista somente poderia ser constituída por instrumento público, haja vista determinar o art. 26 do mesmo diploma que se aplique à hipoteca cedular “os princípios da legislação ordinária sobre hipoteca”, no que não colidirem com esse Decreto-lei.

    Todavia, a interpretação dada pelo Colegiado ao tema é equivocada. Neste sentido, a doutrina de Rubens Requião, verbis:

    “A cédula de crédito industrial é uma promessa de pagamento, com garantia real, cedularmente constituída. Essa garantia real poderá ser instituída pela forma de penhor cedular, alienação fiduciária ou hipoteca cedular. Essas garantias podem ser oferecidas por terceiro, que se vincula à obrigação.

    No título de crédito, portanto, serão constituídas as garantias, dispensando-se, assim, o excessivo formalismo do direito comum. Além disso, é considerado um título líquido e certo, exigível pela soma dele constante ou do endosso, além dos juros, da comissão de fiscalização, se houver, e demais despesas que o credor fizer para segurança, regularidade e realização de seu direito de crédito (art. 9º). Assim, como se vê, o crédito pode ser constituído pelo saldo, pois o credor deve descontar da cédula os pagamentos feitos ou as quantias não levantadas, para exigir o saldo líquido, acrescido dos acessórios indicados. Da mesma forma, ao endossar o título deverá declarar no endosso o crédito que por ele é transmitido. Não constando desse endosso o valor pelo qual se transfere a cédula, entende-se que prevalecerá o da soma declarada no título, com os acessórios, deduzidas as quitações parciais constantes do mesmo.

    A inadimplência de qualquer obrigação do emitente do título ou, se for o caso, do terceiro prestante da garantia real, provoca o vencimento antecipado da dívida incorporada à cédula, independentemente de aviso ou de interpelação judicial. Nessa hipótese, o credor pode considerar vencidos antecipadamente todos os financiamentos concedidos ao emitente e dos quais seja credor”.

    “A cédula de crédito industrial pode ser garantida, como já se esclareceu, por penhor, alienação fiduciária ou hipoteca. Cada um desses direitos reais de garantia, embora cedularmente instituídos, segue as normas e a disciplina da lei comum, naquilo que lhe for adequado. Amenizou-se o formalismo da instituição desses direitos, pois independem, inclusive a hipoteca, de escritura pública, visto que são apenas inseridos validamente na própria cédula.

    A lei determina o modo de inscrição e averbação da cédula, que será efetuada em livro especial que cria Registro de Cédula de Crédito Industrial entregue à competência do Registro de Imóveis, independentemente da espécie dagarantia oferecida cedularmente, livro que será examinado semanalmente pelo Juiz dos Registros Públicos, ou aquele que acumular essas funções.

    A lei determina que a cédula de crédito industrial somente vale contra terceiros desde a data da inscrição. Antes da inscrição a cédula obriga apenas seus signatários. Houve, como se vê, um avanço e aperfeiçoamento doutrinário, quanto à constituição do direito real, que por força do art. 29 se constitui na própria cédula, e não decorre apenas da inscrição no Registro Público” (“Curso de Direito Comercial”, 2º vol., Saraiva, 1988, 17ª edição, nº 699, p. 477).

    Do magistério de Amador Paes de Almeida, colhe-se:

    “A cédula de crédito industrial. É um título que objetiva evitar o formalismo do penhor ou da hipoteca, garantias que se incorporam ao título. É, assim, uma promessa de pagamento com garantia real. Título líquido e certo, negociável por endosso, por incorporar garantia real pode fundar-se em hipoteca, penhor e até mesmo alienação fiduciária” (“Teoria e prática dos Títulos de Crédito”, Saraiva, 1989, 12ª ed., nº 92, p. 187).

    Discorrendo a respeito desse título, Arnaldo Rizzardo comenta:

    “Os títulos em epígrafe foram criados pela Lei 6840, de 3.11.80, que, em seu art. 1º, indica quais são os referidos títulos: “As operações de empréstimo concedidas por instituições financeiras a pessoa física ou jurídica que se dedique à atividade comercial ou de prestação de serviços poderão ser representadas por cédula de crédito comercial e por nota de crédito comercial”.

    Assim, dois os títulos: a cédula de crédito comercial e a nota de crédito comercial.

    A primeira constitui uma promessa de pagamento em dinheiro, com garantia real, cedularmente formada.

    A última vem a ser uma promessa de pagamento em dinheiro, sem garantia real” (“Contratos de Crédito Bancário”, Ed. Revista dos Tribunais, 1990, Cap. 11, nº 1, p. 208).

    O tema, ademais, não mereceu maiores considerações por parte da doutrina especializada, sendo de se supor que não ensejou ele quaisquer discussões, do que aliás dá conta a falta de jurisprudência específica.

    Com efeito, interpretando-se teleologicamente as normas que instituíram e regulamentaram as cédulas de crédito comercial e industrial, observa-se que vieram elas a lume para colocar à disposição da indústria e do comércio instrumentos de crédito que agilizassem a obtenção de empréstimos. Assim sendo, estipulou-se para essas atividades econômicas a possibilidade de contraírem empréstimos junto a instituições financeiras mediante a emissão de títulos de crédito que incorporassem na própria cédula a garantia real constituída pelo devedor.

    Neste passo, como salientam as lições transcritas, pretendeu a lei simplificar o procedimento adotado, não se aplicando, portanto, a norma concernente à constituição por instrumento público, porque em desacordo com o espírito do Decreto-lei 413/69 e da Lei 6840/80.

    Destarte, ao dar provimento ao apelo dos embargantes, para declarar “a inexigibilidade executiva do título que instrumentaliza a execução com a consequente extinção da mesma”, negou vigência o Colegiado aos arts. 9º, 10, 14 e 19 do Decreto-lei 413/69, assim como aos arts. 1º e 5º da Lei 6840/80, vulnerando, também, o art. 82 do Código Civil [de 1916], por exigir para validade do ato forma dispensada pela lei.

    Pelo exposto, conheço do recurso pela alínea a do permissivo constitucional e ao mesmo dou provimento para, reformando o v. acórdão recorrido, restabelecer a r. sentença.

    O acórdão, unânime, restou com a seguinte ementa:

    COMERCIAL. CÉDULA DE CRÉDITO COM GARANTIA HIPOTECÁRIA. CONSTITUIÇÃO DA GARANTIA NA PRÓPRIA CÉDULA. ARTS. 9º, 10, 14, 19, 24, 25 E 26, DO DECRETO-LEI 413/69. DISPENSA DO INSTRUMENTO PÚBLICO. VALIDADE DO TÍTULO EXECUTIVO. RECURSO PROVIDO. - A cédula de crédito comercial com garantia hipotecária, que atenda aos requisitos previstos no art. 14 do Decreto-lei 413/69, independe, para validade da garantia real, de constituição por instrumento público, sendo válidos o título de crédito e a garantia firmados por instrumento particular, levados a registro no livro próprio.

    (STJ, REsp 34278/ES, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 26/10/1993, DJ 29/11/1993, p. 25886)

    Fica evidente, portanto, que a hipoteca de imóveis ajustada como garantia em cédula de crédito comercial pode ser firmada por instrumento particular, sendo desnecessária sua constituição por instrumento público.

    Além disso, conforme bem assinalou o Juízo de primeiro grau, a pretensão do autor/apelante figura-se atentatória ao princípio da boa-fé objetiva, pois, ao contratar o financiamento com o réu/apelado, livre e espontaneamente, gravou os imóveis com a hipoteca e agora, com nítido intuito protelatório, tenta desconstituir a garantia inerente ao ato.

    Tanto é assim, aliás, que o apelante não teceu uma linha sequer contra esse posicionamento do julgador.

    Por conseguinte, a sentença há de ser prestigiada nesta segunda instância.

    Ante o exposto, conheço do recurso e nego-lhe provimento, ficando mantida a sentença na sua integralidade.

    DECISÃO

    Como consta na ata, a decisão foi a seguinte:

    POR UNANIMIDADE, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR.

    Presidência do Exmo. Sr. Des. Dorival Renato Pavan Relator, o Exmo. Sr. Des. Josué de Oliveira. Tomaram parte no julgamento os Exmos. Srs. Des. Josué de Oliveira, Des. Paschoal Carmello Leandro e Des. Dorival Renato Pavan.

    Campo Grande, 01 de outubro de 2013.

    ______________

    1 TJPR, Ap 0582587-4, 11ª Cam. Civ., rel. Juiz Conv. ELIZABETH M F ROCHA, DJPR 12/02/2010, p. 99.

    TJES, Ap 024.00.005195-3, 4ª Cam. Civ., rel. Des. AMIM ABIGUENEM, j.09/03/2004.

    3 STJ, RESP 83648/ES, 4ª T., rel. Min. RUY ROSADO DE AGUIAR, j. 16/04/1996.

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