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    Acórdão STJ
    Fonte: 1.021.440
    Julgamento: 02/05/2013 | Aprovação: Não disponível | Publicação: 20/05/2013
    Estado: São Paulo | Cidade:
    Relator: Luis Felipe Salomão
    Legislação: Art. 3º, VI, da Lei nº 8.009/1990 e art. 535 do Código de Processo Civil.

    Ementa:

    PROCESSO CIVIL. DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL CIVIL DECORRENTE DA PRÁTICA DE ATO ILÍCITO. COEXISTÊNCIA COM SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA COM O MESMO FUNDAMENTO DE FATO. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA. APLICAÇÃO DA LEI n. 8.009/1990. EXCEÇÕES PREVISTAS NO ART. 3º. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DE VIOLAÇÃO AO DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. COMPETÊNCIA DO STF. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA. 1. É defeso a esta Corte apreciar alegação de violação a dispositivos constitucionais, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal. 2. Não ocorre violação ao art. 535 do Código de Processo Civil quando o juízo, embora de forma sucinta, aprecia fundamentadamente todas as questões relevantes ao deslinde do feito, apenas adotando fundamentos divergentes da pretensão do recorrente. Precedentes. 3. O art. 3º, VI, da Lei n. 8.009/1990 expressamente afastou a impenhorabilidade quando o bem imóvel é adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens, sendo certo que, por ostentar a legislação atinente ao bem de família natureza excepcional, é insuscetível de interpretação extensiva. 4. De fato, o caráter protetivo da Lei n. 8.009/1990 impõe sejam as exceções nela previstas interpretadas estritamente. Nesse sentido, a ressalva contida no inciso VI do seu artigo 3º encarta a execução de sentença penal condenatória - ação civil ex delicto -; não alcançando a sentença cível de indenização, salvo se, verificada a coexistência dos dois tipos, for-lhes comum o fundamento de fato, exatamente o que ocorre nestes autos. Precedente. 5. Recurso especial não provido.

    Íntegra:

    SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA

    RECURSO ESPECIAL Nº 1.021.440 - SP (2008/0002796-2)

    RELATOR: MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

    RECORRENTE: MARY APARECIDA FRIGI VIEIRA

    ADVOGADO: JOSÉ RATTO FILHO

    RECORRIDO: FRANCISCO MARINHO FILHO

    ADVOGADO: ROBSON VIANA MARQUES E OUTRO(S) 

    EMENTA: PROCESSO CIVIL. DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. ACIDENTE DE TRÂNSITO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL CIVIL DECORRENTE DA PRÁTICA DE ATO ILÍCITO. COEXISTÊNCIA COM SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA COM O MESMO FUNDAMENTO DE FATO. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA. APLICAÇÃO DA LEI N. 8.009/1990. EXCEÇÕES PREVISTAS NO ART. 3º. IMPOSSIBILIDADE DE ANÁLISE DE VIOLAÇÃO AO DISPOSITIVOS CONSTITUCIONAIS. COMPETÊNCIA DO STF. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC NÃO CONFIGURADA.

    1. É defeso a esta Corte apreciar alegação de violação a dispositivos constitucionais, sob pena de usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal.

    2. Não ocorre violação ao art. 535 do Código de Processo Civil quando o juízo, embora de forma sucinta, aprecia fundamentadamente todas as questões relevantes ao deslinde do feito, apenas adotando fundamentos divergentes da pretensão do recorrente. Precedentes.

    3. O art. 3º, VI, da Lei n. 8.009/1990 expressamente afastou a impenhorabilidade quando o bem imóvel é adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens, sendo certo que, por ostentar a legislação atinente ao bem de família natureza excepcional, é insuscetível de interpretação extensiva.

    4. De fato, o caráter protetivo da Lei n. 8.009/1990 impõe sejam as exceções nela previstas interpretadas estritamente. Nesse sentido, a ressalva contida no inciso VI do seu artigo 3º encarta a execução de sentença penal condenatória - ação civil ex delicto -; não alcançando a sentença cível de indenização, salvo se, verificada a coexistência dos dois tipos, for-lhes comum o fundamento de fato, exatamente o que ocorre nestes autos. Precedente.

    5. Recurso especial não provido. 

    ACÓRDÃO

    Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Ministro Raul Araújo, negando provimento ao recurso especial, acompanhando o Relator, e os votos da Ministra Maria Isabel Gallotti e dos Ministros Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi, no mesmo sentido,a QUARTA TURMA, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo Filho (voto-vista), Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 02 de maio de 2013 (Data do Julgamento)

    MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, Relator 

    RELATÓRIO

    O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

    1. Mary Aparecida Frigi Vieira ajuizou embargos à execução em face de Francisco Marinho Filho, arguindo, primeiro, nulidade do processo de conhecimento, porquanto seu representante à ocasião carecia de poderes específicos para reconhecer a procedência do pedido indenizatório. Outrossim, sustentou a nulidade da penhora efetivada, uma vez que a constrição recaíra sobre bem de família onde a recorrente reside, sendo certa a inexistência de qualquer exceção prevista no art. 3º da Lei 8.009/1990. A fase de cumprimento de sentença teve origem em acordo homologado e descumprido, resolvendo a lide indenizatória decorrente de acidente de trânsito.

    Sobreveio sentença de parcial procedência do pedido apenas para levantar a penhora, devendo prosseguir o feito executivo (fls. 52-57).

    O Tribunal estadual deu provimento à apelação, nos seguintes termos (fls. 69-71):

    Na execução ou cumprimento de sentença homologatória de acordo havido entre as partes, deve ser reconhecida a penhorabilidade do imóvel residencial tido como bem de família, se o executado foi condenado criminalmente pelo mesmo fato. Caso em que se aplica a exceção prevista no artigo 3º VI da Lei Federal nº 8.009/90.

    Opostos embargos declaratórios (fls. 74-83), foram rejeitados (fls. 91-93).

    Nas razões do recurso especial interposto com base nas alíneas "a" e "c" do permissivo constitucional, foi alegada violação aos arts. 535, 458, II e III, 515, § 1º e 591 do CPC; 3º, VI e 5º da Lei n. 8.009/1990; e 5º, II, XXXII, XXXV e LV, 6º e 93, IX, da Constituição Federal.

    Em suma, sustentou a recorrente: a) omissão quanto a se tratar o bem litigioso de imóvel único, bem como quanto ao fato de não se cuidar nesta lide de situação em que o imóvel penhorado tenha sido adquirido com produto de roubo nem de execução de sentença penal condenatória; b) as omissões perpetradas pelo Tribunal lhe teriam causado cerceamento de defesa; c) a circunstância de a penhora ter sido efetuada para garantia de dívida originária de ação de indenização por ato ilícito - infração às normas de trânsito e causação de acidente - não configura exceção à regra da impenhorabilidade do bem de família, uma vez que não se trata de execução de sentença penal, mas meramente cível, sendo certo que a ação penal por lesão culposa não a condenou ao pagamento de nenhum valor.

    Não foram apresentadas contrarrazões ao recurso (fl. 163), admitido na instância ordinária (fls. 164-165).

    Interposto recurso extraordinário (fls. 141-153), inadmitido (fls. 166-167).

    Em consulta ao sítio do Tribunal de origem, verificou-se remanescer o interesse no julgamento do recurso, uma vez que o processo encontra-se suspenso.

    É o relatório. 

    VOTO

    O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator):

    2. Na via especial não cabe a análise de afronta a dispositivo constitucional, ainda que com intuito de prequestionamento. Nesse sentido os seguintes precedentes: EDcl no REsp 680.385/RS, Rel. Ministro Barros Monteiro, DJ 20/3/2006, REsp 1.043.700/TO, Rel. Ministro Castro Meira, Dje 5/9/2008; AgRg no REsp 977.900/PR, Rel. Ministra Laurita Vaz, Dje 8/9/2008.

    3. Não se verifica a alegada violação do art. 535 do CPC, uma vez que o Tribunal de origem pronunciou-se de forma clara e suficiente sobre a questão posta nos autos.

    A leitura do recurso de apelação interposto e do voto condutor do acórdão recorrido ressalta a não ocorrência dos vícios ensejadores da oposição de embargos declaratórios, tendo o Tribunal fundamentado a sua decisão no princípio do livre convencimento motivado, apenas divergindo da pretensão da recorrente.

    Ademais, o magistrado não está obrigado a rebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.

    4. Cinge-se o mérito da controvérsia à definição acerca da possibilidade de extensão da exceção (penhorabilidade de bem imóvel do devedor) prevista no art. 3º, VI, da Lei n. 8.009/1990 à hipótese de execução de sentença cível condenatória pelo mesmo fato que ensejou a reprimenda na esfera penal, não se tratando, pois, de liquidação e execução direta do título estabelecido no âmbito criminal.

    4.1. Com efeito, a Lei n. 8.009/1990 institui a impenhorabilidade do bem de família como instrumento de tutela do direito fundamental à moradia da família e, portanto, indispensável à composição de um mínimo existencial para uma vida digna.

    O art. 1º da referida lei dispõe:

    Art. 1º. O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.

    Enfatizando o fundamento constitucional do instituto, Araken de Assis preleciona:

    Inicialmente destinado à proteção da família, a evolução do instituto, no direito brasileiro, e a respectiva inserção no ambiente econômico contemporâneo acarretaram mudança significativa no âmbito da sua aplicação. A proteção se estendeu ao obrigado, tout court, haja ou não constituído família, amplitude revelada pela tutela dos bens domésticos (art. 2º, parágrafo único, da Lei 8.009/1990) da família sem imóvel residencial próprio. Por sua vez, essa proteção ao obrigado, mediante a técnica da impenhorabilidade, assegura-lhe o chamado patrimônio mínimo. A garantia dos meios mínimos de sobrevivência, que é a morada e seu conteúdo, observa um princípio maior, porque "orienta-se pelo interesse social de assegurar uma sobrevivência digna aos membros da família, realizando, em última instância, a dignidade humana".

    É o princípio da dignidade da pessoa humana, portanto, também o responsável pela humanização da execução, recortando do patrimônio o mínimo indispensável à sobrevivência digna do obrigado, sem embargo do dever de prestar que caracterizou o homestead. A norma jurídica (princípio e valor) fundamental, na feliz síntese de Ingo Wolfgang Sarlet, inserida no art. 1º, III, da CF/1988, fornece o fundamento constitucional do instituto. (ASSIS, Araken de. Manual da Execução. São Paulo: RT, 2010, p. 275-276).

    O princípio da dignidade da pessoa humana constitui, assim, um dos baluartes da República Federativa do Brasil (art. 1º da CF/1988), razão pela qual deve nortear a exegese das normas jurídicas, mormente aquelas relacionadas a direito fundamental, como sói ser o direito à moradia.

    4.2. Por sua vez, o artigo 3º desse diploma legal preconiza que a impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:

    [...]

    VI - por ter sido adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens.

    É que, entre os bens jurídicos em cotejo - de um lado a preservação da moradia do devedor inadimplente e, de outro, o dever de ressarcir os prejuízos sofridos em decorrência de conduta ilícita criminalmente apurada -, preferiu o legislador privilegiar o ofendido em detrimento do infrator, afastando a impenhorabilidade do bem de família.

    Conforme Dinamarco:

    [...] essas exceções significam que a Lei do Bem de Família teve a intenção de balancear valores, privilegiando o valor moradia, mas ressalvando que o bem de família será penhorável em benefício dos credores por alimentos, ou por verbas devidas aos trabalhadores da própria residência, ou por garantia real constituída pelo devedor residente no imóvel etc" (DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. Vol. 4. 2. ed. São Paulo: Malheiros, p. 358).

    A área de interface entre o direito civil e o penal, nesse campo, ocorre diante da influência da lei penal positiva e dos reflexos do julgado penal na esfera cível.

    Carlos Roberto Gonçalves leciona:

    Se ao causar dano, [...] o agente transgride, também, a lei penal, ele se torna, ao mesmo tempo, obrigado civil e penalmente. E, assim, terá de responder perante o lesado e perante a sociedade, visto que o fato danoso se revestiu de características que justificam o acionamento do mecanismo recuperatório da responsabilidade civil e impõem a movimentação do sistema repressivo da responsabilidade penal. (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. vol. 4: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 24-25)

    Aguiar Dias explica:

    Assim, certos fatos põem em ação somente o mecanismo recuperatório da responsabilidade civil; outros movimentam tão-somente o sistema repressivo ou preventivo da responsabilidade penal; outros enfim, acarretam a um tempo, a responsabilidade civil e a penal, pelo fato de apresentarem, em relação a ambos os campos, incidência equivalente, conforme os diferentes critérios sob que entram em função os órgãos encarregados de fazer valer a norma respectiva que é quase o mesmo fundamento da responsabilidade civil e da responsabilidade penal. As condições em que surgem é que são diferentes, porque uma é mais exigente do que a outra, quanto ao aperfeiçoamento dos requisitos que devem coincidir para se efetivar. (AGUIAR DIAS, José de. Da Responsabilidade Civil, 10. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 8)

    Como é cediço, a sentença penal condenatória, além dos efeitos penais principais e secundários, produz também efeitos extrapenais, os quais podem ser genéricos ou específicos.

    Os efeitos genéricos são automáticos, ou seja, não precisam ser abordados pelo juiz na sentença, porquanto aplicáveis a qualquer crime.

    Consoante se dessume do inciso I do art. 91 do CP, que enumera os efeitos genéricos da sentença penal condenatória, o legislador estabeleceu a obrigação do agente de reparar o dano causado pelo crime, entendendo por desnecessária a prova do dano na área cível, em virtude de ele já ter sido provado durante o processo criminal.

    Confira-se:

    Art. 91 - São efeitos da condenação:

    I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime;

    II - a perda em favor da União, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé:

    a) dos instrumentos do crime, desde que consistam em coisas cujo fabrico, alienação, uso, porte ou detenção constitua fato ilícito;

    b) do produto do crime ou de qualquer bem ou valor que constitua proveito auferido pelo agente com a prática do fato criminoso.

    O art. 935 do Código Civil corrobora essa assertiva ao preconizar que "a responsabilidade civil é independente da criminal, não se podendo questionar mais sobre a existência de fato, ou sobre quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo criminal.”

    Como bem salientado por Marcione Pereira dos Santos:

    O ato ilícito, por força de expressa disposição legal, gera a obrigação de reparar o dano. Existem atos ilícitos que se limitam a produzir efeitos no âmbito civil e outros que, pela sua gravidade, ofendem a incolumidade pública, acarretando ofensa no âmbito penal, nada impedindo, entretanto, que um único ato ilícito atinja as duas esferas de responsabilidade, tanto civil quanto penal. É dessa hipótese que trata a presente exceção.

    A sentença penal condenatória tem como efeito tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime. Por esse efeito, que Celso Delmanto nomina de 'extrapenal genérico', uma vez transitada em julgado a sentença penal, torna certa a responsabilidade de indenizar o dano no cível, gerando um título executivo judicial, conforme previsto no art. 584, II, do Código de Processo Civil. [...]

    Nesses casos, não interessará para a exclusão da impenhorabilidade do bem de família legal que a sua aquisição tenha sido com origem criminosa, ou que o crime praticado tenha expressão econômica, tal qual exigido na hipótese anterior, mas bastará que o devedor tenha sido condenado penalmente ao ressarcimento ou indenização dos danos causados pelo crime. (SANTOS, Marcione Pereira. Bem de Família: Voluntário e Legal. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 251-252)

    De fato, segundo o princípio da intervenção mínima, a atuação do direito penal ocorre apenas subsidiariamente, ou seja, somente quando os demais ramos do direito não forem suficientes para a proteção adequada de bens jurídicos que assumem maior relevância e que são alvo de ataques mais graves.

    Por isso que o art. 3º, VI, da Lei n. 8.009/1990 expressamente afastou a impenhorabilidade quando o bem imóvel é adquirido com produto de crime ou para execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens, sendo certo que, por ostentar a legislação atinente ao bem de família natureza excepcional, é insuscetível de interpretação extensiva.

    Com efeito, não se pode presumir as exceções previstas no art. 3º:

    PROCESSUAL CIVIL. CIVIL. RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO. IMÓVEL. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. PROVA DE QUE O IMÓVEL PENHORADO É O ÚNICO DE PROPRIEDADE DO DEVEDOR. DESNECESSIDADE. EXCEÇÃO DO ART. 3º, V, DA LEI 8.009/90. INAPLICABILIDADE. DÍVIDA DE TERCEIRO. PESSOA JURÍDICA. IMPOSSIBILIDADE DE PRESUNÇÃO DE QUE A DÍVIDA FORA CONTRAÍDA EM FAVOR DA ENTIDADE FAMILIAR. PRECEDENTES. RECURSO PROVIDO.

    1. Para que seja reconhecida a impenhorabilidade do bem de família, não é necessária a prova de que o imóvel em que reside a família do devedor é o único de sua propriedade.

    2. Não se pode presumir que a garantia tenha sido dada em benefício da família, para, assim, afastar a impenhorabilidade do bem com base no art. 3º, V, da Lei 8.009/90.

    3. Somente é admissível a penhora do bem de família hipotecado quando a garantia foi prestada em benefício da própria entidade familiar, e não para assegurar empréstimo obtido por terceiro.

    4. Na hipótese dos autos, a hipoteca foi dada em garantia de dívida de terceiro, sociedade empresária, a qual celebrou contrato de mútuo com o banco. Desse modo, a garantia da hipoteca, cujo objeto era o imóvel residencial dos ora recorrentes, foi feita em favor da pessoa jurídica, e não em benefício próprio dos titulares ou de sua família, ainda que únicos sócios da empresa, o que afasta a exceção à impenhorabilidade do bem de família prevista no inciso V do art.

    3º da Lei 8.009/90.

    5. Recurso especial conhecido e provido.

    (REsp 988.915/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 15/05/2012, DJe 08/06/2012)

    RECURSO ESPECIAL. AÇÃO ANULATÓRIA. ACORDO HOMOLOGADO JUDICIALMENTE. OFERECIMENTO DE BEM EM GARANTIA. PEQUENA PROPRIEDADE RURAL. IMPENHORABILIDADE. EQUIPARAÇÃO À GARANTIA REAL HIPOTECÁRIA. DESCABIMENTO.

    1.- A proteção legal assegurada ao bem de família pela Lei 8.009/90 não pode ser afastada por renúncia, por tratar-se de princípio de ordem pública, que visa a garantia da entidade familiar.

    2.- A ressalva prevista no art. 3º, inciso V, da Lei 8.009/90 não alcança a hipótese dos autos, limitando-se, unicamente, à execução hipotecária, não podendo benefício da impenhorabilidade ser afastado para a execução de outras dívidas. Por tratar-se de norma de ordem pública, que visa a proteção da entidade familiar, e não do devedor, a sua interpretação há de ser restritiva à hipótese contida na norma.

    3.- Recurso Especial improvido.

    (REsp 1115265/RS, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, TERCEIRA TURMA, julgado em 24/04/2012, DJe 10/05/2012)

    PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CRÉDITO ORIUNDO DE CONTRATO DE HONORÁRIOS. RECONHECIMENTO JUDICIAL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA. INEXISTÊNCIA DE EXCEÇÃO. LEI N. 8.009/1990, ART. 3º, E INCISOS.

    I. O crédito resultante de contrato de honorários advocatícios (art. 24 da Lei n. 8.906/1994), não se assemelha à pensão alimentícia, de sorte que não se encontra entre as exceções à benesse da Lei n. 8.009/1990, de modo a preservar-se a impenhorabilidade do bem de família.

    II. Recurso especial conhecido em parte, e parcialmente provido.

    (REsp 1182108/MS, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 12/04/2011, DJe 25/04/2011)

    DIREITO CIVIL. IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. LEI EXCEPCIONAL. ART. 3.º, INC. VI, DA LEI 8.009/90. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. AFASTAMENTO DA EXIGÊNCIA DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

    1. Não há omissão no acórdão que decide a lide nos limites em que proposta.

    2. A indenização, no caso, decorre de erro médico, sobrevindo condenação civil a reparação do dano material e moral, sem obrigação de prestar alimentos. Não incide, portanto, a exceção de impenhorabilidade de bem de família prevista no inciso III, do art. 3.º, da Lei 8.009/90.

    3. De outra parte, não é possível ampliar o alcance da norma prevista no art. 3.º, inciso VI, do mesmo diploma legal, para afastar a impenhorabilidade de bem de família em caso de indenização por ilícito civil, desconsiderando a exigência legal expressa de que haja "sentença penal condenatória".

    4.Recurso especial parcialmente provido.

    (REsp 711.889/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/06/2010, DJe 01/07/2010)

    4.3. De se notar que não cuidou o legislador de estampar, na exceção constante do mencionado art. 3º da Lei n. 8.009/1990, o caso de execução de título judicial civil decorrente da prática de ato ilícito, ainda que devidamente apurado e cuja decisão tenha transitado em julgado.

    A lei estabelece, portanto, de forma expressa, as hipóteses de exceção à regra da impenhorabilidade do bem de família, ressoando claro seu caráter excepcional a demandar a interpretação estrita.

    Carlos Maximiliano, quanto à interpretação de normas excepcionais, magistralmente leciona:

    272 - As disposições excepcionais são estabelecidas por motivos ou considerações particulares, contra outras normas jurídicas, ou contra o Direito comum; por isso não se estendem além dos casos e tempos que designam expressamente.

    [...]

    286 - Parece oportuna a generalização da regra exposta acerca de determinadas espécies de preceitos, esclarecer como se entende e aplica uma norma excepcional. É de Direito estrito; reduz-se à hipótese expressa: na dúvida, segue-se a regra geral. Eis porque se diz que a exceção confirma a regra nos casos não excetuados.

    287 - O processo de exegese das leis de tal natureza é sintetizado na parêmia célebre, que seria imprudência eliminar sem maior exame - 'interpretam-se restritamente as disposições derrogatórias do Direito comum'. Não há efeito sem causa: a predileção tradicional pelos brocardos provém da manifesta utilidade dos mesmos. Constituem sínteses esclarecedoras, admiráveis súmulas de doutrinas consolidadas. Os males que lhes atribuem são os de todas as regras concisas: decorrem não do uso, e sim do abuso dos dizeres lacônicos. O exagero encontra-se antes na deficiência de cultura ou no temperamento do aplicador do que no âmago do apotegma. Bem compreendido este, conciliados os seus termos e a evolução do Direito, a letra antiga e as idéias modernas, ressaltará ainda a vantagem atual desses comprimidos de idéias jurídicas, auxiliares da memória, amparos do hermeneuta, fanais do julgador vacilante em um labirinto de regras positivas.

    Quanta dúvida resolve, num relâmpago, aquela síntese expressiva - interpretam-se restritivamente as disposições derrogatórias do Direito comum!

    Responde, em sentido negativo, à primeira interrogação: o Direito Excepcional comporta o recurso à analogia? Ainda enfrenta, e com vantagem, a segunda: é ele compatível com a exegese extensiva? Neste último caso, persiste o adágio em amparar a recusa; acompanham-no reputados mestres; outros divergem, porém mais na aparência do que na realidade: esboçam um sim acompanhado de reservas que o aproximam do não. Quando se pronunciam pelo efeito extensivo, fazem-no com o intuito de excluir o restritivo, tomado este na acepção tradicional. Timbram em evitar que se aplique menos do que a norma admite; porém não pretendem o oposto - ir além do que o texto prescreve. O seu intento é tirar da regra tudo o que na mesma se contém, nem mais, nem menos. Essa interpretação bastante se aproxima da que os clássicos apelidavam declarativa; denomina-se estrita: busca o sentido exato; não dilata, nem restringe.

    Com as reservas expostas, a parêmia terá sempre cabimento e utilidade. Se fora lícito retocar a forma tradicional, substituir-se-ia apenas o advérbio: ao invés de restritiva, estritamente. Se prevalecer o escrúpulo em emendar adágios, de leve sequer, bastará que se entenda a letra de outrora de acordo com as idéias de hoje: o brocardo sintetiza o dever de aplicar o conceito excepcional só à espécie que ele exprime, nada acrescido, nem suprimido ao que a norma encerra, observada a mesma, portanto, em toda a sua plenitude.

    (Hermenêutica e Aplicação do Direito. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2011, p. 183 e 191)

    Nesse sentido, vários são os precedentes desta Corte:

    DIREITO CIVIL. IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. LEI EXCEPCIONAL. ART. 3.º, INC. VI, DA LEI 8.009/90. INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. AFASTAMENTO DA EXIGÊNCIA DE SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

    1. Não há omissão no acórdão que decide a lide nos limites em que proposta.

    2. A indenização, no caso, decorre de erro médico, sobrevindo condenação civil a reparação do dano material e moral, sem obrigação de prestar alimentos. Não incide, portanto, a exceção de impenhorabilidade de bem de família prevista no inciso III, do art. 3.º, da Lei 8.009/90.

    3. De outra parte, não é possível ampliar o alcance da norma prevista no art. 3.º, inciso VI, do mesmo diploma legal, para afastar a impenhorabilidade de bem de família em caso de indenização por ilícito civil, desconsiderando a exigência legal expressa de que haja "sentença penal condenatória".

    4. Recurso especial parcialmente provido.

    (REsp 711.889/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/06/2010, DJe 01/07/2010)

    RECURSO ESPECIAL - FALTA DE INDICAÇÃO PRECISA DOS DISPOSITIVOS TIDOS POR VIOLADOS RELATIVAMENTE À QUESTÃO DA SUPOSTA EXISTÊNCIA DE NULIDADE ABSOLUTA DO FEITO - SÚMULA Nº 284 DO STF - QUESTÃO DA CULPA PELO SINISTRO E O ART. 4º DA LEI N. 8.009/90 - AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO - APLICAÇÃO DA SÚMULA Nº 211 DO STJ - IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA - FLEXIBILIZAÇÃO PERANTE CRÉDITO DECORRENTE DE PENSÃO MENSAL FIXADA EM AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR ILÍCITO CIVIL - ADMISSIBILIDADE - INCLUSÃO, NO ROL DE EXCEÇÕES À PROTEÇÃO LEGAL, DOS CRÉDITOS ORIUNDOS DA REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS E DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS DE SUCUMBÊNCIA - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

    [...]

    3. Os temas atinentes à culpa pelo sinistro e ao art. 4º da Lei n. 8.009/90 não foram objeto de deliberação, sequer implícita, na Instância a quo, o que convoca o óbice da Súmula n. 211/STJ.

    4. A pensão alimentícia está contemplada no art. 3º, III, da Lei n. 8.009/90 como hipótese de exceção à impenhorabilidade do bem de família, com apoio da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, que preconiza a irrelevância da origem dessa prestação (se decorrente de relação familiar ou de ato ilícito).

    5.Não infirma a blindagem do bem de família, todavia, à míngua de previsão legal expressa, o crédito decorrente de honorários advocatícios de sucumbência e de indenização por danos materiais e morais decorrentes de ilícito civil.

    6. Recurso especial parcialmente provido. (REsp 1036376 / MG, Relator Ministro MASSAMI UYEDA - TERCEIRA TURMA Data do Julgamento 10/11/2009 Data da Publicação/Fonte DJe 23/11/2009)

    PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA. DECISÃO MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.

    I. A inadimplência dos réus em relação a compras de materiais de construção do imóvel onde residem não autoriza afastar a impenhorabilidade de bem de família, dado que a hipótese excepcional em contrário, prevista no art. 3º, II, da Lei n. 8.009/90, é taxativa, não permitindo elastecimento de modo a abrandar a regra protetiva conferida pelo referenciado diploma legal.

    II. Agravo improvido.

    (AgRg no Ag 888313/RS, Rel. Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, QUARTA TURMA, julgado em 24/06/2008, DJe 08/09/2008)

    Ação de indenização. Ação cautelar de arresto. Dano moral. Impenhorabilidade do bem arrestado. Lei n° 8.009/90.

    1. O ato praticado pelo oficial de justiça em decorrência de decisão judicial não é causa suficiente para a imposição de indenização por danos morais.

    2. Sendo o bem arrestado protegido pela Lei n° 8.009/90, não pode ser afastada a impenhorabilidade por circunstância não incluída nas exceções legais.

    3. Recurso especial conhecido e provido.

    (REsp 605641/RS, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/08/2004, DJ 29/11/2004, p. 333)

    CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. LEI 8.009/1990.

    AS EXCEÇÕES AOS BENEFÍCIOS DA LEI 8.009/1990 SÃO AS PREVISTAS NOS SEUS ARTS. 3 E 4. NESTES NÃO CONSTANDO A CIRCUNSTÂNCIA DE A PENHORA TER SIDO EFETUADA PARA GARANTIA DE DÍVIDA ORIGINÁRIA DE AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR ATO ILÍCITO, EM RAZÃO DE VIOLAÇÃO A NORMAS DE TRANSITO QUE GEROU ACIDENTE DE VEÍCULOS.

    RECURSO PROVIDO.

    (REsp 64342/PR, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 25/11/1997, DJ 09/03/1998, p. 115)

    IMPENHORABILIDADE - LEI 8.009/90. A CIRCUNSTÂNCIA DE O DÉBITO ORIGINAR-SE DA PRÁTICA DE ILÍCITO CIVIL, ABSOLUTO OU RELATIVO, NÃO AFASTA A IMPENHORABILIDADE PREVISTA NO ARTIGO 1º DA LEI 8.009/90. (REsp 90145 / PR, Relator Ministro EDUARDO RIBEIRO - TERCEIRA TURMA, DJ 26/08/1996)

    5. Dessarte, interpretando-se a norma em tela de forma estrita, é forçoso concluir que o legislador optou pela prevalência do dever de o infrator indenizar à vítima de ato ilícito que tenha atingido bem jurídico tutelado pelo direito penal e nesta esfera tenha sido apurado, sendo objeto, portanto, de sentença penal condenatória transitada em julgado.

    Isso porque a apuração do delito penal obedece a critérios mais rigorosos, uma vez que o valor em jogo é a liberdade de locomoção - direito indisponível -, de modo que o processo penal é orientado pelo princípio da verdade processual, em que o juiz tem o dever de investigar, tanto quanto possível, a realidade fática dos autos, razão pela qual seus poderes instrutórios são mais amplos (art. 156, 196 e 234, CPP).

    Diversamente, no processo civil, os direitos são, em regra, disponíveis para as partes, o que tem o condão de mitigar a imperiosidade da investigação da verdade processual e, por conseguinte, limitar os poderes de instrução do magistrado na busca da verdade material. Esta, portanto, resta enfraquecida pela admissibilidade de presunções, ficções e transações, entre as quais menciona-se, à guisa de exemplo, a presunção de veracidade dos fatos afirmados pelo autor como efeito da revelia (art. 319 do CPC).

    Dessa forma, a impenhorabilidade do bem de família, dada a sua importância social, somente pode ser superada quando houver transgressão à norma penal com concomitante ofensa à norma civil, rendendo ensejo, portanto, após o trânsito em julgado da sentença que a reconhecer, ao dever de ressarcimento do prejuízo causado pela prática do delito, ou seja, à ação civil ex delicto.

    Confira-se a lição de Fernando da Costa Tourinho Filho:

    De modo geral, quando alguém transgride a norma penal, produz, com simultaneidade, ofensa a 'duas ordens distintas de interesses: o social, sob a égide das leis sociais, e o particular, que as leis civis protegem' [...]

    Atendendo a tais circunstâncias, muitos juristas afirmam que a infração penal dá nascimento a duas ações: à ação penal, visando à aplicação da pena, e à ação civil, objetivando a reparação dos prejuízos ocasionados pelo crime.

    [...]

    No entanto, infrações penais há que originam tão somente a pretensão punitiva, como ocorre em certas contravenções penais, como a prevista no art. 62 da LCP, no crime do art. 28 da Lei n. 11.343/2006 e em alguns crimes contra a administração da justiça, por exemplo. [...] Tais infrações não produzem dano patrimonial ou moral ressarcíveis e, por isso, não dão lugar à actio civilis ex delicto.

    [...]

    Ao contrário: alguns atos podem ensejar a propositura de uma ação de ressarcimento e não possibilitar a ação penal. Se determinado ato não é previsto em lei como infração penal, não pode ser incriminado - permittitur, quod non prohibetur -, mas poderá dar lugar a uma ação de ressarcimento, como acontece com o ato tido como civilmente ilícito. Descumprimento de um contrato, por exemplo.

    6. No caso em apreço, asseverou o Tribunal a quo a coexistência das sentenças civil e penal, esta condenando a recorrente pelo mesmo fato - lesão corporal culposa decorrente de acidente de trânsito -, tendo sido homologado acordo entre as partes para a composição dos danos que, descumprido, ensejou a execução da decisão prolatada pelo Juízo cível.

    Confira-se o seguinte excerto do voto condutor (fl. 71):

    No caso, trata-se de execução, agora cumprimento de sentença, na qual se homologou acordo havido entre as partes para ressarcimento de danos causados por acidente de veículos. Não se pode olvidar, contudo, que as partes se compuseram quando já havia sentença penal condenatória da apelada transitada em julgado, por lesão corporal culposa decorrente exatamente do acidente de trânsito que também ensejou a ação civil.

    Assim, a natureza do crédito executado é a mesma da tratada no aludido inciso VI do artigo 3º da Lei Federal nº 8.009/90. Aliás, não se concebe que, acaso o apelante optasse por executar a sentença penal condenatória, tivesse assegurada a penhorabilidade e não se lhe reconheça tal direito na execução do acordo havido no processo civil originado do mesmo fato reconhecido como criminoso: Ubi eadem ratio, ibi eadem dispositio.

    Desse modo, a influência da condenação penal na esfera civil autoriza seja aplicada à sentença desta emanada a mesma medida que seria tomada no caso de execução da sentença criminal ante a identidade do fundamento de fato.

    Apreciando hipótese similar à deste feito, confira-se o seguinte precedente:

    PROCESSUAL CIVIL - EXECUÇÃO DE SENTENÇA - BEM DE FAMÍLIA - INCIDÊNCIA DO ARTIGO 3º, VI, DA LEI 8.009/90 - PREQUESTIONAMENTO - AUSÊNCIA - SÚMULA 7/STJ.

    I - O primeiro Recorrente foi condenado no juízo criminal como incurso nas penas do artigo 129, § 6º, do Código Penal (lesões corporais culposas), bem como perante o juízo cível em ação de indenização pelo mesmo fato, não fazendo jus, por conseguinte, ao favor legal da Lei 8.009/90, segundo o disposto no artigo 3º, VI, da referida lei.

    II - Ausência de prequestionamento dos artigos 1.525, 145, V, e 146 do Código Civil.

    III - Concluiu o aresto combatido que o imóvel em questão, apesar de identificado como sendo de área rural, não é utilizado para fins agrícolas, mormente porque o Recorrente possui a profissão de pedreiro e não de agricultor. Rever tal posicionamento demanda revolvimento de aspectos fático-probatórios, inviável a teor do disposto na Súmula 7 desta Corte.

    IV - Recurso Especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido.

    (REsp 209043/RS, Rel. Ministro WALDEMAR ZVEITER, TERCEIRA TURMA, julgado em 16/11/2000, DJ 05/02/2001, p. 100)

    9. Ante o exposto, nego provimento ao recurso especial.

    É o voto. 

    CERTIDÃO DE JULGAMENTO

    QUARTA TURMA

    Número Registro: 2008/0002796-2     

    PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.021.440/SP

    Números Origem: 2122000 9445290 9445291

    PAUTA: 18/10/2012 - JULGADO: 18/10/2012

    Relator: Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO

    Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO

    Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. ANTÔNIO CARLOS PESSOA LINS

    Secretária: Bela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE: MARY APARECIDA FRIGI VIEIRA

    ADVOGADO: JOSÉ RATTO FILHO E OUTRO(S)

    RECORRIDO: FRANCISCO MARINHO FILHO

    ADVOGADO: ROBSON VIANA MARQUES E OUTRO(S)

    ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Responsabilidade Civil 

    CERTIDÃO

    Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

    Após o voto do Sr. Ministro Relator, negando provimento ao recurso especial, PEDIU VISTA o Ministro Raul Araújo.

    Aguardam os Srs. Ministros Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi. 

    VOTO-VISTA

    O SENHOR MINISTRO RAUL ARAÚJO:

    O eminente Ministro Relator Luis Felipe Salomão concluiu pelo desprovimento do recurso especial, asseverando que "o caráter protetivo da Lei n. 8.009/90 impõe sejam as exceções nela previstas interpretadas estritamente. Nesse sentido, a ressalva contida no inciso VI, do artigo 3º, da Lei 8.009/90 encarta a execução de sentença penal condenatória - ação civil ex delicto-, não alcançando a sentença cível de indenização, salvo se, verificada a coexistência dos dois tipos, for-lhes comum o fundamento de fato, exatamente o que ocorre nestes autos".

    Pedi vista dos autos para exame mais próximo do caso.

    Conforme salientado no voto do eminente Ministro Relator, no presente caso, a sentença cível baseou-se na sentença penal condenatória para chegar ao resultado que adotou. Nesse contexto, a r. sentença cível veio suprir omissão relativa à condenação reparatória que poderia ter constado da r. sentença penal (CC/2002, art. 935; CPP, arts. 63 e 65).

    Há, portanto, entre as duas harmônicas decisões uma relação complementar ou simbiôntica que autoriza a interpretação dada pelo eminenteMinistro Luis Felipe Salomão ao art. 3º, VI, da Lei 8.009/90, sem conotação de extensividade.

    Diante do exposto, acompanhando o ilustrado Relator, entendo que deve ser negado provimento ao recurso especial.

    É como voto.

    CERTIDÃO DE JULGAMENTO

    QUARTA TURMA

    Número Registro: 2008/0002796-2     

    PROCESSO ELETRÔNICO REsp 1.021.440/SP

    Números Origem: 2122000 9445290 9445291

    PAUTA: 02/05/2013 - JULGADO: 02/05/2013

    Relator: Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO

    Presidente da Sessão: Exmo. Sr. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO

    Subprocurador-Geral da República: Exmo. Sr. Dr. ODIM BRANDÃO FERREIRA

    Secretária: Bela. TERESA HELENA DA ROCHA BASEVI 

    AUTUAÇÃO

    RECORRENTE: MARY APARECIDA FRIGI VIEIRA

    ADVOGADO: JOSÉ RATTO FILHO E OUTRO(S)

    RECORRIDO: FRANCISCO MARINHO FILHO

    ADVOGADO: ROBSON VIANA MARQUES E OUTRO(S)

    ASSUNTO: DIREITO CIVIL - Responsabilidade Civil 

    CERTIDÃO

    Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

    Prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Ministro Raul Araújo, negando provimento ao recurso especial, acompanhando o Relator, e os votos da Ministra Maria Isabel Gallotti e dos Ministros Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi, no mesmo sentido, a Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Relator.

    Os Srs. Ministros Raul Araújo Filho (voto-vista), Maria Isabel Gallotti, Antonio Carlos Ferreira e Marco Buzzi votaram com o Sr. Ministro Relator.

    (D.J.E. de 20.05.2013)

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