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A importância da ação civil pública como forma de efetividade do direito urbanístico
Daniela Munhoz de Oliveira*


Resumo

Com o surgimento das demandas coletivas, que tem como marco inicial a Revolução Industrial, o perfil do postulante à Justiça se alterou. O que se presencia cada vez mais é a consagração do direito processual coletivo, que teve como marco no Brasil a promulgação das chamadas ações civis públicas – lei 7.347/85 – que além dos aspectos materiais, deu maior desenvolvimento à defesa dos interesses coletivos lato sensu.

Não obstante, as aglomerações sociais fizeram com que surgissem, paulatinamente, soluções e mecanismos que acabaram se aglutinando em torno da expressão “Direito urbanístico”.

Dessa forma, o presente trabalho tem por escopo precípuo a análise da importância atual das ações coletivas, em especial a ação civil pública, abordando sua incidência nas hipóteses de violação a direito urbanístico.

1. Objeto da ação coletiva

Na análise do tema ações coletivas é de extrema relevância delimitar qual seria o seu objeto. (GOMES JR., 2005).

Segundo Almeida (2003), tal delimitação é de fato muito importante, posto que através da análise do objeto material do direito em questão que se distinguirá a tutela jurisdicional que será utilizada, isto é, se será individual ou coletiva.

Ter-se-á a ação coletiva sempre que o objetivo seja tutelar interesses coletivos, assim entendidos os difusos, coletivos em sentido estrito e os individuais homogêneos. Logo, tem-se como necessárias tais definições.

Têm-se como direitos difusos aqueles em que são titulares pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato (art. 81, I, CDC). Ex: devastação amazônica.

Os direitos coletivos strictu sensu tratam de um direito que relaciona um grupo amplo de pessoas em razão de uma relação jurídica base que lhes é comum (art. 81, II, CDC). Ex. aumentos ilegais de consórcio.

Já os direitos individuais homogêneos são em sua essência individuais, e por apresentarem relevante valor social, passam a receber tratamento processual de direito coletivo. Logo, coletivo é o modo de tutelá-los e não o direito material tutelado (art. 81, III, CDC). Ex.: ação pertinente em face de um lote de veículos produzidos com defeito.

2. Da ação civil pública

Conforme já ressaltado, não há como se falar em direito processual coletivo comum no Brasil, antes da entrada em vigor da lei 7.347/85 que instituiu a ação civil pública, posto que, até então, não havia no ordenamento jurídico brasileiro um sistema próprio para tutelar os direitos relativos às massas. (ZAVASCKI, 2006).

No contexto de Zavascki (2006, p.63), ação civil pública

[...] é a denominação atribuída pela lei 7.347, de 1985, ao procedimento especial, por ela instituído, destinado a promover a tutela de direitos e interesses transindividuais, através de um conjunto de mecanismos destinados a instrumentalizar demandas preventivas, reparatórias e cautelares de quaisquer direitos e interesses difusos e coletivos, notadamente “as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais” causados ao meio ambiente, ao consumidor, à ordem urbanística, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, à ordem econômica e à economia popular (art. 1º).

Não obstante, com a Carta Magna de 1988, tal ação adquiriu dignidade constitucional, dispondo o artigo 129, III, do referido diploma legal, que é função institucional do Ministério Público “promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.

Referida ação tem como principal objetivo a tutela dos direitos transindividuais, compreendendo, de início, apenas dos difusos e coletivos strictu sensu, os quais com o advento do Código de Defesa do Consumidor foram alargados com o surgimento dos direitos individuais homogêneos (MANCUSO, 2004).

Por fim, ressaltam que tal ação é justamente denominada como “pública” por apresentar um grande espectro social, permitindo o acesso à justiça de direitos atribuídos a grande número de pessoas.

3. A ação civil pública e o direito urbanístico

O surgimento dos conglomerados urbanos é fato histórico, geográfico e, acima de tudo, social. Desse modo, demonstra-se a importância do urbanismo e do direito, como ciências ordenadoras dos fatos sociais ocorridos nas cidades.

Em meados da década de 1970 o direito urbanístico começou a conquistar sua identidade, em razão de uma verdadeira explosão das grandes cidades, que traziam consigo todos os problemas às mesmas inerentes.

Logo, em face da necessidade de previsão legal acerca do tema, a Constituição de 1988 prevê o urbanismo como uma ciência que se preocupa com a sistematização e com o desenvolvimento da cidade, buscando determinar a melhor posição das ruas, dos edifícios e obras públicas, de habitação privada, de modo que a população possa gozar de uma situação sã, cômoda e estimada (MUKAI, 2004).

Meirelles (2000), afirma que o Direito Urbanístico é o ramo do direito que visa a promover o controle jurídico do desenvolvimento urbano, ou seja, dos vários processos de uso, ocupação, parcelamento e gestão do solo nas cidades.

Referido autor, ressalta ainda que tal ramo do direito manifesta-se em dois aspectos:

a) Direito Urbanístico objetivo: Consiste no conjunto de normas jurídicas reguladoras da atividade do poder público, destinadas a ordenar os espaços habitáveis; e

b) Direito Urbanístico como ciência: Busca o conhecimento sistematizado daquelas normas e princípios reguladores da atividade urbanística.

Porém, não basta apenas haver a previsão legal. Para a verdadeira efetivação de um direito, é necessário que existam mecanismos processuais hábeis.

Nesse sentido, o artigo 4º da lei 7.347/85  aduz ser pressuposto da ação civil pública o dano ou ameaça de dano a interesse coletivo latu sensu, abrangidos, especialmente, à ordem urbanística, dentre outros. (DI PIETRO, 2004).

Baseado em tal previsão legal, afirma Zavascki (2006) que a ação civil pública é o instrumento mais eficaz para a tutela dos conjuntos urbanos, através do qual se torna possível a defesa das funções urbanísticas como:

- Habitação, através da correção das distorções urbanísticas oriundas dos loteamentos clandestinos ou irregulares;

- Combate à poluição sonora;

- Combate a instalações de empreendimentos comerciais em áreas residenciais

- Criação de recreação, isto é, espaços livres, praças e áreas verdes em loteamentos, dentre outras hipóteses que a sociedade com o passar do tempo necessitar.

Terá legitimidade para a propositura da ação civil pública, visando à defesa do direito urbanístico, os legitimados previstos no artigo 5º da lei 7.347/85, dentre os quais, o Ministério Público se destaca, pois conforme acima ressaltado, trata-se de função institucional de tal ente.

É importante ressaltar que com o advento da lei 10.257/01 (estatuto das cidades), a ação civil pública foi definitivamente consagrada como o instrumento judicial próprio para a proteção da ordem urbanística.

Assim, é evidente, portanto, a importância das ações civis públicas que versam sobre questões urbanísticas, pois sempre apresentam, como tema de fundo, a defesa dos direitos relacionados às cidades, e conseqüentemente possuem inestimável caráter social.

Referências

ALMEIDA, G. A. Direito Processual Coletivo Brasileiro – Um novo ramo do direito processual. São Paulo, Saraiva, 2003.

DI PIETRO, M. S. Z. Direito Administrativo. 17ª Edição. São Paulo, Atlas, 2004.

GOMES JR., L. M. Curso de Direito Processual Coletivo. Rio de Janeiro, Forense, 2005.

MANCUSO, R. C. Ação Civil Pública – Em defesa do meio ambiente, do patrimônio cultural e dos consumidores, 9ª Edição. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2004.

MEIRELLES, H. L. Direito Municipal Brasileiro, 11ª Edição. São Paulo, Malheiros, 2000.

MUKAI, T. Temas atuais de direito urbanístico e ambiental. Belo Horizonte. Fórum, 2004.

ZAVASCKI, T. A. Processo Coletivo – Tutela de direitos coletivos e tutela coletiva de direitos. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2006.

*Daniela Munhoz de Oliveira é bacharelanda em Direito (FEB-Barretos).



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