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Feirão da Casa Própria da Caixa Econômica Federal – 15 a 18 de setembro de 2005


Expo Center Norte, São Paulo-SP
Pavilhão Amarelo – 18/9/2005 – 16h

 Como comprar seu imóvel com mais segurança
Adriano Damásio *

Cumprimento a Caixa Econômica Federal na pessoa do seu Coordenador Jurídico, Dr. Mauro Antônio Rocha;

Cumprimento a Tabeliã desta Capital, Dra. Jussara Citroni Modaneze;

Cumprimento os demais presentes: boa tarde a todos!

É com alegria que aqui compareço, para compartilharmos pensamentos relativos à compra segura de um imóvel.

Antes, porém, devo parabenizar a Caixa Econômica Federal pela realização deste feirão. Todos os presentes constatam, assim como a mídia tem demonstrado, o grande sucesso do evento.

Pois bem, passemos ao assunto: como comprar um imóvel com mais segurança. Disse-me alguém: “esse título não seria Como comprar um imóvel com segurança ? Por que com  mais  segurança?” A resposta é simples. A prática indiscriminada do instituto da desconsideração da pessoa jurídica em ações judiciais tem, em situações específicas, tornado a compra de um imóvel – a ser realizada com absoluta segurança – um ato bravamente heróico, que não pode ser realizado por todo e qualquer cidadão.

Também não auxilia o cidadão comum, já terem sido editadas mais de 11 mil leis federais; mais de 11 mil leis estaduais e mais de 13 mil leis municipais (no caso de São Paulo).

De qualquer maneira, o comportamento de quem adquire um bem de raiz, uma propriedade imóvel, deve diferenciar-se do comportamento de quem compra uma roupa, ou outro bem de consumo. Quem se decide a comprar uma casa deve ter em mente que terá pela frente um trabalho que exige calma, paciência. Nada de ansiedade ou nervosismo! Nada de querer fechar negócio em minutos! A ansiedade é a maior inimiga do comprador imobiliário, e o controle da ansiedade determinará, em muitas vezes, a qualidade da compra de um imóvel.

Deve-se em todos os casos atentar para as proteções que o ordenamento jurídico apresenta para o comprador. A primeira delas é a seguinte: os direitos reais de natureza imobiliária nascem com sua inscrição no registro imobiliário.

O artigo 1.227 CC diz:  “Os direitos reais sobre imóveis constituídos, ou transmitidos por atos entre vivos, só se adquirem com o registro no Cartório de Registro de Imóveis dos referidos títulos (arts. 1.245 a 1.247), salvo os casos expressos neste Código.”

E o que isso significa? Significa que:  Quem não registra, não é dono.

Nosso sistema exige, cumulativamente , título e inscrição.

Por meio do título se constitui o direito obrigacional, que vincula as partes; pelo registro , constitui-se o direito real, que vincula a todos.

Há um conhecido diretor do IRIB, doutor Flauzilino Araújo dos Santos [1], que corretamente afirma que os direitos reais imobiliários nascem com vocação imediata de eficácia e de publicidade.

Como recurso didático, ele costuma citar um provérbio extraído da Bíblia Sagrada que diz: “O homem nasce para o trabalho, como as faíscas da brasa nascem para voar” (Provérbios de Salomão).

Não existe lugar no sistema jurídico brasileiro para direitos reais ocultos ou clandestinos.

Dessa forma a primeira e correta postura do comprador deve ser aquela de dirigir-se ao cartório de registro de imóveis para requerer a expedição da certidão de propriedade do imóvel.

O comprador saberá a que cartório de registro de imóveis dirigir-se, em face da localização do imóvel do seu interesse. A cada região geográfica determinada corresponde um cartório de registro de imóveis respectivo.

Com a certidão de propriedade em mãos (certidão de inteiro teor no caso do imóvel estar matriculado – certidão da matrícula – registro feito a partir de 1976; certidão negativa de ônus e alienações, no caso do imóvel estar ainda transcrito – transcrição era o registro feito anteriormente a 1976), poderá o interessado na compra obter uma grande quantidade de úteis informações para concluir o negócio, ou não.

Com a certidão de propriedade em mãos o interessado na compra terá informações suficientes para poder decidir pela conclusão do negócio, ou não. Essa certidão será de inteiro teor, ou certidão da matrícula, se o imóvel estiver matriculado, isto é, no caso de registro feito a partir de 1976. E será uma certidão negativa de ônus e alienações se o do imóvel ainda estiver transcrito – transcrição era o registro feito anteriormente a 1976.

1ª Situação: verificar se quem lhe vende o imóvel figura no registro como seu proprietário.

É muito comum a pessoa sentir-se proprietária de um imóvel porque tem um título em mãos – escritura, carta de sentença, formal de partilha –, embora esse título não tenha sido registrado. Às vezes, o título que a pessoa possui, mesmo ostentando origem judicial, pode não ser suficiente para transmitir-lhe a propriedade do imóvel.

Imaginemos o seguinte caso: um casal, ao separar-se, decide que o imóvel ficará para a mulher. Tal situação é apreciada judicialmente e homologada por decisão transitada em julgado. Como “prova da propriedade” foi juntado aos autos cópia de um instrumento particular de compromisso de venda e compra do imóvel. Passaram-se os anos, aquela senhora sempre guardou consigo aquela sentença judicial que lhe parecia ser a “prova incontestável” da propriedade do imóvel. Por outro lado, o original daquele instrumento particular perdeu-se com o tempo. Uma, porque foi-se nas coisas do varão – e que já não guardava nenhum apreço pelos documentos do imóvel. Duas, porque a mulher já tinha o seu título judicial em mãos – o que mais poderia ser exigido?!

O promitente vendedor por seu turno, de nacionalidade chilena, resolve voltar para seu país, sem deixar procurador ou qualquer administrador – nem mesmo notícia de seu endereço – uma vez que desfez-se de todos os bens, e nada mais o prendia no Brasil.

Vinte anos transcorram da separação. Hoje, aquela senhora quer vender o imóvel. Como fazer? Para ela é público, notório e incontestável que o imóvel é dela – vá tentar algum de nós demovê-la dessa convicção e verá o que acontece!

Em síntese, para que a propriedade daquele imóvel se materialize na pessoa daquela mulher, deverá ela obter outra sentença judicial transitada em julgado – uma adjudicação compulsória, talvez. Há casos nos quais somente a usucapião resolve.

Assim, mister que se verifique, no registro de imóveis, quem é o proprietário do imóvel.

 2º Situação: verificar em que estado civil figura o proprietário no registro.

Quais os dados de identificação e qualificação que o registro apresenta com relação ao proprietário? Estado civil é mais do que informar se é solteiro, casado ou viúvo. Questões relativas ao estado civil envolvem a condição legal da pessoa e seus direitos e deveres no que concerne às relações jurídicas de família e à situação de ordem privada na sociedade, até mesmo a eventual união estável quando tratar-se de pessoa dita solteira, viúva, separada ou divorciada. Há de se verificar também a grafia do nome, documentos de identificação, o regime de bens, se casado, entre outros dados.

Imaginemos uma pessoa casada sob o regime obrigatório da separação de bens. Essa pessoa adquire um imóvel – destaca-se: casado sob o regime obrigatório da separação de bens. Seu cônjuge falece. Essa situação é averbada na matrícula do imóvel. Assim teremos que o proprietário é viúvo. Como adquiriu o imóvel enquanto casado, todavia, sob o regime da separação de bens, ele entende que pode alienar o imóvel sem efetivar a partilha. Engano. Há a chamada comunicação de aqüestos, por força da súmula 377 do Supremo Tribunal Federal, havendo necessidade da abertura da sucessão.

No caso do exemplo, somente após a devida partilha, pondo fim à sucessão, a propriedade estará definida. Caso o falecido tenha herdeiros necessários, a parte que lhe cabe irá para tais herdeiros. Numa situação como essa, pode ser que os herdeiros nem tenham interesse na venda do imóvel. Veja que situação!

Outra possibilidade que não pode ser descartada é a tentativa de venda praticada por pessoa homônima. Há de se ter muito cuidado. E não somente com nomes ditos comuns. O que acham, por exemplo, de Adriano Damásio? Parece-lhes comum esse nome? Esse é o meu nome, e por semanas eu fui aborrecido insistentemente por uma cobrança praticada pelo Banco do Brasil.

Ao fim de semanas descobriram eles que eu nasci em 1965, e o devedor era nascido em 1973. Até me propus a pagar conta desde que me tornassem 8 anos mais jovem; eles não puderam fazê-lo, também não paguei o débito.

A identificação do vendedor com a pessoa que figura no registro deve ser rigorosa. E não deve ser tímido o comprador que deseja comprar um imóvel, pois quem deseja vender um bem de raiz não pode dar-se ao luxo de sonegar informações de si mesmo.

 3º Situação: Verificar a existência de ônus que gravam o imóvel.

Há menção de hipoteca?

Como o vendedor adquiriu o imóvel, financiou parte do pagamento?

O vendedor é mutuário do SFH?

Consta na matrícula que o imóvel é bem de família?

Consta instituição de usufruto em favor de alguém?

Há registro (ou averbação) relativo a contrato de locação?

Há registro de penhora, arresto, seqüestro?

Consta da certidão que a pessoa que está vendendo comprou o imóvel, ou apenas que comprometeu-se a comprá-lo?

Essas e muitas outras situações podem estar noticiadas na certidão e devem alertar o comprador. Se não compreender a informação escrita na matrícula, ele deve perguntar ao oficial do cartório o que significa. Existem informações que somente podem ser esclarecidas mediante a consulta a um profissional específico. Há consultas que somente podem ser formuladas a um advogado. De qualquer forma, o próprio registrador pode esclarecer o interessado.

Outra possibilidade é o interessado na compra consultar um tabelião de notas. O notário, por força de lei, pode esclarecer as partes contratantes em negócios jurídicos. Caso a pessoa tenha um notário de confiança, deve consultá-lo.

Gostaria de destacar que hipoteca, a rigor, não impede a venda de um imóvel, sequer prejudica o registro dessa venda no cartório de registro de imóveis. Ocorre que a hipoteca gera um direito, chamado de direito de seqüela, que permite perseguir a coisa a despeito de quem detenha a titularidade de domínio sobre ela. Deve-se ter cuidado ao comprar um imóvel hipotecado. Deve-se ter certeza absoluta do ato que se está praticando.

Há certos tipos de hipoteca que, a rigor, impedem a venda: a hipoteca cedular e a hipoteca em favor de agente do sistema financeiro da habitação – SFH, nessa condição de agente.

Há um grande risco de se perder o imóvel, quando se adquire um imóvel de mutuário do SFH sem anuência do credor hipotecário.

4º Situação: a compra de imóvel oriundo de loteamento ou incorporação imobiliária.

Vez ou outra acontece da família ir passear no domingo, passar pelo parque, tomar um sorvete, descer até a praia ou subir para as montanhas.

No caminho encontra a promoção do ano para comprar um imóvel. Pode acontecer de a pessoa ficar inclinada a fechar um negócio naquele mesmo instante. Pode ser que aquele domingão, ou aquele feriadão, seja memorável se você fechar o indigitado negócio. Pode ser que você jamais se esqueça mesmo daquele dia.

Faça um favor a você mesmo, não compre imóvel por impulso, nem que lhe pareça ser um “presente de Deus”.

Loteamentos e incorporações devem, obrigatoriamente, estar aprovados pelo poder público –prefeitura e outros órgãos, quando for o caso –, e registrados no cartório de registro de imóveis . Vá até o cartório, peça para ver o memorial, certifique-se de que está registrado – pergunte se já houve alguma venda registrada.

O Procon recomenda que se guardem os materiais de publicidade oferecidos e com eles se faça uma prévia pesquisa a respeito da regularidade do empreendimento e da idoneidade do vendedor (loteador ou construtora), antes de assinar qualquer documento.

Há inúmeras outras precauções que devem ser observadas na aquisição imobiliária; todavia, esgotados os vinte minutos, coloco-me à disposição para quaisquer outros esclarecimentos. Espero de alguma forma ter sido útil com esses pensamentos trazidos à reflexão, agradecendo a todos. Muito obrigado.

Notas

   * Adriano Damásio é registrador substituto do Primeiro Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo-SP e professor de Direito Civil na UNIP.

 [1] SANTOS, Flauzilino Araújo dos. In Palestra Proferida na OAB/SP – Subsecção de Pinheiros – São Paulo, Capital.



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