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    Acórdão STJ
    Fonte: 1.533.179
    Julgamento: 08/09/2015 | Aprovação: Não disponível | Publicação: 23/09/2015
    Estado: Rio Grande do Sul | Cidade:
    Relator: Marco Aurélio Bellizze
    Legislação: Art. 535 do CPC e arts. 1.639, § 2º, 2.035 e 2.039 do Código Civil de 2002.

    Ementa:

    DIREITO DE FAMÍLIA. RECURSO ESPECIAL. ALTERAÇÃO DE REGIME DE BENS DO CASAMENTO DE COMUNHÃO PARCIAL PARA SEPARAÇÃO TOTAL. OMISSÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INEXISTÊNCIA. PARTILHA DOS BENS ADQUIRIDOS NO REGIME ANTERIOR. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. Consoante dispõe o art. 535 do Código de Processo Civil, destinam-se os embargos de declaração a expungir do julgado eventuais omissão, obscuridade ou contradição, não se caracterizando via própria ao rejulgamento da causa. 2. É possível a alteração de regime de bens de casamento celebrado sob a égide do CC de 1916, em consonância com a interpretação conjugada dos arts. 1.639, § 2º, 2.035 e 2.039 do Código atual, desde que respeitados os efeitos do ato jurídico perfeito do regime originário. 3. No caso, diante de manifestação expressa dos cônjuges, não há óbice legal que os impeça de partilhar os bens adquiridos no regime anterior, de comunhão parcial, na hipótese de mudança para separação total, desde que não acarrete prejuízo para eles próprios e resguardado o direito de terceiros. Reconhecimento da eficácia ex nunc da alteração do regime de bens que não se mostra incompatível com essa solução. 4. Recurso especial provido.

    Íntegra:

    SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.533.179 - RS (2013/0367205-7)

    RELATOR: MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE

    RECORRENTE: N M O P

    ADVOGADO: FELLIPE BERNARDES DA SILVA

    RECORRENTE: L F DE A P

    ADVOGADOS: FELLIPE BERNARDES DA SILVA E OUTRO(S) / FELIPE PROVENZI DIAS

    EMENTA: DIREITO DE FAMÍLIA. RECURSO ESPECIAL. ALTERAÇÃO DE REGIME DE BENS DO CASAMENTO DE COMUNHÃO PARCIAL PARA SEPARAÇÃO TOTAL. OMISSÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INEXISTÊNCIA. PARTILHA DOS BENS ADQUIRIDOS NO REGIME ANTERIOR. POSSIBILIDADE. RECURSO PROVIDO. 

    1. Consoante dispõe o art. 535 do Código de Processo Civil, destinam-se os embargos de declaração a expungir do julgado eventuais omissão, obscuridade ou contradição, não se caracterizando via própria ao rejulgamento da causa.

    2. É possível a alteração de regime de bens de casamento celebrado sob a égide do CC de 1916, em consonância com a interpretação conjugada dos arts. 1.639, § 2º, 2.035 e 2.039 do Código atual, desde que respeitados os efeitos do ato jurídico perfeito do regime originário. 

    3. No caso, diante de manifestação expressa dos cônjuges, não há óbice legal que os impeça de partilhar os bens adquiridos no regime anterior, de comunhão parcial, na hipótese de mudança para separação total, desde que não acarrete prejuízo para eles próprios e resguardado o direito de terceiros. Reconhecimento da eficácia ex nunc da alteração do regime de bens que não se mostra incompatível com essa solução.

    4. Recurso especial provido.

    ACÓRDÃO

    Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

    Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília, 08 de setembro de 2015 (data do julgamento).

    MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Relator

    RELATÓRIO

    O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE:

    Trata-se de recurso especial interposto por N M O P e L F DE O P, com base no art. 105, III, a, da CF, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, assim ementado (e-STJ, fl. 109):

    ALTERAÇÃO DE REGIME DE BENS DO CASAMENTO. POSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO.

    1. A alteração do regime de bens é possível juridicamente, consoante estabelece o art. 1.639, § 2º, do CCB e as razões postas pelas partes evidenciam a conveniência para eles, constituindo o pedido motivado de que trata a lei, devendo ser apreciado pela autoridade judicial.

    2. A alteração do regime de bens pode ser promovida a qualquer tempo, ficando sempre ressalvados direitos de terceiros, motivo pelo qual inexiste qualquer obstáculo legal à alteração de regime de bens de casamentos anteriores à vigência do Código Civil de 2002. Inteligência do artigo 2.039, do CCB.

    3. Para que os bens adquiridos na constância do casamento sejam partilhados, é necessária prévia dissolução da sociedade conjugal. Recurso desprovido.

    No caso em exame, os recorrentes ingressaram ação objetivando a alteração do regime de bens, relatando que se casaram em 23 de dezembro de 1994, pelo regime da comunhão parcial. Argumentaram que o cônjuge varão é empresário e está exposto aos riscos do empreendimento, ao passo que sua esposa trabalha na Fundação Estadual de Planejamento Metropolitano e Regional, na qualidade de técnica, e na Universidade do Vale do Rio dos Sinos, como professora, possuindo, portanto, estabilidade financeira.

    Afirmaram que, em decorrência do estilo de vida de ambos, optaram por mudar o regime do casamento para a separação de bens, com a consequente partilha do patrimônio amealhado, operando-se efeitos ex nunc em relação a terceiros. 

    Em primeiro grau, o pedido foi julgado parcialmente procedente, à consideração de ser possível a alteração do regime de comunhão parcial para o da separação de bens. Contudo, asseverou o magistrado "que descabe cogitar de partilha de bens de pessoas que ainda se encontram casadas, medida esta que poderia causar prejuízos a terceiros, cuja alteração do regime se dá com efeitos ex nunc, ou seja, opera seus efeitos somente sobre bens futuros, não retroagindo aos já adquiridos" (e-STJ, fl. 79), entendimento que foi mantido pelo Tribunal estadual, nos termos da ementa acima transcrita.

    Houve a oposição de embargos de declaração (e-STJ, fls. 120-123) pelos autores, que foram rejeitados (e-STJ, fls. 125-130).

    Nas razões do apelo excepcional, os recorrentes alegaram violação dos arts. 535, II, do CPC, 1.639, § 2º, e 1.687 do CC de 2002, sustentando a possibilidade de partilha dos bens mesmo diante da alteração do regime anterior na constância do casamento, independentemente da dissolução prévia da sociedade conjugal.

    Sem que fossem oferecidas contrarrazões (e-STJ, fl. 153), o recurso teve o seu seguimento negado (e-STJ, fls. 156-160), ensejando a interposição do AREsp n. 424.087/RS, ao qual dei provimento (e-STJ, fls. 207-208), determinando sua conversão em recurso especial.

    Instado, o Ministério Público Federal opinou pelo provimento do recurso (e-STJ, fls. 199-204).

    É o relatório.

    VOTO

    O SENHOR MINISTRO MARCO AURÉLIO BELLIZZE (RELATOR):

    Cuida-se, na origem, de ação para alteração do regime de bens do casamento ajuizada por N M O P e L F DE O P, os quais optaram por alterar o regime originário de comunhão parcial para separação de bens, com consequente realização de partilha.

    Embora rejeitados os embargos de declaração, verifico que a matéria controvertida foi devidamente enfrentada pelo Colegiado de origem, que sobre ela emitiu pronunciamento de forma fundamentada, com enfoque suficiente a autorizar o conhecimento do recurso especial, não havendo que se falar, portanto, em ofensa ao art. 535, II, do CPC.

    Quanto ao tema de fundo, cumpre assinalar que a legislação civil vigente estipula quatro diferentes tipos de regime de bens para o casamento, a saber: a) comunhão parcial (arts. 1.658 a 1.666); b) comunhão universal (arts. 1.667 a 1.671); c) participação final nos aquestros (arts. 1.672 a 1.686); e d) separação de bens (arts. 1.687 e 1.688).

    Desse modo, à exceção das hipóteses descritas no art. 1.641 do CC, nas quais o legislador impõe o regime da separação de bens, poderão os nubentes escolher com ampla liberdade um dos tipos previstos, ou, ainda, criar outro regime não previsto na lei, desde que não acarrete prejuízo para nenhum deles ou para terceiros.

    Essa modificação também poderá ocorrer posteriormente à celebração do casamento, desde que atendidas as seguintes condições estabelecidas no § 2º do art. 1.639 do CC: i) que o pedido seja formulado por ambos os cônjuges; b) que haja motivação relevante; c) por meio de autorização judicial. 

    Há que se destacar, outrossim, a possibilidade de alteração do regime de bens dos casamentos celebrados sob a égide do CC de 1916, desde que respeitados os efeitos do ato jurídico perfeito do regime originário, expressamente ressalvados pelos arts. 2.035 e 2.039 do Código atual, conforme se infere dos seguintes precedentes:

    RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. REGIME MATRIMONIAL DE BENS. MODIFICAÇÃO. CASAMENTO CELEBRADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS DO CÓDIGO CIVIL DE 2002. CONJUGAÇÃO DO ART.1.639, § 2º, COM O ART. 2.039, AMBOS DO NOVEL DIPLOMA. CABIMENTO EM TESE DA ALTERAÇÃO DE REGIME DE BENS. INADMISSIBILIDADE QUE JÁ RESTOU AFASTADA. PRECEDENTE JURISPRUDENCIAL.  ALTERAÇÃO SUBORDINADA À PRESENÇA DOS DEMAIS REQUISITOS CONSTANTES DO ART. 1.639, § 2º, DO CC/2002. NECESSIDADE DE REMESSA DOS AUTOS ÀS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS APRECIAÇÃO DO PEDIDO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO PARA, ADMITIDA A MUDANÇA DE REGIME, COM A REMESSA DOS AUTOS À INSTÂNCIA DE ORIGEM.

    (REsp n. 868.404/SC, Relator o Ministro Hélio Quaglia, Quarta Turma, DJ de 6/8/2007);

    Direito civil. Família. Casamento celebrado sob a égide do CC/16. Alteração do regime de bens. Possibilidade.

    - A interpretação conjugada dos arts. 1.639, § 2º, 2.035 e 2.039, do CC/02, admite a alteração do regime de bens adotado por ocasião do matrimônio, desde que ressalvados os direitos de terceiros e apuradas as razões invocadas pelos cônjuges para tal pedido.

    - Assim, se o Tribunal Estadual analisou os requisitos autorizadores da alteração do regime de bens e concluiu pela sua viabilidade, tendo os cônjuges invocado como razões da mudança a cessação da incapacidade civil interligada à causa suspensiva da celebração do casamento a exigir a adoção do regime de separação obrigatória, além da necessária ressalva quanto a direitos de terceiros, a alteração para o regime de comunhão parcial é permitida.

    - Por elementar questão de razoabilidade e justiça, o desaparecimento da causa suspensiva durante o casamento e a ausência de qualquer prejuízo ao cônjuge ou a terceiro, permite a alteração do regime de bens, antes obrigatório, para o eleito pelo casal, notadamente porque cessada a causa que exigia regime específico.

    - Os fatos anteriores e os efeitos pretéritos do regime anterior permanecem sob a regência da lei antiga. Os fatos posteriores, todavia, serão regulados pelo CC/02, isto é, a partir da alteração do regime de bens, passa o CC/02 a reger a nova relação do casal.

    - Por isso, não há se falar em retroatividade da lei, vedada pelo art. 5º, inc. XXXVI, da CF/88, e sim em aplicação de norma geral com efeitos imediatos.

    Recurso especial não conhecido.

    (REsp n. 821.807/PR, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ de 13/11/2006);

    CIVIL - REGIME MATRIMONIAL DE BENS - ALTERAÇÃO JUDICIAL - CASAMENTO OCORRIDO SOB A ÉGIDE DO CC/1916 (LEI Nº 3.071) - POSSIBILIDADE - ART. 2.039 DO CC/2002 (LEI Nº 10.406) - CORRENTES DOUTRINÁRIAS - ART. 1.639, § 2º, C/C ART. 2.035 DO CC/2002 - NORMA GERAL DE APLICAÇÃO IMEDIATA.

    1 - Apresenta-se razoável, in casu, não considerar o art. 2.039 do CC/2002 como óbice à aplicação de norma geral, constante do art. 1.639, § 2º, do CC/2002, concernente à alteração incidental de regime de bens nos casamentos ocorridos sob a égide do CC/1916, desde que ressalvados os direitos de terceiros e apuradas as razões invocadas pelos cônjuges para tal pedido, não havendo que se falar em retroatividade legal, vedada nos termos do art. 5º, XXXVI, da CF/88, mas, ao revés, nos termos do art. 2.035 do CC/2002, em aplicação de norma geral com efeitos imediatos.

    2 - Recurso conhecido e provido pela alínea "a" para, admitindo-se a possibilidade de alteração do regime de bens adotado por ocasião de matrimônio realizado sob o pálio do CC/1916, determinar o retorno dos autos às instâncias ordinárias a fim de que procedam à análise do pedido, nos termos do art. 1.639, § 2º, do CC/2002.

    (REsp n. 730.546/MG, Relator o Ministro Jorge Scartezzini, Quarta Turma, DJ de 3/10/2005).

    Por sua vez, a questão da fixação do termo inicial dos efeitos da alteração do regime de bens ainda suscita discussão no campo doutrinário e jurisprudencial: retroação à data do casamento (eficácia ex tunc) ou a partir da data do trânsito em julgado da decisão judicial que o alterou (eficácia ex nunc).  

    Para aqueles que defendem a eficácia ex tunc, o principal argumento é de que o regime de bens do casamento deve ser único ao longo de toda a relação conjugal. Entre eles, destaca-se a abalizada opinião de Luiz Felipe Brasil Santos, entre outros.

    Já para os simpatizantes da segunda corrente, eficácia ex nunc, os bens adquiridos antes da prolação da decisão judicial que alterar o regime de bens remanescerão sob os ditames do pacto anteriormente estipulado, incidindo o novo regime tão somente sobre os bens adquiridos e os negócios jurídicos contratados após a decisão que autorizar, nos termos do referido art. 1.639, § 2º, do CC de 2002, a modificação do regime de bens, ou seja, a mudança valerá apenas para o futuro.

    Filiam-se a esse entendimento juristas como Nelson Nery Junior e Milton Paulo de Carvalho Filho.

    Outros ainda defendem que essa análise deve ser feita em cada caso concreto. Sobre o tema, orienta Nelson Rosenvald:

    Ainda sobre a sentença, há grande dificuldade em apontar se os seus efeitos serão retroativos ou não-retroativos. Com efeito, imaginando se tratar de modificação de um regime de comunhão para uma separação absoluta, é de se lhe reconhecer efeitos ex nunc, não retroativos, sendo obrigatória a realização de partilha. De outro modo, hipoteticamente admitida a mudança de um regime separatório para a comunhão universal, naturalmente, vislumbra-se uma eficácia retroativa, ex tunc. Assim, entendemos que dependerá do caso concreto a retroação ou não dos efeitos da sentença. De qualquer modo, é certa a possibilidade dos interessados requererem, expressamente, ao juiz que estabeleça a retroação da eficácia do comando sentencial, optando pelos efeitos ex tunc. Outrossim, no que tange à esfera jurídica de interesses de terceiros, a eficácia, será, invariavelmente, ex nunc, não retroativa.

    (Direito das Famílias. Rio de Janeiro. Ed. Lumen Iures, 2008, p. 228)   

    No âmbito desta Corte, tem prevalecido a orientação de que os efeitos da decisão que homologa a alteração do regime de bens operam-se a partir de então, ex nunc, ficando regidos os fatos anteriores e os efeitos pretéritos pelo regime de bens  então vigente.

    Confiram-se:

    RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DE FAMÍLIA. DISSOLUÇÃO DO CASAMENTO. ALTERAÇÃO DO REGIME DE BENS. TERMO INICIAL DOS SEUS EFEITOS. EX NUNC. ALIMENTOS. RAZOABILIDADE. BINÔMIO NECESSIDADE E POSSIBILIDADE. CONCLUSÕES ALCANÇADAS PELA CORTE DE ORIGEM. IMPOSSIBILIDADE DE REVISÃO NA VIA ELEITA. SÚMULA 7/STJ.

    1 - Separação judicial de casal que, após período de união estável, casou-se, em 1997, pelo regime da separação de bens, procedendo a sua alteração para o regime da comunhão parcial em 2007 e separando-se definitivamente em 2008.

    2 - Controvérsia em torno do termo inicial dos efeitos da alteração do regime de bens do casamento ("ex nunc" ou "ex tunc") e do valor dos alimentos.

    3 - Reconhecimento da eficácia "ex nunc" da alteração do regime de bens, tendo por termo inicial a data do trânsito em julgado da decisão judicial que o modificou. Interpretação do art. 1639, § 2º, do CC/2002.

    4 - Razoabilidade do valor fixado a título de alimentos, atendendo aos critérios legais (necessidade da alimentanda e possibilidade do alimentante). Impossibilidade de revisão em sede de recurso especial. Vedação da Súmula 07/STJ.

    5 - Precedentes jurisprudenciais do STJ.

    6 - RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

    (REsp n. 1.300.036/MT, Relator o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, DJe de 20/5/2014);

    Direito civil. Família. Casamento celebrado sob a égide do CC/16. Alteração do regime de bens. Possibilidade.

    - A interpretação conjugada dos arts. 1.639, § 2º, 2.035 e 2.039, do CC/02, admite a alteração do regime de bens adotado por ocasião do matrimônio, desde que ressalvados os direitos de terceiros e apuradas as razões invocadas pelos cônjuges para tal pedido.

    - Assim, se o Tribunal Estadual analisou os requisitos autorizadores da alteração do regime de bens e concluiu pela sua viabilidade, tendo os cônjuges invocado como razões da mudança a cessação da incapacidade civil interligada à causa suspensiva da celebração do casamento a exigir a adoção do regime de separação obrigatória, além da necessária ressalva quanto a direitos de terceiros, a alteração para o regime de comunhão parcial é permitida.

    - Por elementar questão de razoabilidade e justiça, o desaparecimento da causa suspensiva durante o casamento e a ausência de qualquer prejuízo ao cônjuge ou a terceiro, permite a alteração do regime de bens, antes obrigatório, para o eleito pelo casal, notadamente porque cessada a causa que exigia regime específico.

    - Os fatos anteriores e os efeitos pretéritos do regime anterior permanecem sob a regência da lei antiga. Os fatos posteriores, todavia, serão regulados pelo CC/02, isto é, a partir da alteração do regime de bens, passa o CC/02 a reger a nova relação do casal.

    - Por isso, não há se falar em retroatividade da lei, vedada pelo art. 5º, inc. XXXVI, da CF/88, e sim em aplicação de norma geral com efeitos imediatos.

    Recurso especial não conhecido.

    (REsp n. 821.807/PR, Relatora a Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, DJ de 13/11/2006);

    CIVIL - REGIME MATRIMONIAL DE BENS - ALTERAÇÃO JUDICIAL - CASAMENTO OCORRIDO SOB A ÉGIDE DO CC/1916 (LEI Nº 3.071) - POSSIBILIDADE - ART. 2.039 DO CC/2002 (LEI Nº 10.406) - CORRENTES DOUTRINÁRIAS - ART. 1.639, § 2º, C/C ART. 2.035 DO CC/2002 - NORMA GERAL DE APLICAÇÃO IMEDIATA.

    1 - Apresenta-se razoável, in casu, não considerar o art. 2.039 do CC/2002 como óbice à aplicação de norma geral, constante do art. 1.639, § 2º, do CC/2002, concernente à alteração incidental de regime de bens nos casamentos ocorridos sob a égide do CC/1916, desde que ressalvados os direitos de terceiros e apuradas as razões invocadas pelos cônjuges para tal pedido, não havendo que se falar em retroatividade legal, vedada nos termos do art. 5º, XXXVI, da CF/88, mas, ao revés, nos termos do art. 2.035 do CC/2002, em aplicação de norma geral com efeitos imediatos.

    2 - Recurso conhecido e provido pela alínea "a" para, admitindo-se a possibilidade de alteração do regime de bens adotado por ocasião de matrimônio realizado sob o pálio do CC/1916, determinar o retorno dos autos às instâncias ordinárias a fim de que procedam à análise do pedido, nos termos do art. 1.639, § 2º, do CC/2002.

    (REsp n. 730.546/MG, Relator o Ministro Jorge Scartezzini, Quarta Turma, DJ de 3/10/2005).

    Podemos concluir, desse modo, que consoante a linha interpretativa seguida por este Tribunal, a alteração do regime de bens do casamento, em regra,  apenas atinge os atos posteriores ao trânsito em julgado da sentença, preservando-se, pois, a situação anterior originada pelo pacto antenupcial (ex nunc), bem como os interesses de terceiros e dos próprios cônjuges. 

    No caso concreto, o juízo monocrático e o Tribunal de origem autorizaram a alteração do regime de bens escolhido à época do casamento, qual seja, o da comunhão parcial para o da separação total, entretanto, rejeitaram o pedido de partilha, ao entendimento de que esta só poderia ser realizada após a dissolução da sociedade conjugal.

    É o que se extrai do seguinte excerto do aresto hostilizado (e-STJ, fl. 114):

    (...), mostra-se inviável o pleito de partilha dos bens de pessoas casadas, pois tal medida somente é cabível em caso de dissolução da sociedade conjugal. Ou seja, a alteração do regime de bens somente pode ter efeito ex nunc, sendo descabida a pretendida retroatividade, pois implica perda ou aquisição de direito relativamente a bens imóveis, gerando uma situação de insegurança jurídica para o casal e para terceiros.

    Todavia, a conclusão acima não deve ser prestigiada.

    Existe hoje um novo modelo de regras para o casamento, em que a autonomia da vontade dos nubentes, quanto aos seus bens, é percebida em sua mais ampla acepção, e a única ressalva apontada na legislação diz respeito a terceiros, ao dispor o § 2º do art. 1.639 do CC de 2002, de forma categórica, que os direitos destes  não serão prejudicados pela alteração do regime de bens.

    Como a própria lei resguarda os direitos de terceiros, não há porque o julgador criar obstáculos à livre decisão do casal sobre o que melhor atenda a seus interesses, razão pela qual, no caso, não vislumbro nenhum óbice legal que impeça a partilha dos bens adquiridos sob o regime anterior, de comunhão parcial, diante de sua mudança para separação total, notadamente quando o pedido decorre da expressa manifestação de vontade dos cônjuges.   

    A solução da questão, ao contrário do que assinalou o acórdão recorrido, não importa em perda ou aquisição de direito relativamente a bens imóveis, uma vez que na mudança do regime de comunhão parcial para separação total, os bens já pertenciam a ambos os peticionantes.

    Também não se discute que a alteração do regime de bens, na espécie, produz efeitos ex nunc, isso é indubitável. Ocorre que a partilha dos bens não é incompatível com essa natureza eficacial, apenas deve ser observado que a justa solução da controvérsia não pode prescindir da compatibilização do desejo dos autores, ora recorrentes, com o sistema normativo vigente, no qual não existe ressalva à pretensão ora deduzida, de realização da partilha dos bens comuns do casal como consequência da alteração do regime, independentemente da existência de separação judicial.    

    Desde que a alteração não acarrete prejuízo para terceiros ou para os próprios cônjuges, repise-se, não há restrição legal à partilha concomitante dos bens, o que não seria de se admitir se a hipótese fosse inversa, ou seja, se o novo regime adotado viesse a estipular uma comunicação menos restrita de bens em relação ao pacto anterior, como exemplo, se a mudança fosse do regime de separação total para comunhão parcial. 

    A meu sentir, na hipótese, a negativa de individualização do patrimônio do casal, por meio da partilha, se contrapõe à própria autorização de mudança do regime de bens da comunhão parcial para a separação total, daí que não seria razoável impor aos requerentes a dissolução da sociedade conjugal, assim como expôs o acórdão recorrido, como única forma de se obter esse intento, sob pena de induzi-los, inclusive, à eventual prática de conduta fraudulenta.  

    Aliás, a separação dos bens com a consequente individualização do patrimônio do casal é medida consentânea com o próprio regime da separação total por eles voluntariamente adotado, uma vez que, em consonância com o art. 1.687 do Código vigente, "estipulada a separação de bens, estes permanecerão sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que os poderá livremente alienar ou gravar de ônus real."    

    Desse modo, assim como destacado no parecer ministerial, a solução ora proposta, “ao mesmo tempo que preservará a legítima motivação da mulher em resguardar a aquisição de bens oriunda de sua atividade, resguardando seu patrimônio de responder por dívidas advindas da atividade do esposo, preservará também a garantia dos credores sobre os bens que o casal tiver até a data da alteração do regime” (e-STJ, fl. 203).  

    É de se ter presente, outrossim, que as exceções à interpretação da lei devem ser sempre expressas e não podem decorrer de mera presunção.

    Pelo exposto, dou provimento ao recurso especial para julgar integralmente procedente o pedido inicial, a fim de permitir que, após o trânsito em julgado da sentença que autorizou a alteração do regime de bens do casamento de comunhão parcial para separação total, possam os autores, ora recorrentes, realizar a partilha dos bens adquiridos na constância do regime anterior, resguardados os interesses de terceiros.

    É o voto. 

    CERTIDÃO DE JULGAMENTO

    TERCEIRA TURMA

    Número Registro: 2013/0367205-7   

    PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.533.179/RS

    Números Origem:  00111200189060  00234517520128210001  11200189060  234517520128210001  4190086820128217000  542684320138217000  5450644920128217000  70051124454  7005124154  70053296430  70054608211

    PAUTA: 08/09/2015 – JULGADO: 08/09/2015

    SEGREDO DE JUSTIÇA

    Relator: Exmo. Sr. Ministro  MARCO AURÉLIO BELLIZZE

    Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA 

    Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. BRASILINO PEREIRA DOS SANTOS

    Secretária: Bela. MARIA AUXILIADORA RAMALHO DA ROCHA

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE: N M O P

    ADVOGADO: FELLIPE BERNARDES DA SILVA

    RECORRENTE: L F DE A P

    ADVOGADOS: FELLIPE BERNARDES DA SILVA E OUTRO(S) / FELIPE PROVENZI DIAS

    ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Família - Regime de Bens Entre os Cônjuges

    CERTIDÃO

    Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

    A Terceira Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

    Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha, Paulo de Tarso Sanseverino e Ricardo Villas Bôas Cueva (Presidente) votaram com o Sr. Ministro Relator.

    (DJe: 23/09/2015)

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