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Regularização fundiária - Estado de São Paulo regulamenta procedimento


DECRETO Nº 48.340, DE 18 DE DEZEMBRO DE 2003

Institui, no âmbito da Secretaria da Habitação, o Programa Estadual de Regularização de Núcleos Habitacionais de Interesse Social - PRÓ-LAR REGULARIZAÇÃO e dá providências correlatas.

GERALDO ALCKMIN, GOVERNADOR DO ESTADO DE SÃO PAULO, no uso de suas atribuições legais,

Considerando a necessidade de aprimorar os mecanismos para regularização de Núcleos Habitacionais de Interesse Social no Estado de São Paulo, visando a diminuir o déficit habitacional da população de baixa renda e a necessidade de atuar nas aglomerações de habitações subnormais;

Considerando que a Constituição Federal, no artigo 30, inciso VIII, estabelece a competência do Município para promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano, e a Constituição Estadual, no artigo 181, § 3°, dispõe que cabe aos Municípios fixar critérios para regularização e urbanização, assentamentos e loteamentos irregulares;

Considerando que a Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001 - Estatuto da Cidade, no artigo 2°, inciso III, determina, dentre outros preceitos, a cooperação entre os governos no processo de urbanização, em atendimento ao interesse social;

Considerando que Lei Federal nº 9.785, de 29 de janeiro de 1999, que alterou a Lei Federal nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, reafirma, entre outros preceitos, a autonomia dos Municípios na gestão do uso do solo urbano;

Considerando, ainda, que vários núcleos habitacionais de interesse social foram implantados sem o devido licenciamento dos órgãos estadual e municipal competentes; e

Considerando, por fim, que vários núcleos habitacionais já implantados têm sua ocupação consolidada, e aqueles em fase de implantação sofrem sistemáticas invasões de suas áreas institucionais destinadas a equipamentos públicos,

Decreta:

Artigo 1º - Fica instituído, no âmbito da Secretaria da Habitação, o Programa Estadual de Regularização de Núcleos Habitacionais de Interesse Social - PRÓ-LAR REGULARIZAÇÃO, a ser implementado pelo GRAPROHAB - Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais, objetivando a racionalização e agilização das regularizações dos núcleos habitacionais de interesse social promovidos pelo poder público, por órgãos da administração pública descentralizada, por agentes promotores a eles vinculados, por Associações de Moradias ou Pró-Moradias sem fins lucrativos legalmente constituídas e, também, dos previstos no artigo 40 da Lei Federal nº 6.766, de 19 de dezembro de 1979, alterada pela Lei Federal nº 9.785, de 29 de janeiro de 1999.

§ 1º - Os núcleos habitacionais abrangidos pelas disposições constantes do "caput" deste artigo são aqueles já implantados ou em fase de implantação até a data da publicação do presente decreto.

§ 2º - O Secretário da Habitação, no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da publicação deste decreto, editará resolução para promover as alterações necessárias ao Regimento Interno do GRAPROHAB, com vista a dar inteiro cumprimento às finalidades do Programa ora instituído.

Artigo 2º - O Programa Estadual de Regularização de Núcleos Habitacionais de Interesse Social - PRÓ-LAR REGULARIZAÇÃO será executado:

I - com recursos orçamentários próprios;

II - com outros recursos captados pelo Estado, adequados às finalidades do Programa.

Artigo 3º - A Secretaria da Habitação fica autorizada a, representando o Estado de São Paulo, celebrar convênios  de cooperação técnica e respectivos termos de aditamento, com Municípios Paulistas que venham a constar de relação aprovada por despacho governamental publicado no Diário Oficial do Estado, tendo por objeto a implementação do Programa ora instituído.

Artigo 4º - A instrução dos processos referentes a cada convênio compreenderá as manifestações da área técnica e da Consultoria Jurídica que servem à Pasta, além da estrita observância das disposições do Decreto nº 40.722, de 20 de março de 1996, com as alterações introduzidas pelo Decreto nº 45.059, de 12 de julho de 2000.

Artigo 5º - O instrumento-padrão dos convênios obedecerá ao modelo constante do Anexo a este decreto.

Artigo 6º - Este decreto entra em vigor na data de sua publicação.

Palácio dos Bandeirantes, 18 de dezembro de 2003

GERALDO ALCKMIN

ANEXO a que se refere o artigo 5º do Decreto nº 48.340, de 18 de dezembro de 2003

CONVÊNIO QUE CELEBRAM O ESTADO DE SÃO PAULO, POR INTERMÉDIO DA SECRETARIA DA HABITAÇÃO, E O MUNICÍPIO DE..., OBJETIVANDO COOPERAÇÃO TÉCNICA COM VISTA À REGULARIZAÇÃO DE NÚCLEOS HABITACIONAIS DE INTERESSE SOCIAL

O Estado de São Paulo, por intermédio da Secretaria da Habitação, neste ato representada por seu Titular, devidamente autorizado pelo Governador do Estado, nos termos do Decreto nº       , de     de        de      , e o Município de           , neste ato representado por seu Prefeito Municipal, devidamente autorizado pela Lei nº      , de  de     de     , doravante denominados respectivamente, SECRETARIA e MUNICÍPIO, resolvem celebrar o presente convênio, mediante as cláusulas e condições seguintes:

CLÁUSULA PRIMEIRA - Do Objeto

O presente convênio tem por objeto o detalhamento da cooperação técnica entre os partícipes, em conformidade com o Programa Estadual de Regularização de Núcleos Habitacionais de Interesse Social - PRÓ-LAR REGULARIZAÇÃO, com vista à regularização dos núcleos habitacionais a serem cadastrados pelo Município, conforme plano de trabalho que faz parte integrante deste instrumento.

CLÁUSULA SEGUNDA - Das Obrigações dos Partícipes

I - Caberá à SECRETARIA:

a) Desenvolver, em mútua cooperação com o MUNICÍPIO, o levantamento das medidas necessárias à regularização do(s) Núcleo(s) de que trata a Cláusula Primeira como um todo, com vista à implantação e continuidade do Programa, articulando a ação integrada entre os diversos órgãos e instituições públicas;

b) mobilizar e coordenar as atividades dos órgãos estaduais envolvidos na regularização dos núcleos habitacionais de interesse social, zelando pelos prazos e comunicação entre os mesmos;

c) expedir os documentos inerentes às suas competências nos prazos previstos no plano de trabalho;

d) colaborar com os órgãos municipais no cumprimento das disposições estabelecidas no Manual de Orientação Técnica, apropriado para cumprimento do Programa;

II - Caberá ao MUNICÍPIO:

a) pautar suas ações segundo a orientação jurídica, técnica e administrativa acordada com a SECRETARIA e com posturas editadas por outros órgãos e entidades públicos estaduais, bem como prestar-lhes e fornecer-lhes todas as informações e cópias de documentos necessários ao desenvolvimento do Programa;

b) desenvolver os trabalhos de sua competência, auxiliar e orientar na regularização dos núcleos habitacionais objeto do presente, para o cumprimento das ações e dos prazos estabelecidos no Programa;

c) criar instrumentos legais e regulamentares, em nível municipal, que viabilizem a execução do Programa;

d) integrar as ações das Secretarias e órgãos municipais envolvidos na execução do Programa;

e) promover os trabalhos de campo pertinentes;

f) expedir os atos administrativos apropriados, no âmbito de suas atribuições, alusivos à regularidade para cada núcleo habitacional, tendo como parte integrante o cronograma físico-financeiro de obras complementares a executar, se necessárias;

g) encaminhar ao GRAPROHAB - Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais, da SECRETARIA, solicitação de regularização acompanhada das diretrizes municipais e plantas pertinentes;

h) incorporar ao patrimônio público as áreas institucionais reservadas ou existentes no núcleo habitacional, ocupadas ou não, destinadas à utilização por órgãos estaduais e municipais para equipamentos comunitários ou urbanos;

i) divulgar à população os núcleos habitacionais enquadrados no Programa, incluindo placa de obras, quando for o caso, em modelo a ser fornecido pela SECRETARIA, observadas as restrições impostas pelo artigo 37, § 1º, da Constituição Federal;

j) encaminhar ao GRAPROHAB ato final de regularização para encerramento do respectivo processo.

CLÁUSULA TERCEIRA - Do Pessoal

O pessoal utilizado por quaisquer dos partícipes na execução das atividades decorrentes deste instrumento, na condição de empregado, funcionário, autônomo, empreiteiro, ou contratado a qualquer título, nenhuma vinculação terá em relação ao outro partícipe, ficando a cargo exclusivo de cada um deles, a integral responsabilidade no que se refere a todos os direitos, mormente as obrigações de natureza fiscal, trabalhista, tributária e previdenciária, inexistindo solidariedade entre ambos.

CLÁUSULA QUARTA - Dos Recursos Financeiros

O presente convênio não implicará em repasse de recursos financeiros entre os partícipes, respondendo cada qual pelas despesas decorrentes das atividades assumidas, as quais onerarão as dotações próprias dos respectivos orçamentos estadual e municipal.

CLÁUSULA QUINTA - Do Controle e Da Fiscalização

Os partícipes designam os representantes a seguir indicados, os quais darão o apoio necessário à consecução do objeto do presente convênio e serão encarregados do controle e da fiscalização da sua execução:

I - pela SECRETARIA:

II - pelo MUNICÍPIO:

CLÁUSULA SEXTA

Da Vigência

O presente convênio terá vigência de 1 (um) ano, a contar da data da sua assinatura, ficando prorrogado automaticamente por iguais períodos até o máximo de 5 (cinco) anos, salvo se, com antecedência de 60 (sessenta) dias do término de cada período qualquer dos partícipes manifestar, por escrito, desinteresse em sua continuidade.

CLÁUSULA SÉTIMA - Da Denúncia e Da Rescisão

O presente convênio poderá ser denunciado a qualquer tempo e por qualquer dos partícipes, mediante notificação escrita, com antecedência mínima de 60 (sessenta) dias e será rescindido por infração legal ou descumprimento de qualquer de suas cláusulas.

CLÁUSULA OITAVA - Do Foro

Fica eleito o Foro da Comarca da Capital do Estado de São Paulo para dirimir as questões decorrentes da execução deste convênio, que não puderem ser resolvidas administrativamente.

E, por estarem justos e acordados, assinam os partícipes o presente instrumento, em 2 (duas) vias de igual teor.

São Paulo,     de             de  

SECRETÁRIO DA HABITAÇÃO

PREFEITO MUNICIPAL

Testemunhas:

1._________________________________

Nome:

R.G.:

CPF:

2._________________________________

Nome:

R.G.:

CPF:

Teleconferência discute política fundiária

O grande interesse despertado pela teleconferência transmitida na noite de 25 de novembro, da sede do Confea, em Brasília, para todo o País, sobre o Programa Nacional de Apoio à Regularização Fundiária de Terra Urbana, se reflete nas mais de uma centena de perguntas enviadas por profissionais da área tecnológica brasileira que puderam participar , através da rede de comunicação corporativa do Sistema Confea/Crea, da discussão sobre a realidade e as políticas a serem adotadas a fim de melhorar a qualidade de vida dos centros urbanos brasileiros.

O ministro das Cidades, Olívio Dutra, que não pode comparecer, enviou mensagem gravada em vídeo, na qual manifestou a "enorme satisfação proporcionada pela parceria que o ministério vem desenvolvendo com o Sistema Confea/CREAs no sentido de modificar a lógica excludente das cidades". Para ele, "é fundamental a participação de engenheiros e arquitetos na implantação do programa que visa a regularização das terras urbanas, já que a urbanização básica, com acesso ao transporte, saneamento, habitação e escolas é um direito de todos os cidadãos, independente da renda".

"A irregularidade da construção é responsabilidade coletiva", disse de início, Raquel Rolnik, secretária de Programas Urbanos do Ministério das Cidades, que falou sobre "Planejamento e Legalidade/A Cidade e a Lei" e "Compromisso do Governo Federal/Política Nacional de Regularização". Para Raquel, "a maioria das leis - embora inspirada por altos objetivos – pouco dialogo estabelece com a forma de produção e ocupação dos espaços urbanos. A maior parte é construída sem a participação de engenheiro ou arquiteto. Em vez de padrões técnicos, por que não o enfrentamento da qualificação da produção da cidade para que passe a ser includente?, questiona. "É grande a dimensão da assistência técnica profissional e é preciso que esses profissionais militem, estendendo essa assistência às populações de baixa renda", convocou. Para ela, "o mutirão pelo direito de construir cidades com assistência técnica não deve ser iniciativa do governo e sim da sociedade".

A secretária de Programas Urbanos - que defende o envolvimento de engenheiros e arquitetos na elaboração do Plano Diretor das cidades – disse ainda, que 60% dos domicílios urbanos são irregulares, ilegais e clandestinos. "É preciso intervir nesses espaços, mas é preciso parar a máquina de criação de áreas irregulares, ilegais e clandestinas", afirmou.

Cidades: contrastes e desafios

José Roberto Bassul, consultor do Senado Federal, ao falar sobre "Estatuto da Cidade: possibilidades de regularização fundiária" e "Os desafios dos profissionais do Sistema a partir do Estatuto da Cidade, mostrou que a "configuração do quadro das cidades brasileiras, reproduz muitos contrastes. De um lado, a carência de seis milhões de habitações e de outro, a super oferta de um estoque com 5 milhões de unidades. Esse é um dos efeitos de uma urbanização desordenada e o Estatuto da Cidade é um dos instrumentos para enfrentar esse tipo de problema", disse ele ao citar a cidade goiana de Anápolis, "que tem uma vez a mais a própria cidade, com lotes ociosos. Hoje temos como transformar a área em função social".

Soluções jurídicas coletivas para questões coletivas

"Não há dúvida de que é grave o quadro da produção informal no espaço urbano, assim como se sabe que as políticas para melhorar a realidade são curativas. Por vinte anos, trabalhamos pela implementação da urbanização e não pela regularização fundiária", diagnostica Edésio Fernandes, coordenador do Programa Nacional de Apoio à Regularização Fundiária, que falou sobre "Diretrizes/objetivos da regularização fundiária" e "Ações do Programa".

Edésio apresentou uma novidade: "têm direito à regularização, os terrenos informais em assentamentos consolidados", disse ao afirmar que "as soluções jurídicas devem ser utilizados para resolver questões coletivas como essa". Para ele, "o crescimento urbano desordenado se transformou num modelo brasileiro de construir espaços urbanos". Edésio defende que arquitetos, engenheiros e o poder público têm que buscar respostas para o impacto causado pela ocupação informal".

Luiz Philipe Torely, chefe de gabinete da Caixa Econômica Federal (CEF), participou da teleconferência falando sobre "Política Habitacional e Regularização Fundiária e CEF", e também sobre "Política habitacional/Parceria CEF/Ministério das Cidades". Apresentando a CEF como agente do fomento de desenvolvimento urbano e habitacional, Torely ressaltou a parceria feita junto à Casa Civil e Ministério das Cidades, na elaboração de um modelo para financiamento que contemple uma política pública que execute a regularização fundiária urbana". Torely desatacou também que é a primeira vez que um programa é voltado para capacitar os municípios para serem agentes de seu próprio desenvolvimento".

Estragos de uma ocupação desordenada

A secretária executiva do ministério, Ermínia Maricato, que como o ministro não pode comparecer, também gravou sua participação em vídeo falando sobre o Programa Nacional de Apoio à Regularização Fundiária". Ela afirmou que "a sociedade brasileira há 500 anos dá as costas para a questão urbana por não achar importante para o país. No entanto, o Brasil se tornou essencialmente urbano sem uma política traçada para que tanto se beneficiasse a população, quanto garantisse o equilíbrio ambiental, o que resultaria em boa qualidade de vida".

Para ela, o Estatuto da Cidade chegou tarde e "é preciso mudar a realidade recuperando os centros urbanos do desastre provocado pelo processo desordenado de ocupação do solo. São muitos os estragos, temos comunidades inteiras vivendo em áreas de risco, inundáveis e de proteção ambiental".

Entre os estragos apontados por Ermínia, estão os que dão conta que metade da população do Rio de Janeiro e São Paulo mora ilegalmente, em favelas ou lotes irregulares, enquanto em Salvador, Recife e Fortaleza, esse índice chega a 1/3. "As pessoas moram em áreas informais não por falta de leis e planos mas por ausência de alternativas habitacionais, criadas junto com políticas de transportes e saúde ambiental, afirmou. Para Ermínia, "o Ministério das Cidades foi criado para enfrentar esse problema".

O Programa Nacional de Apoio à Regularização Fundiária, pretende beneficiar um milhão de pessoas em 450 cidades brasileiras, e para a secretária executiva do ministério, "isso só será possível através das prefeituras que o Ministério pretende capacitar com financiamentos, cursos e recursos, além de assessoria".

O presidente do Confea, Wilson Lang, destacou os diversos programas de engenharia e arquitetura públicas desenvolvidos pelos Creas para atender à população de baixa renda. Para ele, que comandou a transmissão para a rede de comunicação corporativa do Sistema Confea/Crea, "a teleconferência é um instrumento valioso e uma maneira de profissionais de todo o país, ficarem "linkados" às autoridades que desenvolvem políticas públicas". (boletim eletronico do CREA-SP - 26/11/03).

Favelização cresce em cidade de médio porte

78,3% dos municípios com até 500 mil habitantes convivem com esse tipo de moradia; 17,5% não têm programas na área.

A favelização deixou de ser um problema restrito às metrópoles para ganhar terreno nos municípios de médio porte do Brasil -78,3% dos quais já convivem com essa forma de habitação.

Foi nesse grupo, com população de 100.001 a 500 mil habitantes, que as favelas mais se espalharam em novos municípios entre 1999 e 2001. Há quatro anos, 139 cidades com esse perfil tinham favelas. Dois anos depois, já eram 152, com 3.373 aglomerações e 532 mil moradores cadastrados.

Os dados integram a Munic (Pesquisa de Informações Básicas Municipais), do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), divulgada em novembro e com base em dados de 2001.

Ela também identificou que 17,5% das prefeituras de cidades médias e 6,2% das grandes (acima de 500 mil habitantes) declaravam não adotar nenhum tipo de programa habitacional -e, entre as que tinham alguma atuação nessa área, ainda prevaleciam as soluções consideradas mais tradicionais para resolver os problemas de moradia popular, como a construção de unidades. Medidas de urbanização de favelas e assentamentos -defendidos por especialistas desde os anos 90 como uma opção à construção de casas isoladas em áreas periféricas- estão na quarta posição entre as mais freqüentes: 56,7% das grandes e 46,9% das médias cidades as incluíram em suas políticas habitacionais, enquanto a construção de novas unidades tem a adesão de 83,3% e 83,1%, respectiva-mente.

A preocupação com a favelização nos municípios com até 500 mil habitantes é notada na prioridade de investimentos do Habitar Brasil BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), principal programa do governo federal para a urbanização de favelas: 50 (72,5%) dos 69 projetos em implantação desde 1999 estão nessas regiões, sendo 43 deles naquelas entre 100.001 e 500 mil habitantes.

Em 2003, segundo informações do Ministério das Cidades, foram gastos R$ 120 milhões no programa, lançado ainda na gestão FHC -que investiu R$ 62 milhões. Em 2004, serão mais R$ 110 milhões. A quantidade de famílias que serão beneficiadas no projeto até 2005 (54 mil), porém, ainda é pequena em relação à quantidade de domicílios cadastrados em favelas (2,4 milhões no país, sendo 1,7 milhão nas maiores cidades).

"Não cobre nem o crescimento vegetativo [de favelados]", afirma Pedro Taddei Neto, professor da FAU (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo) da USP (Universidade de São Paulo). Ele diz que a maioria dos municípios não tem hoje condições de fazer investimentos em habitação. Defende que a política de construção de unidades -que requer mais recursos- fique a cargo de Estados e da União. Às prefeituras caberiam as ações de urbanização.

A urbanização de favelas consiste na reestruturação das áreas, com a implantação de redes de abastecimento, esgoto e energia, abertura e ampliação de ruas e regularização fundiária, entre outras melhorias no entorno, para melhorar as condições de vida desses moradores, recuperando os espaços públicos e privados. Entre as vantagens dessa opção habitacional está a social, ao preservar os relacionamentos já existentes e organizados entre os moradores, evitando levá-los para lugares sem nenhuma harmonia com a vizinhança.

Segundo Inês Magalhães, diretora do departamento de urbanização e assentamentos precários da Secretaria Nacional da Habitação do Ministério das Cidades, uma segunda vantagem é a econômica: sai mais barato do que a construção de novas unidades (que podem comprometer a renda dos mais pobres) e não interfere no custo de vida dessa população (evitando que ela seja deslocada para longe do trabalho e não consiga nem mesmo bancar as despesas com transporte).

A vantagem urbanística é que, além de evitar a periferização, a presença de equipamentos públicos e a regularização do terreno elevam a auto-estima e a sensação de segurança desses moradores, que ficam mais dispostos a investir em melhorias das habitações. "Mas tudo depende da característica de cada lugar e de cada favela. A urbanização depende do tipo de terreno e das condições de risco e de saúde pública na área", ressalva Sônia Oliveira, socióloga do IBGE, para quem todos os programas habitacionais citados pelas prefeituras na pesquisa "têm sua devida importância".

Taddei Neto diz temer que a urbanização de assentamentos seja encarada pelos governos apenas como um investimento em infra-estrutura. Para ele, "é indispensável" ela ser acompanhada da reconstrução das unidades. "Para fazer uma habitação onde haja um espaço para a intimidade do casal, por exemplo", afirma. Inês Magalhães diz que a urbanização muitas vezes precisa ser acompanhada de algumas remoções, principalmente quando há um adensamento das moradias.

A secretária-executiva do Ministério das Cidades, Ermínia Maricato, aponta que um dos problemas enfrentados nas regiões que receberam urbanização é a falta de manutenção do poder público. Maricato, que em 2000 participou de um estudo realizado pelo LabHab (Laboratório de Habitação da USP) em oito favelas de cinco municípios (São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza, Goiânia e Diadema), afirmou que é comum a prefeitura realizar obras, mas abandonar a área depois. "Nos bairros, há a necessidade contínua de manutenção, como podas, remoção de lixo, tapa-buracos. Na favela, a prefeitura não mantém esses serviços."

Diadema e Santo André se destacam

Numa cidade com 207 favelas, a urbanização foi o caminho encontrado pela Prefeitura de Diadema para melhorar as condições de vida dessa população.

Em Diadema, de acordo com o diretor de Habitação do município, Josemundo Dario Queiroz, 70% das favelas estão totalmente urbanizadas, com rede de esgoto, asfalto, drenagem e infra-estrutura. As obras beneficiam um terço da população -cerca de 110 mil pessoas ou 25 mil famílias-, conforme os cálculos do diretor.

Queiroz informou que, dos 30% ainda não urbanizados, 23% estão em processo de conclusão de obras e 7% ainda não as iniciaram. A intenção da prefeitura, conforme o diretor, é urbanizar 98% das favelas do município nos próximos três anos. "Nossa lógica de urbanização é manter as famílias no local, com infra-estrutura e ação do governo", diz. Ele considera "inadmissíveis os projetos de confinamento, que tiram os moradores do lugar sem resolver o problema". Para ele, a principal característica positiva da urbanização é "incluir o que era ilegal na cidade legal, com tratamento igualitário". Segundo o diretor, a urbanização custa menos para o poder público porque, geralmente, já há equipamentos públicos nesses locais. Ele cita como exemplo o núcleo Nova Conquista. Uma parte já está urbanizada; outra, em obras. Em uma terceira, as obras não começaram. Empresários da cidade investiram na revitalização da av. Presidente Juscelino Kubitschek. A prefeitura cuidou da instalação de posto de saúde, creche e posto de coleta seletiva de lixo.

Em Santo André, no ABC paulista, quatro favelas - Sacadura Cabral, Tamarutaca, Quilombo 2 e Capuava- tornaram-se exemplos de urbanização e inclusão social desenvolvidas pela prefeitura. Em junho de 2001, o então prefeito Celso Daniel (PT) apresentou o programa na sessão especial Istambul + 5, em Nova York (EUA), que fez um balanço dos cinco anos da conferência Habitat, realizada na Turquia em 1996.

A ONU considerou o programa de Santo André exemplar. O que tornou o programa da prefeitura petista diferente é a adoção de nove programas sociais, entre eles Renda Mínima, saúde da família e alfabetização de jovens e adultos. Em 2001, Santo André tinha 137 favelas, onde moravam 88 mil pessoas.

A conta-gotas, favela é urbanizada

Quando chegou, há 13 anos, ao Jardim Santa Lúcia, o baiano Genário Nascimento da Cruz, 32, encontrou um cenário pouco animador: a favela -resultado da ocupação de um terreno da prefeitura na região de mananciais da represa Guarapiranga (extremo sul de São Paulo)- tinha vielas de terra batida, casas sem água encanada e um córrego que, além de ser esgoto a céu aberto, transbordava nas chuvas de verão, juntando ratos e causando doenças. Inconformado com a situação, Cruz começou a pensar em como poderia resolvê-la, mas só em 2000 fundou a associação de moradores do bairro, que preside. A entidade procurou a prefeitura, na gestão Celso Pitta (1997-2000), e pediu a urbanização da área.

As obras começaram em 2000, no Programa Guarapiranga, que previa a recuperação de favelas nas bordas do reservatório e foi financiado em parte pelo Banco Mundial. A partir daí, porém, seguiram a conta-gotas: foram interrompidas em 2001, retomadas no ano seguinte, voltaram a parar em 2003 e devem ser finalizadas neste ano, segundo Cruz. Tudo ao sabor da existência ou não de recursos para a sua conclusão.

A questão financeira é sempre um problema, admite o secretário da Habitação de São Paulo, Paulo Teixeira. Ele estima que a gestão Marta Suplicy vai gastar uma média de R$ 50 milhões por ano no Bairro Legal, programa de urbanização e regularização de favelas. A verba poderá praticamente dobrar neste ano se chegarem recursos esperados de convênios com a CDHU, o BID e da venda de outorga onerosa (direito de construir acima do permitido).

Cruz não reclama do atraso nas obras. "Só de terem pavimentado as ruas, canalizado o córrego Botucatu, de não termos mais as casas invadidas por água e ratos, de termos coleta de lixo e um endereço de verdade, onde o carteiro pode deixar a correspondência, já nos sentimos mais cidadãos." A menina dos olhos de Cruz é o telecentro com 20 computadores instalado na sede da associação do bairro. "Agora as crianças têm aula de informática e não ficam mais na rua o tempo todo." Antes da urbanização, as cerca de 300 famílias que moram no Jardim Santa Lúcia viviam com medo de ser despejadas, diz Cruz. "Ninguém melhorava a casa porque achava que podia chegar um dia e ter sido despejado." Agora, afirma, tudo mudou.

BID quer ampliar projeto de urbanização (Fabiana Cimieri, da da sucursal da FSP do rio)

O BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) iniciou as negociações com a Prefeitura do Rio para a realização da terceira etapa do Favela-Bairro, programa de urbanização de favelas. O contrato, a ser assinado no final de 2004, deverá atingir um valor de US$ 400 milhões -totalizando investimentos de US$ 1 bilhão.

O Favela-Bairro, que está completando dez anos, é considerado pelo banco um modelo de inclusão social por meio da urbanização. Com a ajuda financeira do BID, programas semelhantes estão sendo implantados na Cidade do México (México), em Caracas (Venezuela) e em Lima (Peru). "O Favela-Bairro e o Cingapura [projeto implementado em São Paulo pelo ex-prefeito Paulo Maluf] foram criados na mesma época. Um deu certo, o outro, não. O Favela-Bairro deu certo porque reconheceu as favelas e assentamentos como parte da cidade. Não queremos dizimar as favelas como queria o Cingapura", compara a secretária de Habitação do Rio, Solange Amaral. O Favela-Bairro urbaniza as áreas comuns das favelas e loteamentos, com a pavimentação e abertura de ruas, a criação de áreas de lazer, a implantação de redes de água, esgoto e drenagem, a canalização de rios e a contenção e reflorestamento de encostas. Apenas as famílias que moram em áreas de risco são reassentadas. Melhorar as condições de moradia de cada família na favela não faz parte dos objetivos do programa. Em geral, as casas são mantidas como foram construídas e essa limitação é o principal alvo dos críticos do projeto.

"[O Favela-Bairro] não conseguiu levar melhorias para a moradia individual das pessoas", disse Reynaldo Rocha Barros, presidente do Crea-RJ (Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia). Nas duas primeiras etapas -que custaram US$ 300 milhões cada uma, totalizando US$ 360 milhões de investimentos do BID e o resto da prefeitura-, os critérios para a escolha da favela ou loteamento beneficiado foi o de número de domicílios. As escolhidas são comunidades de médio porte, onde vivem entre 500 e 2.500 famílias. O custo per capita estimado é de US$ 1.000.

Na terceira etapa, segundo Solange Amaral, o critério de seleção também levará em consideração o número de jovens. "Serão criados centros multimídia e haverá mais ênfase na questão cultural", disse ela. Nessa etapa, a secretária calcula que 400 mil pessoas serão atendidas, beneficiando quase a totalidade da população favelada do Rio, que é de 1,1 milhão, segundo o Censo 2000, do IBGE.

Programa mantém família no local

Um exemplo de regularização fundiária ocorrido em Porto Alegre é o chamado Condomínio dos Anjos, onde 60 famílias foram mantidas no local no qual estavam e que passou por um processo de urbanização. A obra ocorreu em 2001, na avenida Ipiranga, onde antes havia um amontoado de casebres precários chamado Vila das Placas. A ocupação irregular no local abrigava cerca de 250 pessoas, que viviam em habitações precárias, com ausência de infra-estrutura básica. Não havia nem sequer banheiros e luz elétrica nas casas improvisadas.

No início da década de 90, a comunidade começou a se organizar para obter melhorias em suas moradias. Havia, porém, uma exigência dos moradores: eles queriam permanecer na área ocupada irregularmente. Foram construídas 60 unidades habitacionais para as 60 famílias, com um e dois dormitórios, sala, cozinha, banheiro e área de serviço. Também foram implantados projetos de educação ambiental e de saúde, com aulas sobre atitudes básicas, como uso de interruptor de luz, banheiro e cozinha. As 60 famílias foram assentadas nas novas casas em fevereiro de 2001. A partir daí, aumentaram o índice de escolaridade entre os jovens e o emprego formal, conforme a prefeitura, que não apresentou dados específicos. Os moradores mantêm contrato de concessão do direito real de uso com o Departamento Municipal de Habitação e pagam, segundo a renda, uma prestação que varia de R$ 6 a R$ 14.

Salvador

Em 1982, quando a Inglaterra e a Argentina entraram em guerra pela posse das ilhas Malvinas, surgiu uma invasão em uma das áreas mais valorizadas da capital baiana, a av. Luís Viana Filho, a menos de 15 km do centro de Salvador. Tolerada pelos governos estadual e municipal, a invasão recebeu inicialmente o nome de Malvinas. Mais de duas décadas depois, a invasão mudou de nome -Bairro da Paz- e ganhou uma completa infra-estrutura. As principais ruas do local, onde moram 50 mil pessoas, ganharam recentemente redes de água e esgoto e urbanização. "São quase seis quilômetros de obras que estão transformando a realidade dos moradores da favela", disse o secretário municipal da Infra-Estrutura Urbana, Carlos Geraldo Cova. O município também construiu no local uma escola com capacidade para atender 960 alunos, da educação infantil até a quarta série do ensino fundamental. O estabelecimento conta, ainda, com biblioteca, sala de informática, refeitório, cantina, área de recreio coberta, sanitários comuns e outros adaptados às pessoas com necessidades especiais.

Um posto de saúde, com capacidade para atender 250 pacientes por dia, também deve ser inaugurado até o final do próximo mês. "Estamos contribuindo para melhorar a auto-estima das pessoas que moram na favela", disse a secretária da Saúde, Aldely Rocha.

Moradores "proíbem" ocupações

Para evitar novas ocupações que possam atrapalhar a regularização fundiária do Parque Oziel e do Jardim Monte Cristo, em Campinas, as associações de moradores instalarão placas no bairro avisando sobre a proibição.

Os dois bairros, onde moram cerca de 25 mil pessoas, são as maiores ocupações promovidas pelo MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto) –braço urbano do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem Terra)- no país até hoje. E, a ocupação é, também, a maior já registrada em toda a América Latina. Os bairros têm sete anos de existência. Segundo o presidente da associação de moradores do Parque Oziel, Jairson dos Santos, as placas serão instaladas após a entrega de um levantamento topográfico, que está sendo feito pela Cohab. "Não podemos mais abrigar ninguém para não atrapalhar a regularização", afirma Santos.

Segundo o presidente da Cohab, Fernando Vaz Pupo, parte do levantamento topográfico será feito com fotografias aéreas e o restante da maneira tradicional. Com a topografia, afirma ele, as famílias que ocuparam recente-mente áreas de risco ou que estão fora do levantamento original deverão ser removidas. (CAROLINA FARIAS)

Favelas de SP têm melhoria

Se os planos da Prefeitura de São Paulo se concretizarem, a cidade terminará 2004 com 36 favelas urbanizadas, entre elas as de Heliópolis e Paraisópolis, as duas maiores da capital (ambas na zona sul). Em parte delas, as obras de melhoria já terminaram, em outras, estão em curso, e em outra parte, as intervenções começam neste mês. Ao todo, a expectativa é beneficiar 70 mil famílias. Fazem parte do pacote de urbanização a abertura e pavimentação de ruas, a instalação de infra-estrutura -redes de água e esgoto, eletricidade nas casas e iluminação- e a implantação de áreas de lazer (parques e praças).

A urbanização sozinha, entretanto, não dá conta de resolver o problema das ocupações, afirma o secretário municipal da Habitação e do Desenvolvimento Urbano, Paulo Teixeira. Ele diz que a política de habitação popular se apóia num tripé: criação de moradias na área central, produção de novas unidades (35 mil ao todo) e reurbanização. As ações têm pesos iguais, se complementam e cada uma delas se aplica a uma situação específica, afirma Teixeira. Ele cita como exemplo o caso da favela do Gato, na zona central, que, após sucessivos problemas com incêndios e enchentes do rio Tietê, começa a ser desocupada. Por causa do risco ambiental da área, os moradores serão transferidos para um conjunto habitacional de 480 apartamentos que começará a ser construído perto do terreno onde ficava a favela.

Planta segue modelo francês

Morar vai ficar cada vez mais caro. E, o que é pior: o mercado imobiliário vai continuar vendendo o mesmo tipo de habitação que vendia há cem anos. A opinião é do professor Marcelo Tramontano, coordenador do Nomads (Núcleo de Estudos sobre Habitação e Modo de Vida), da USP em São Carlos. Tramontano afirma que a planta das casas ou apartamentos de hoje repete a tripartição criada na belle époque francesa, no final do século 19: áreas de serviço (cozinha e lavanderia, por exemplo), social (sala de estar e jantar) e íntima (quartos). "Os visitantes não são admitidos na área íntima, mas a área social funciona como a vitrine do êxito da família e tem de ser vista de fora, daí a instalação de janelas grandes na sala", exemplifica. Essa origem nobre do modo de vida nos imóveis acabou se tornando um modelo para produção em série no Brasil, sobretudo a partir dos anos 70, em São Paulo.

Tramontano diz que essa produção tinha como público principal uma família nuclear, formada por pai, mãe e filhos. Porém esse grupo se alterou e hoje há mães sozinhas com filhos e solteiros morando sozinhos, por exemplo. Mesmo famílias cujos filhos ainda moram com os pais têm sua relação alterada. Hoje é comum adolescentes fazerem dos seus quartos espaços de individualidade. Segundo Tramontano, esse é um problema que o mercado terá de enfrentar -conjugar individualidade com industrialização. (Fonte: Folha de S.Paulo - 4/1/2004 - Capa/Cotidiano/ HABITAÇÃO - Favelização cresce nas cidades de médio porte).



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