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    Acórdão TJAM
    Fonte: 2010.002905-6
    Julgamento: 28/02/2011 | Aprovação: Não disponível | Publicação: 10/03/2011
    Estado: Amazonas | Cidade: Manaus
    Relator: Sabino da Silva Marques
    Legislação: Súmulas nºs 84 e 375 do STJ.

    Ementa:

    Recurso de remessa necessária. Processo civil. Embargos de terceiros execução fiscal. Aquisição de propriedade imóvel. Ausência de registro. Situação que não invalida o compromisso de compra e venda. Alegação de fraude à execução. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ DO TERCEIRO ADQUIRENTE. AUSÊNCIA DE PROVA DO CONCILIUM FRAUDIS. APLICAÇÃO DAS SÚMULAS 84 E 375 DO STJ. Recurso conhecido e improvido. I - Comprovada a alienação do bem, através de contrato de promessa de compra e venda, anterior ao ajuizamento do executivo fiscal e da penhora do imóvel, é de ser reconhecida a eficácia perante terceiros da negociação efetuada, devendo ser desconstituída a penhora realizada. II - O imóvel foi vendido antes do ajuizamento da execução e do registro da penhora, e inexiste prova capaz de afastar a presunção de boa-fé do adquirente. Sentença mantida pelos próprios fundamentos. III – Recurso conhecido e improvido.

    Íntegra:

    TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO AMAZONAS

    PROCESSO Nº 2010.002905-6

    Órgão Julgador: Primeira Câmara Cível

    Classe: Remessa Ex-Officio

    Requerente: Jorge do Nascimento Gomes

    Requerido: Fazenda Pública do Estado do Amazonas

    Relator: Des. Sabino da Silva Marques

    Data de Julgamento: 28/02/2011

    Publicação: 10/03/2011 

    EMENTA: Recurso de remessa necessária. Processo civil. Embargos de terceiros execução fiscal. Aquisição de propriedade imóvel. Ausência de registro. Situação que não invalida o compromisso de compra e venda. Alegação de fraude à execução. PRESUNÇÃO DE BOA-FÉ DO TERCEIRO ADQUIRENTE. AUSÊNCIA DE PROVA DO CONCILIUM FRAUDIS. APLICAÇÃO DAS SÚMULAS 84 E 375 DO STJ.  Recurso conhecido e improvido. 

    I - Comprovada a alienação do bem, através de contrato de promessa de compra e venda, anterior ao ajuizamento do executivo fiscal e da penhora do imóvel, é de ser reconhecida a eficácia perante terceiros da negociação efetuada, devendo ser desconstituída a penhora realizada. 

    II - O imóvel foi vendido antes do ajuizamento da execução e do registro da penhora, e inexiste prova capaz de afastar a presunção de boa-fé do adquirente. Sentença mantida pelos próprios fundamentos. 

    III – Recurso conhecido e improvido. 

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Necessário, acordam os Desembargadores que compõem a Primeira Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, por unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator que passa a integrar o presente. 

    Sala de sessões da Primeira Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas, em Manaus/AM, 28 de fevereiro de 2011. 

    Desembargador Presidente 

    Sabino da Silva Marques, Desembargador Relator 

    Procurador de Justiça 

    01. RELATÓRIO 

    01.01. Trata-se de Recurso de Remessa Necessária nos autos da ação de Embargos de Terceiros proposta por Jorge Nascimento Gomes em face da Fazenda Pública Estadual, que tramitou na 1ª Vara Especializada da Dívida Ativa Estadual da Capital. 

    01.02. Alega o Embargante que, o juízo da 1ª Vara Especializada da Dívida Ativa Estadual, a pedido da embargada, determinou a constrição junto ao 3º Ofício de Registro de Imóveis desta cidade, Matrícula 15478, do apartamento localizado na Av. Coronel Teixeira s/n°, Conjunto Ayapua, Bloco H1, Apt° 23, Compensa. 

    01.03. Sustenta que o embargante adquiriu de boa-fé o referido imóvel em 21 de dezembro de 1998, conforme procuração junto ao 1º Ofício de Notas, assinada pela Sra. Raimunda Araújo Dias. Imóvel este financiado pelo BEA - Crédito  Imobiliário,   posteriormente Caixa Econômica Federal. 

    01.04. Aduz o embargante que, por questões de ordem financeira não alterou os dados do imóvel, quer seja junto a Caixa Econômica Federal e, consequentemente junto ao Cartório do Registro de Imóveis do 3º Ofício, quer seja junto a Prefeitura Municipal de Manaus relativo ao IPTU - Imposto Territorial Urbano e, ao tentar regularizar o imóvel junto ao Cartório do Registro de Imóveis do 3º Ofício, descobriu a constrição relativa ao processo n° 012.10.025639-5, da 2ª Vara da Dívida Ativa Estadual.

    01.05. Afirma que, após luta judicial assegurou o bem, conforme carta junto a Sefaz, onde relata toda a trajetória para aquisição do referido bem, inclusive que conheceu a Sra. Raimunda Araújo Dias somente no dia da assinatura da procuração, pois não adquiriu diretamente dela e sim após este bem ter passado por "diversos proprietários" e ter exigido do último a revogação das procurações anteriores, pois nenhum deles regularizou a situação junto aos órgãos competentes. 

    01.06. Assevera, ainda, que atualmente, em mais uma tentativa para regularizar este imóvel, depara-se com nova constrição, agora relativa ao processo principal em epígrafe, sendo necessário esclarecer a propriedade do bem, objeto desta ação judicial, pois a Senhora Raimunda Araújo está acumulando dívidas, haja vista o imóvel está alugado para o Sr. José Rubens Pereira Fontoura, conforme cópia do contato de aluguel, e o mesmo está sendo constrangido diante de tais ações judiciais. 

    01.07. A Fazenda Pública Estadual apresentou contestação na qual fez, inicialmente, um breve relato dos fatos afirmando que a Fazenda Pública move em face de LUCINECA MODAS E CONFECÇÕES LTDA e seus sócios coobrigados RAIMUNDA ARAÚJO DIAS e LUCINETE DIAS LINDOSO Ação de Execução Fiscal, a cujos autos foram os presentes embargos apensados. 

    01.08. Aduz que, no decorrer do procedimento executivo, foi requerido, pela Fazenda, a expedição de Mandado de penhora, avaliação e registro do imóvel matrícula 15478, cartório do 3º Ofício de Registro de Imóveis, localizado no bloco H 1, apto 23 - Conjunto Residencial Parque Ayapuá, de propriedade da executada Raimunda Araújo Dias, conforme Certidão narrativa de fls. 52, dos autos principais, de acordo com o Auto de Arresto lavrado às fls. 70. 

    01.09. Aduz, ainda, que às fls. 78 dos autos do processo de execução, foi lavrado Termo de Penhora do referido imóvel, aos 04 de novembro de 2008, cuja penhora foi devidamente registrada em 10 de novembro de 2008, conforme certidão do imóvel as fls. 85/86 do processo de execução e, após a ciência do ato constritivo, o ora Embargante ajuizou a presente ação de Embargos de Terceiro, alegando ser adquirente de boa-fé do referido imóvel desde 21 de dezembro de 1998, conforme procuração junto ao 1º Ofício de Notas; que por questões de ordem financeira não alterou os dados do imóvel; c) que ao tentar regularizar o imóvel junto ao Cartório do 3º Ofício de Registro de Imóveis, descobriu a construção relativa ao processo 0129611180-3. 

    01.10. Quanto ao direito, passa a discorrer a embargada afirmando que, quanto a aquisição da propriedade imóvel segundo o Código Civil, pretende o embargante ver desconstituída a penhora registrada sobre imóvel que alega ser de sua propriedade, tendo em vista o Instrumento Particular de Cessão de Direitos que traz aos autos, entretanto, a propriedade em momento algum se transferiu da executada para o embargante. 

    01.11. Sustenta que, a lei civil reconhece que a aquisição da propriedade só se dá mediante o registro do título translativo no cartório competente. Tal exigência materializa a preocupação do legislador brasileiro, em fazendo esta opção, de proteger a propriedade e levá-la ao conhecimento de terceiros. Isso fica mais evidente quando se leva em consideração que o ordenamento jurídico brasileiro adota o princípio da publicidade como corolário da propriedade e dos registros públicos. 

    01.12. Diz em seguida que, o registro do título aquisitivo junto ao Cartório de Registro de Imóveis constitui obrigação que decorre da lei adjetiva civil, sendo que no caso em questão, verifica-se sem esforço de raciocínio que não houve registro da aquisição de propriedade, o que deixa claro que o embargante jamais adquiriu a propriedade do imóvel arrestado. 

    01.13. Diz mais, é certo que os contratos não bastam, no sistema brasileiro, para transferir o domínio, mister se fazendo, para completar o processo translativo, a formalidade da tradição. Quando se trata de móvel, entretanto, o procedimento adequado é a transcrição do título aquisitivo no Registro de Imóveis, o que corresponde à tradição solene e, diante do registro evidenciado na Certidão, portanto, resta claro que a propriedade do imóvel pertence à executada, e não ao embargante, que não tratou de realizar o registro de seu título junto ao Cartório de Registro de Imóveis, obrigação esta que decorre do art. 1.245 do Código Civil. 

    01.14. Assevera que a hipótese legal prevista na Lei de Registros Públicos (Lei n.° 6.015/77), em seu art. 167, é exatamente aquela pendente no presente caso. Caberia o registro do Instrumento Particular de Cessão de Direitos no registro de imóveis, obrigatoriamente, como se depreende do texto legal, obrigação esta da qual não se desincumbiu o embargante ou a executada, não valendo o instrumento contra terceiros, in casu, a Fazenda Pública Estadual. 

    01.15. Continua com suas razões e fundamentos afirmando que o presente caso não se enquadra em qualquer das hipóteses contidas nos incisos I a III do art. 169, portanto, vê-se claramente que lei civil tem como obrigatório o registro do contrato que ora é apresentado pelo embargante no competente Registro de Imóveis, pois sequer o embargante fez o registro da Cessão de Direitos no Cartório do Registro Especial de Títulos e Documentos para valer contra terceiros, conforme se verifica pela cópia trazida aos autos, o que evidencia mais uma vez sua absoluta invalidade contra terceiros. 

    01.16. Ressalta que, não sendo o embargante o proprietário do imóvel para todos os fins de direito, a ele não cabe pretender a tutela jurisdicional para ver desconstituída a penhora realizado, pois a proprietária do imóvel segundo se extrai do Registro de Imóveis, pertence a executada, deve ela responder por todos os encargos passíveis de incidir sobre o imóvel em questão. 

    01.17. Afirma, ainda, que há de ser observada a evidente fraude à execução fiscal perpetrada pela sócia da empresa executada, Sr. Raimunda Araújo Dias, pois às fls. 27/28 do processo de execução, consta cópia do Edital de Citação da executada e de suas sócias coobrigadas, publicado no Diário Oficial do Estado do dia 05 de março de 1998. Por outro lado, o Instrumento Particular de Confissão de Dívida somente foi firmado em 21 de dezembro de 1998, ou seja, quase 9 meses após ter sido citada. 

    01.18. Aduz que, a Cessão de  Direitos,  portanto,  foi  posterior  ao  seu conhecimento de que era coobrigada tributária na execução fiscal movida contra si e contra a empresa   LUCINECA MODAS E CONFECÇÕES LTDA. Neste caso, incide   o regime do art. 185 do Código Tributário Nacional. 

    01.19. Salienta que a executada Raimunda Araújo Dias é sujeito passivo do crédito tributário devidamente inscrito em dívida ativa, conforme se verifica pela Certidão da Dívida Ativa que lastreia o processo executivo (doe. anexo). Também é indubitável que o mesmo se encontra em fase de execução. Daí se conclui inequivocamente que, de acordo com as prescrições legais aplicáveis ao caso, a Cessão de Direitos, instrumento tendente a alienar a propriedade do imóvel, é fraudulenta, pois busca dilapidar patrimônio que poderia ser suficiente para quitar parte da dívida tributária da qual é co-responsável. Alie-se a isto o fato de que a citação deu-se antes da alienação. Não importa se a alienação foi de boa ou de má-fé. A presunção de fraude, nestes casos, é absoluta. 

    01.20. Verbera que, no caso em questão, a execução fiscal foi proposta contra a sócia da empresa executada Raimunda Araújo Dias, conforme consta da inicial. Também é fato que o Instrumento Particular de Cessão de Direitos é posterior a citação da executada. Portanto, o negócio jurídico decorrente do ato entre executada e embargante não é oponível à Fazenda Pública, razão pela qual deverá ser considerado nulo, julgando-se improcedentes os presentes embargos também por este fato. 

    01.21. Requer, ao final, seja declarada Declare ineficaz contra a Fazenda Pública o Instrumento Particular de Cessão de Direitos outorgado do embargante, pela executada, na forma da fundamentação, tendo em vista a fraude à execução; considere válida a penhora efetivada, determinando o prosseguimento do processo executivo com a designação de data para a realização de leilão; 

    01.22. Requereu, ainda, caso assim não entenda, e resolva por bem julgar procedentes os presentes embargos de terceiros: que deixe de condenar a Fazenda Pública às custas e honorários advocatícios, tendo em vista a omissão culposa do embargante em fazer o registro da cessão de direitos no competente Cartório de Registro de Imóveis, o que impossibilitou ao Estado do Amazonas verificar previamente a existência do instrumento ora em questão e tomar conhecimento de seu conteúdo, com base no parágrafo único do art. 1245, do Código Civil; que - Determine o prosseguimento do feito relativamente aos demais bens não embargados, na forma do art. 1.052 do Código de Processo Civil e, por fim, em atenção ao princípio da sucumbência, condene o requerente a pagar as custas processuais e os honorários advocatícios, arbitrados conforme prudência deste juízo. 

    01.23. O MM. Juiz de Direito da 1ª Vara da Dívida Ativa Estadual da Capital, entendendo que a matéria em debate é de direito e de prova exclusivamente documental, razão pela qual, com fulcro no artigo 330, inciso I do Código de Processo Civil, decidiu pelo julgamento antecipado da lide. Do que não houve oposição. 

    01.24. O MM. Juiz de Direito da 1ª Vara da Dívida Ativa Estadual da Capital prolatou sentença, na qual julgou procedentes os Embargos de Terceiros em que é embargante Jorge do Nascimento Gomes e embargada a Fazenda Pública do Estado do Amazonas para afastar a constrição judicial incidente sobre o imóvel objeto da presente lide, nos termos da fundamentação do decisum. Deixou de condenar a fazenda em honorários advocatícios em face do princípio da causalidade. 

    01.25. Não havendo recurso voluntário, conforme Certidão de fls. 54 dos autos, subiram os autos em reexame necessário.  

    01.26. Os autos foram remetidos a este Egrégio Tribunal de Justiça em razão de reexame necessário e, por meio de distribuição por sorteio, vieram os autos à minha relatoria. 

    01.27. Oportunizada vista ao Graduado Órgão do Ministério Público este apenas informou que dexou de manifestar-se meritoriamente nos presentes autos, tendo em vista sua desnecessária intervenção. 

    01.28. Os autos, então, vieram-me conclusos. 

    01.29. É o relatório, passo a fundamentar a decisão.                            

    02. VOTO 

    02.01. Como se vê, do contido nos autos, o embargante adquiriu o imóvel em litígio em 21/12/1998, conforme se verifica da procuração junto ao 1º Cartório de Ofício de Notas, assinada pela senhora Raimunda Araújo Dias, entretanto, não regularizou, de imediato, o imóvel e, quando foi fazê-lo junto ao Cartório de Registro de imóveis do 3º Ofício descobriu uma constrição relativa ao processo nº 012.10.025639-5 da 2ª Vara Especializada da Dívida Estadual que resolveu no âmbito do Poder Judiciário. Após, nova tentativa de regularização do imóvel, deparou-se com nova constrição, a qual se insurge. 

    02.02. O caso em questão amolda-se ao que dispõe o art. 1.046, “caput” do Código de Processo Civil, in verbis

    “Quem, não sendo parte no processo, sofrer turbação ou esbulho na posse de seus bens por ato de apreensão judicial, em casos como o de penhora, depósito, arresto, seqüestro, alienação judicial, arrecadação, arrolamento, inventário, partilha, poderá requerer Ihe sejam manutenidos ou restituídos por meio de embargos. 

    02.03. Segundo a lição dos ilustres professores Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery os embargos de terceiros: 

    "Trata-se de ação de conhecimento constitutiva negativa, de procedimento especial sumário, cuja a finalidade é livrar o bem ou dinheiro de posse ou propriedade de terceiro da constrição judicial que lhe foi injustamente imposta em processo de que não faz parte. O embargante pretende ou obter a liberação (manutenção ou reintegração na pose), ou evitar a alienação de bem ou direito indevidamente conscrito ou ameaçado de o ser (...)" (in: Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante, 11ª ed, 2010, São Paulo: RT, p. 1267) 

    02.04. Na situação em questão verifico que o MM. Juiz de Direito andou bem quando julgou procedente os presentes Embargos de Terceiros, pois o embargante efetuou a compra do imóvel em 21 de dezembro de 1998, por meio de um contrato particular de Compra e Venda, entretanto, não efetuou o registro.  

    02.05. Ocorre que a ausência do registro da transferência do imóvel não impede a oposição à penhora constante nos autos da execução intentada contra o devedor, ainda que não haja a devida inscrição no Registro de Imóveis, mediante os embargos de terceiro, que são destinados à proteção da posse, constituindo a via adequada para buscar a pretensão de exclusão da penhora, não havendo exigência do registro para tanto. 

    02.06. Neste sentido, já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, na Súmula nº 84: 

    "É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda de compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro".

    02.07. Além disso, no que tange ao argumento de fraude à execução, também não deve ser levado em consideração, uma vez que incidente, desta forma, a aplicação da Súmula n° 375 do STJ, assentando que “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente.” 

    02.08. Em verdade, analisando os autos, verifica-se que o Embargante adquiriu o bem em questão no dia 21/12/1998, tendo sido a penhora efetivada somente em 10/11/2008, ou seja, quase 10 (dez) anos após a transmissão do domínio, não havendo se falar em fraude à execução, por patente ausência de má-fé. 

    02.09. Assim, à época da alienação não havia nenhuma penhora ou restrição judicial no registro do imóvel, presumindo-se adequado o negócio jurídico entabulado, não havendo falar em má-fé do terceiro adquirente, que só pode ser afastada se demonstrado que agiu em conluio com o devedor, o que inocorreu na espécie. 

    02.10. Nesse sentido, a fim de evitar tautologias, transcrevo a fundamentação do MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Especializada da Dívida Ativa Estadual da Capital, por comungar de seu entendimento: 

    "Os embargos de terceiro, sabemos, têm, em regra, como objetivo principal, afastar os efeitos dos atos processuais de expropriação sobre bens ou direito. 

    Mister esclarecer, primeiramente, que a ausência de registro no cartório competente não invalida o compromisso de compra e venda. Tal prática, como sabemos, é corriqueira em nosso País, uma vez que o imóvel é negociado sem a efetiva transferência, firmando-se a avença mediante o conhecido "contrato de compra e venda de  gaveta". 

    E é esse o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, vejamos: 

    Súmula 84 - É admissível a oposição de embargos de terceiro fundados em alegação de posse advinda do compromisso de compra e venda de imóvel, ainda que desprovido do registro. 

    Por outro lado, questão não menos relevante diz respeito à época em que o registro da penhora foi efetivado, uma vez que o Superior Tribunal de Justiça posicionou entendimento recente de que tanto o registro da constrição quanto a comprovação de má-fé do adquirente seriam condições essenciais para a ocorrência da fraude à execução, senão vejamos: 

    Súmula 375 - 0 reconhecimento da fraude de execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente. 

    Forçoso destacar que o posicionamento acima torna inócuo para incidência do instituto a época da inscrição em divida ativa ou da efetiva citação do executado. 

    Com efeito, infere-se que o Embargante adquiriu o imóvel objeto da presente lide em 21 de  dezembro de 1998 ao passo em que o registro da penhora efetivou-se em 10 de novembro de 2008. 

    Assim sendo, levando-se em consideração a época do registro da penhora, não há como prosperar a ocorrência de fraude à execução, visto que o registro ocorreu quase 10 (dez) anos depois da efetiva transmissão do domínio. 

    Maior sorte não cabe à Fazenda Pública no que concerne a má-fé do adquirente, pois sequer restou comprovado nos autos qualquer fato a repudiar a boa-fé do embargante, de sorte que também não pode prosperar a fraude sob esse fundamento. 

    Sopese-se, ainda, que a embargada lograria êxito em sua antítese se restasse comprovado que à época da avença o adquirente era sabedor do ajuizamento da execução fiscal ou, salvo melhor juízo, da inscrição do débito em dívida ativa, ou ainda da constrição recaída sobre o bem, o que também não restou provado nos autos. Nesses termos já se manifestou o STJ: 

    A alienação do bem na pendência de ação de execução fiscal, por si só, não caracteriza fraude à execução, mormente quando não registrada a penhora, nos termos do art. 7º, IV, da Lei 6.830/80, eis que, para a configuração da fraude, é necessária a demonstração do consilium fraudls, que pressupõe o conhecimento, pelo terceiro adquirente, da existência da demanda ou da constrição ao tempo do negócio" (STJ, 1ª T., Resp 122.550/SP, rel. Min. Milton Luiz Pereira, j. 12.03.61998, RT 755/220). (destaquei). 

    A seu turno, não se deve olvidar, ainda, que nenhuma restrição existia sobre o imóvel quando fora adquirido pelo embargante já que o termo de penhora só fora lavrado em 04 de novembro de 2008. 

    Diante das razões apontadas se mostra cristalina a boa-fé do adquirente, impondo-se, por conseqüência, o afastamento da constrição seja pela boa-fé ou pela ausência do registro da penhora à época da alienação. 

    Quanto a juntada de documentação após a fase saneadora, mister esclarecer que a verdade real não deve somente ser buscada no direito penal, mas em todos os ramos do direito, em sendo isso possível e desde que obedecidas as regras processuais. Nelson Nery Júnior colaciona em sua obra aresto que por analogia pode ser aplicado ao caso concreto (In Código de Processo Civil Comentado, 9ª edição, p. 556): 

    "Apresentação de documento posteriormente à propositura da ação. Uma vez obedecidos os princípios da lealdade processual e da estabilização da lide, a jurisprudência tem admitido a juntada de documentos sem as restrições do CPC 396 E 397 (2º TACivSP, Ag 288747, rei. Juiz Batista Lopes, j. 26.8.1991, BolAASP 1737, supl.; p. 5)" (destaquei) 

    "Juntada após a abertura da audiência de instrução e julgamento. Não se anula o processo pelo fato de documentos haverem sido juntos aos autos após aberta audiência e julgamento. A juntada de documentos pode se operar a qualquer tempo, "quando forem destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois de articulados ou para contrapô-los aos que forem produzidos nos autos" (RP 6/309)." 

    Diante disso, não se almeja nenhuma restrição impeditiva da juntada de prova documental com o escopo comprovar os fatos constitutivos do direito alegado, desde que seja oportunizado a outra parte o direito ao contraditório, motivo pelo qual rejeito o pedido da embargada nesse sentido.

    Ademais, deve-se ressaltar a rigorosa inobservância do embargante no que tange aos aspectos legais referentes à  transmissão do  imóvel. Tal  fato  levou a Fisco Estadual a requerer a constrição judicial sobre o imóvel objeto da presente ação. 

    Por essas razões, face ao principio da causalidade, deixo de impor à Fazenda Pública o ónus de sucumbência, especialmente no que diz respeito a honorários advocaticios e custas processuais. 

    Decisão. 

    Diante do exposto, julgo PROCEDENTES os Embargos de Terceiro em que é Embargante JORGE DO NASCIMENTO GOMES e Embargada FAZENDA PÚBLICA DO ESTADO DO AMAZONAS para afastar a constrição judicial incidente sobre o imóvel objeto da presente lide, nos termos da fundamentação. Sem honorários advocatícios em face do principio da causalidade. Custas pela Embargante na forma da lei, se devidas." 

    02.11. Ante o exposto, conheço o recurso de remessa necessária e, no mérito nego-lhe provimento, mantendo-se incólume a respeitável sentença proferida pelo MM. Juiz de Direito da 1ª Vara Especializada da Dívida Ativa Estadual da Capital. 

    02.12. É o voto. 

    Manaus/AM, 28 de fevereiro de 2011. 

    SABINO DA SILVA MARQUES, Desembargador Relator

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