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    Acórdão CSM/SP
    Fonte: 11.420-0/2
    Julgamento: 18/05/1990 | Aprovação: 02/07/1990 | Publicação: 01/08/1990
    Estado: São Paulo | Cidade: São Paulo (4º SRI)
    Relator: Onei Raphael
    Legislação: Art. 246 da Lei nº 6.015/73.

    Ementa:

    EMENTA NÃO OFICIAL: Contrato de Sociedade de Fato, com todas as regalias e obrigações de casamento. Título impróprio, não admitido o seu ingresso no registro imobiliário. A regra contida no art. 246 da Lei nº 6.015/73, aparentemente ampla, no tocante às inscrições de efeito preventivo prevalece o entendimento da taxatividade legal, descabendo deferir-se o registro (ou averbação) a títulos não previstos em Lei.

    Íntegra:

    APELAÇÃO CÍVEL N.º 11.420-0/2 – CAPITAL

    Excelentíssimo Senhor Desembargador Corregedor Geral:

    I. Trata-se de Apelação (fls. 45/49) interposta por ÉLCIO ROBERTO GAZ contra a R. sentença do MM. Juiz de Direito em exercício na Primeira Vara de Registros Públicos da Capital (fls. 41/43v.), que, julgando procedente Dúvida suscitada pelo Oficial do Quarto Cartório de Registro de Imóveis da Comarca, indeferiu o registro de instrumento particular apresentado pelo ora apelante.

    O documento em questão visa à constituição de uma sociedade de fato, “com todas as regalias e obrigações do casamento” (‘sic’, fls. 06), indicando-se como patrimônio comum, na proporção de 50% para cada qual dos contratantes, diversos bens, dentre eles dois imóveis objeto de registros aquisitivos feitos no 4º Cartório Predial da Comarca.

    A R. sentença firmou que, embora possível em tese “a inscrição quer de renúncia recognoscitiva, quer de remancipação, elas exigem título adequado, não se afastando a incidência do preceito do inciso II, art. 134, Cód. Civil”. Acolheu ainda outros motivos de recusa aduzidos pelo Serventuário, tais a menção no instrumento do valor dos imóveis, prova de quitação de despesas condominiais (Lei n.º 7.182/84), apresentação de recibo do IPTU do exercício corrente, prova de pagamento do imposto sobre transmissão “inter vivos” de bens imóveis, declaração de desvinculação do disponente para com o IAPAS.

    Nas razões de apelo, sustenta o interessado, em ordem à reforma integral do julgado, que: a) o instrumento apresentado contém declaração da titular inscrita no sentido de que o ora apelante é proprietário de 50% dos imóveis matriculados, embora registrados, por ora, tão só em nome dela; b) nos termos do artigo 135 do Código Civil, o instrumento particular, conquanto faça prova das obrigações convencionais de qualquer valor, precisa, para valer contra terceiros, ser “transcrito no registro público”; e, tratando-se de obrigação concernente a imóveis, o registro público competente é o imobiliário; c) o documento em questão consagra verdadeiro negócio fiduciário, tendo as aquisições feitas pela outra contratante omitido intencionalmente o nome do co-proprietário, ora apelante; d) com o ingresso do título no registro predial, não pretende o apelante figurar também como adquirente do imóvel, “porque sabe muito bem que isso somente é possível mediante a outorga de escritura pública por parte” da titular inscrita, “ou então a obtenção de sentença definitiva que produza os mesmos efeitos; mas seu registro, ou averbação, tornam-se necessários para que se assegure ao apelante a execução de título assim obtido, evitando-se ainda intervenções de terceiros de boa fé.

    Opinam os D. representantes do Ministério Público, em primeiro e em segundo graus, pelo improvimento do recurso (fls. 51/54, 57/59).

    É, em síntese o relatório.

    II. Opino.

    Apresentou-se a registro instrumento particular com a nominação de se destinar a “intenção de constituição de sociedade”, celebrado entre o ora apelante a Ângela Rizete de Vecchi. Consta da cláusula primeira que constituem os contratantes “uma sociedade de fato, com todas as regalias e obrigações do casamento”, consignando a cláusula segunda o trecho a seguir reproduzido textualmente:

    “Paralelamente à sociedade de fato, será constituída uma sociedade de direito, com fins comerciais e de prestação de serviços, fazendo parte desta sociedade o seguinte patrimônio, que embora figure unicamente em nome da varoa sempre foi de propriedade de ambos os contratantes, no equivalente a 50% (cinquenta por cento) para cada um, a saber:”

    Do patrimônio assim discriminado fazem parte os imóveis matriculados sob n.ºs 44.366 e 76.004 no 4º R.I.

    Embora tenha o apelante, como deixa claro na impugnação, aventado a possibilidade de semelhante título lograr acesso para gerar registro constitutivo, translativo do domínio em seu favor, descarta agora, nas razões de recurso, essa possibilidade, pretendendo tão só ato de registro em molde de averbação acautelatória, de efeito meramente publicitário.

    A r. sentença, da lavra do ilustre magistrado Dr. Ricardo Henry Marques Dip, verdadeiramente esgotou a matéria. Ateve-se à menção feita no instrumento, no trecho acima transcrito, no sentido de que a proprietária tabular reconhecia a constitularidade do apelante, para concluir: a) em primeiro lugar, que – em tese – admitir-se-ia retificação registral de fundo, “lato sensu”, destinada a repercutir alteração do próprio título causal, gerador do registo de aquisição da propriedade. Mas esse fato jurídico, a que denominou de “renúncia recognoscitiva”, demandava instrumentá-lo título hábil, a saber, escritura notarial ou sentença proferida em feito jurisdicional, requisito aqui ausente; b) do mesmo modo, a remancipação (ato pelo qual, no negócio fiduciário, o fiduciário, aquele a quem foi o bem transmitido aparentemente sem encargo, retransmite o mesmo bem ao fiduciante) aventada pelo suscitado, além de também reclamar título hábil nos mesmos termos indicados para a renúncia, seria incompatível com a alienação do bem a terceiro.

    Na verdade, quer parecer que; à vista do teor da manifestação de vontade das partes, no instrumento apresentado, sequer se faria imperiosa, para o deslinde da controvérsia, a incursão efetuada (aliás, com a excelência de fundamentos a que já nos habituou o eminente magistrado sentenciante) pelos dois aludidos institutos.

    O que convencionaram as partes foi que os imóveis integrariam o patrimônio de futura sociedade de direito que iriam constituir. Inegável que a titular inscrita (Ângela) reconhece a contitularidade do apelante sobre aquele patrimônio, mas não é esse o efeito jurídico colimado pelas partes no ajuste, quer se cogite de renúncia recognoscitiva, quer de remancipação. Como quer que seja, inexiste título formal idôneo a instrumentar mutação jurídico-registral, seja no sentido de se admitir alteração subjetiva com efeito pretérito do título causal pelo qual foi o imóvel adquirido por Ângela, seja no sentido de se deferir transmissão, por “remancipatio”, de bem entregue em negócio fiduciário.

    De outra parte, os efeitos das obrigações convencionais perante terceiros (art. 135 do C. Civil) só são passíveis de obtenção mediante o registro imobiliário nos casos em que a lei considere idônea a obrigação, por sua natureza, a merecer a publicidade constitutiva própria daquele registro. Ou, como salientou a R. sentença: “a eficácia específica da publicidade perseguida é real, por força da legislação. Se se almeja limitar a repercussão do contrato no nível obrigacional, o registro deve ser exatamente evitado”. Quer dizer: se o instrumento só é idôneo a gerar efeitos obrigacionais, e não reais, os efeitos extensíveis a terceiros pela “transcrição no registro público” serão da mesma natureza obrigacional, e não de natureza real.

    E, embora compreensível o escopo declinado pelo suscitado nas razões de apelo, também não se mostra viável a inscrição de efeito preventivo, ou meramente declaratório que busca realizar.

    Apesar da senda aparentemente ampla contemplada no artigo 246 da Lei de Registros Públicos, admitindo sejam alvo de averbação na matrícula, além daquelas previstas no art. 167, II, do mesmo diploma, “as subrogações e outras ocorrências que, por qualquer modo, alterem o registro”, é bem de ver que, no tocante às inscrições de efeito preventivo, a regra é a da taxatividade legal, descabendo deferir-se registro (ou averbação) a títulos dessa natureza não previstos em lei. O legislador cuidou de elencar expressamente os atos registráveis tendentes – no dizer de Afrânio de Carvalho – a exercer “uma função de garantia do direito e” prevenir “terceiros do risco de fazer negócio com o imóvel sobre o qual recai o direito garantido” (“Registro de Imóveis”, Forense, 1982, 3ª ed., pág. 176); assim, exemplificativamente, as “penhoras, arrestos seqüestros de imóveis” (Lei n. 6.015/73, art. 167, I, 5), as “citações de ações reais ou pessoais reipersecutórias, relativas a imóveis” (art. 167, I, 21), bem como as “decisões, recursos e seus efeitos, que tenham por objeto atos ou títulos registrados ou averbados” (art. 167, II, 12). A valoração acerca da conveniência de admitir título com efeito de publicidade acautelatória é tão somente do legislador, e estender essa faculdade ao intérprete ou ao aplicador configuraria risco de se deferir publicização equívoca. Demais disso, as denominadas inscrições preventivas são, sempre, provisórias, “tendendo a transformar-se em definitivas ou a serem canceladas” (Afrânio de Carvalho, op. loc. cit.). E a pretendida menção na matrícula, ao fato de que a proprietária reconhece a existência de outro co-titular, sobre não ser hábil a constituir direito em favor desse co-titular (o que o apelante admite), poderia perenizar-se, escapando ao caráter de transitoriedade, sem que jamais essa aventada contitularidade viesse a se concretizar “ex tabula”, de maneira a embaraçar negociações formalmente legítimas sem título causal acautelatório contemplado em lei.

    Ao que se depreende, o caminho que se ofereceria ao apelante – “para assegurar o eventual exercício futuro de ação judicial” – seria, caso opte pelo ajuizamento de demanda, valer-se da averbação prevista no art. 167, II, n.º 12, da L.R.P.

    Por derradeiro, o documento copiado a fls. 34/35 não foi apreciado pela R. decisão exatamente porque não fora apresentado ao registrador, não constituindo ele o título sobre o qual se controverte na presente dúvida. Ainda que o fosse, todavia, não teria o condão de alterar a solução outorgada ao pedido: trata-se de declaração unilateral que não pode, por desconformidade à forma prevista em lei, servir à constituição de direito real, e, por ausência de previsão legal, servir à feitura de registro de finalidade preventiva.

    E, caso de pudesse fazer abstração dos impedimentos assim declinados, as demais exigências formais anotadas pelo registrador, e constantes da suscitação (fls. 2/3, itens “1” a “6”) também são de inequívoca procedência.

    III. O parecer, pelas razões expostas, é no sentido do improvimento da presente Apelação, mantida a R. sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos.

    À superior consideração de Vossa Excelência.

    São Paulo, 18 de maio de 1990.

    (a) AROLDO MENDES VIOTTI, Juiz Auxiliar da Corregedoria

    A C Ó R D Ã O

    Vistos, relatados e discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL N.º 11.420-0/2, da Comarca da CAPITAL, em que é apelante ELCIO ROBERTO GAZ, apelado o OFICIAL SUBSTITUTO DO 4º CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS e interessado DE VECCHI – CIA LTDA (representada p/sua Sócia Ângela Rizete Vecchi).

    A C O R D A M os Desembargadores do Conselho Superior da Magistratura, por votação unânime, negar provimento a apelação.

    Trata-se de pedido formulado por ELCIO ROBERTO FAZ, oferecido à consideração do Oficial Substituto do 4º Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo, relativamente a um instrumento particular de intenção de constituição de sociedade.

    No entanto, o Sr. Oficial entendeu que o ato jurídico pretendido não figura no elenco constante das atribuições de Registro de Imóveis, tal como está mencionado no art. 167 da Lei dos Registros Públicos, e com o intuito de esclarecer o assunto, em razão também das demais observações constantes de peças de fls. 2/3, o serventuário entendeu que “por se tratar de ato translativo de domínio, é de sua substância a escritura pública, ‘ex vi’ do que dispõe o art. 134, II, do Código Civil Brasileiro” (cf. fls. 3).

    O Dr. Juiz de Direito, pela sentença de fls. 41/43, julgou procedente a dúvida, com isso não se conformando o suscitado, que pleiteia a reforma da decisão recorrida para ser julgada improcedente a dúvida, entendendo ainda que o documento apresentado preenche a todos os requisitos legais para o registro.

    Nesta instância, o douto Procurador de Justiça entende que o recurso não merece provimento, assim também se manifestando o Dr. Juiz de Direito Auxiliar da Corregedoria, às fls. 62/69.

    É o relatório.

    O caso em tela diz respeito a um documento que objetiva a constituição de uma sociedade de fato, tal como está escrito às fls. 6, “com todas as regalias e obrigações do casamento, somente não se efetivando na forma legal, face a existência de impedimento legal”.

    Em aludida peça está indicado como patrimônio comum, na proporção 50% para cada um dos contratantes, diversos bens, sobrelevando-se dentre eles dois imóveis objeto de registros aquisitivos feitos no 4º Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de São Paulo.

    A r. sentença recorrida deixou expresso que “embora possível em tese ‘a inscrição quer de renúncia recognoscitiva, quer de emancipação, elas exigem título adequado, não se afastando a incidência do preceito do inciso II, art. 134, Cód. Civil’. Acolheu ainda outros motivos de recusa aduzidos pelo Serventuário, tais a menção no instrumento do valor dos imóveis, prova de quitação de despesas condominiais (Lei n.º 7.182/84), apresentação de recibo do IPTU do exercício corrente, prova de pagamento do imposto sobre transmissão ‘inter vivos’ de bens imóveis, declaração de desvinculação do disponente para o IAPAS” (cf. fls. 62).

    Convém ressaltar, como faz o Dr. Juiz de Direito Auxiliar, “Embora tenha o apelante, como deixa claro na impugnação, aventada a possibilidade de semelhante título lograr acesso para gerar registro constitutivo, translativo do domínio em seu favor, descarta agora, nas razões do recurso, essa possibilidade, pretendendo tão só ato de registro em molde de averbação acautelatória, de efeito meramente publicitário” (cf. fls. 64/65).

    Com relação a isso, a sentença apelada bem apreciou a espécie, podendo-se dizer, na esteira daquilo afirmado pelo Dr. Juiz de Direito Auxiliar, que “no instrumento apresentado, sequer se faria imperiosa, para o deslinde da controvérsia, a incursão efetuada (aliás, com a excelência de fundamentos a que já nos habituou o eminente magistrado sentenciante) pelos dois aludidos institutos” (cf. fls. 65/66).

    No mais acolhendo-se o lúcido parecer de fls. 62/69, nega-se provimento ao recurso.

    Custas na forma da lei.

    Participaram do julgamento, com votos vencedores, os Desembargadores ANICETO LOPES ALIENDE, Presidente do Tribunal de Justiça e ODYR JOSÉ PINTO PORTO, Vice-Presidente do Tribunal de Justiça.

    São Paulo, 02 de julho de 1990.

    (a) ONEI RAPHAEL, Corregedor Geral da Justiça e Relator.

    (D.O.E. de 01.08.1990)

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